quarta-feira, 23 de fevereiro de 2005

Ainda a proposito do post de Antonio Pinho Vargas

Teresa Cascudo e Sérgio Azevedo, nos respectivos blogs, citaram António Pinho Vargas. Coloquei um comentário ao dito artigo... APV reagiu...
Eis a minha resposta

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Quanta Honra ! António Pinho Vargas retomando um comentário aduzido por um dissoluto !

Cumpre-me, desde já, fazer uma rectificação: não sou, nem psiquiatra, nem psicanalista. Sou, apenas, psicólogo.

As minhas desculpas ao António Pinho Vargas... Li, no blog da Teresa Cascudo, um excerto - penso eu - do que APV havia escrito...

Em todo o caso, se reagi à melancolia e à depressão, não foi por acaso ! Obviamente que procurei reagir num registo antagónico ao afecto depressivo que o seu artigo desencadeou em mim - objectiva e subjectivamente ! Se faço uma exaltação à euforia, é porque senti a tristeza patente no seu texto... Ela ecoou em mim !

Sou muito sensível à depressão e suas variantes, pois lido com elas diariamente: travail oblige...

Deixe que lhe diga que a mania - onde predomina o afecto eufórico -, no essencial, é uma resposta à depressão ! Fala-se, inclusive, em pirueta maníaca: um valente ataque de riso, em pleno funeral, é disso um exemplo !

Quanto à importância das palavras para os psi... Bom, é verdade que os psicanalistas lacanianos as colocam numa posição de grande destaque. Os seguidores de outras escolas psicanalíticas - onde me posiciono - conferem ao verbo importância, apenas e só, na medida em que veiculam, de forma privilegiada, um afecto ! No adulto, a comunicação emocional faz-se, em grande medida, através do símbolo palavra ! Se seguirmos uma criança em psicoterapia, as palavras, grosso modo, são acessórias !
Para encerrar este esclarecimento, diria que o simbólico - que é polissémico, como bem sabe ! -, na lógica da clínica psicológica de base psicanalítica, deve estar ao serviço da comunicação emocional ! Mas, atenção... Por vezes, as palavras servem para nos defendermos de uma efectiva expressão afectiva !!!

É interessante a destrinça feita, no seu comentário, entre Real e Psicológico...
Em tom provocatório, apetece-me dizer que não sei o que o real é...
Enquanto psi, interessa-me, tão somente, o que o que o indivíduo faz daquilo que lhe é exterior...
O mesmo é dizer, há uma realidade externa - que designamos como objectiva - (uma peça musical) e uma realidade interna - subjectiva, relativa ao sujeito e, psicológica - (a resposta emocional desencadeada pela audição da peça).

Diga-me, António: o que sente quando ouve a 6ª sinfonia de Beethoven ? Concebe a possibilidade de alguém entristecer... E de outrém rejubilar ?

Já me comovi às lágrimas a ouvir o Kraus interpretar uma ária de Verdi, quando grande parte do restante público bordejava a euforia...

Em meu entender, é irrelevante a distinção feita entre melancolia física e psicológica... O que me anima, nas suas palavras, é a capacidade de se zangar, de se irritar, que constituem uma saudável reacção à desolação depressiva !

A depressão é a incapacidade de fazer lutos.
Esta é uma máxima de um dos meus mestres (António Coimbra de Matos).

Vamos imaginar que a minha mulher se encanta por outro homem... Troca-me... Ou seja, desama-me... Perco-a (ou ao amor dela por mim)...
Fico triste, deprimo-me... Acho-me o pior dos sujeitos...

Doravante, duas alternativas, em termos psicológicos, me restam: idealizo-a - coloco-a num pedestal e culpabilizo-me, em exclusivo, pela situação; em alternativa, revolto-me contra ela ! Zango-me com ela ! Reajo ao abandono dela, desidealizo-a e... abrem-se as portas de um investimento amoroso noutra mulher !

Face ao panorama que descreve, a meu ver, restam duas posturas: a do nacional conformismo - onde triunfa o paradigmático "é o destino" - ou a zanga, que constitui o motor da revolta !

Á luz de um singelo olhar psi, a nossa identidade nacional carrega o fardo da depressão, da perda...
Não querendo ter a pretensão de sugerir receitas, penso que a inversão da situação de precaridade que descreve - no tocante à música nacional - está numa estratégia que se inspire na sua postura ! A constatação da precaridade está feita ! Mãos à obra !!! Valha-nos a criatividade !


Recomendações musicais, susceptíveis de desencadear as mais diversas reacções... Não quer avançar ?

Aqui vão algumas: Fidelio (Klemper, EMI ´61), Pélleas et Mélisande (Haitink, naïve´02 - Eu estava lá ! Assisti a esta lenda interpretativa !!!), Ariodante (Minkowski, Archiv´97), Giulio Cesar (Minkowski, Archiv ´03), Don Giovanni (Mitropoulos, Sony´56), Mitridate (Rousset, DECCA´99 - Também assisti a uma récita que se seguiu a esta gravação!!!), Salome (Sinopoli, DG´91), Otello (Toscanini, RCA´47), Tristan und Isolde (von Karajan, ORFEO´52 - não confundir com a interpretação de 71!!! - e Kleiber, DG´82... Termino com um monumento: Parsifal (Kna TELDEC´51)

Um abraço à Teresa Cascudo, ao Sérgio Azevedo e ao António Pinho Vargas

João Galamba de Almeida

p.s. vou colocar este comentário no meu blog

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2005

Opera em dvd... a preços módicos !

As edições Altaya iniciaram, há cerca de um mês, uma colecção subordinada à ópera - Grande Ópera -, que consiste na edição, a preços muito recomendáveis, de um conjunto de dvd´s previamente editados pelas grandes empresas que comercializam música dita erudita.

Escuso de advertir-vos para o facto de a dita colecção obedecer a uma lógica de main-stream, estando omissas do catálogo referências mais específicas e / ou produções polémicas.

Do conjunto de 30 óperas - que vão de Mozart a Debussy, passando por Rossini, Verdi e Bizet, entre outros -, destaco As Bodas de Figaro (com Terfel, o Figaro da década) e Così Fan Tutte (uma co-produção do nosso TNSC, imagine-se !), ambas as referências dirigidas por Gardiner.

Sugiro, com igual empenho, o incontornável Don Giovanni de Furtwängler, que conta com participações absolutamente históricas: Siepi, Grümmer, Della Casa (a grande rival de Schwarzkopf, na interpretação de D. Elvira), Berry (em princípio de carreira) e Berger (avançada na idade... e na carreira, mas memorável, na pele de Zerlina). Este registo magistral, dos anos 50, acusa o peso da idade, que se traduz em inúmeras imperfeições técnicas...

A Salomé da famosa produção de Luc Bondy - uma co-produção do Festival de Salzburgo e do ROHCV -, com Malfitano no papel titular (numa interpretação avassaladora, apesar das óbvias dificuldades - sabiamente contornadas - exibidas por uma voz já muito fatigada), Terfel, Kenneth Riegel (o mais intenso e decadente dos Hérodes) e... Silja na pele de Herodias (uma das grandes interpretes do papel titular desta ópera, nos idos anos 60).

Destaque, ainda, para uma outra histórica (e bela) produção de Salzburgo d´A Mulher sem Sombra, dirigida por Solti, numa das suas derradeiras gravações. Studer - nascida para interpretar Strauss, como Ryzanek -, canta uma imperatriz luminosa ! Uma última referência para as prodigiosas interpretações da dupla Van Dam (Barak) e Marton (a Mulher do Tintoreiro).

Com o devido respeito, esta colecção apresenta, também, um linha kitsch, muito característica de parte significativa das produções do Met !
Destaco, neste âmbito, a famosa tetralogia wagneriana, Ariana auf Naxos, Il Trovatore, Aïda, etc.

Aproveitem !

Mattila-Jenufa ROHCG´02 (?)


Mattila-Jenufa
Originally uploaded by ildissolutopunito.

Salome, Met´04


Forever Mattila !

Conheci e comecei a interessar-me por esta interprete através das opiniões de Jorge Calado, no Expresso, já há alguns anos.

A carreira desta cantora está recheada de mestria, inteligência, um invulgar talento interpretativo e muita, muita prudência !

Mattila é, em minha opinião, a lírico spinto - a caminho do dramático - mais talentosa da sua geração.

Espantosamente, Karita Mattila alia aquilo que - de acordo com a categorização dos psis -, em abstracto, é inconciliável: nela coexiste um controlo emocional portentoso e uma infinita capacidade histriónica, atributos que se materializam numa actriz de génio !

Falo de controlo, visto que, como poucos interpretes, estima o seu instrumento vocal, preservando-o. ! Efectivamente, é raro ultrapassar as cinquenta récitas anuais !

A carreira de um cantor lírico atinge o apogeu cerca dos 40, 45 anos, sendo visíveis - salvo excepções - sinais de declínio vocal daí em diante...

A inteligência dos cantores revela-se - entre outras - na forma como preparam a carreira... Rysanek cantou a Chrysothemis - da Elektra, de Strauss - no início da carreira, o papel titular da mesma ópera perto dos 50 anos e, de forma deslumbrante, literalmente, acabou os dias encarnando a terrífica Klytämnestra ! Soube auscultar a voz ! Ouviu-a e passou para o registo mezzo, quando tal se tornou oportuno... O talento cénico encarregou-se do resto ! (as três encarnações da Elektra estão reunidas num cd da ORFEO - C 504 991 B).

Noutro quadrante, Vickers, que, na primeira fase da carreira, cantou o Otello com um virilidade e densidade apenas comparável às interpretações de Vinay, abordou Tristão e Siegmund mais tarde e... terminou, como ninguém, a interpretar Britten ! O Peter Grimes do cantor canadiano é duma riqueza tremenda (Phillips´78)...

Mattila tem, se não me engano, 46 anos, não sendo visíveis quaisquer sinais de fadiga vocal !
Ao que me disse, em breve, tenciona encarnar a mais mítica das figuras femininas que Wagner alguma vez compôs: Isolda...
Convenhamos que ousar interpretar esta figura, perto dos cinquenta anos, é - senão imprudente - de uma ousadia sem limites ! Pelo que consta, foi a sábia Rysanek que lhe vaticinou este destino (Jorge Calado dixit).
Em 2009, se o boato tiver consistência, estarei no ROHCV a assistir à promissora Isolda !

A primeira vez que a vi foi na Bastille, há cerca de 4 anos.
Paris há muito que se havia rendido aos encantos da bela finlandesa... Cantara - pelo que pude ler - uma prodigiosa Elsa (do Lohengrin, de Wagner), numa polémica e ousada produção, que muita tinta fez correr... A insanidade da personagem era exuberante !

Dizia eu que a vi há quatro anos... A ópera não me cativava em particular - A Dama de Espadas. Confesso que fui assistir à récita, apenas e só, pelo nome em cartaz. Se a descreviam de forma tão rendida - e, neste capítulo, os parisienses não se deslumbram por dá cá aquela nota -, havia que arriscar !
Desde a primeira entrada em cena que Karita Mattila me fascinou ! Nunca havia ouvido uma lírico-spinto tão potente !
A voz era, em simultâneo, pura, densa e robusta ! É difícil imaginar-se uma voz assim... Sem esforço algum, a emissão era estonteante ! A crítica francesa - muito em particular a da, justamente, famigerada DIAPASON - aponta-lhe falhas na emissão...
Mas foi no domínio interpretativo que a cantora mais deu cartas, damas, espadas e muito, muito ouro ! O domínio do papel era absoluto ! A Lisa de Mattila - embora amputada e desenquadrada - está presente num magnífico recital, que inaugurou o contrato que a interprete firmou com a editora Erato - 8573 85785 2.

Na mesma temporada, numa versão insólita e inusitada do Otello de Verdi, compôs uma Desdemona portentosa, talvez demasiado robusta, a ponto de - ironicamente - ter asfixiado o peculiar Cura, cuja potência contrasta com a habilidade teatral ! O quarto acto - onde a frágil Desdemona tem o seu momento de glória teatral - foi pungente... A candura interpretativa, a doçura eram únicas, embora, como disse, a potência destoasse um pouco...

Desde então, não mais parei de seguir esta genial figura !

No Met - onde é rainha absoluta, tendo (apenas) como rival a talentosa Fleming -, Mattila, nos anos 90, já foi D.Elvira - papel que marcou o seu début na sala nova-iorquina -, Eva - dos Meistersinger, de Wagner - (papel que gravara, sob a direcção de Solti, em inícios dos anos 90 - DECCA 452 606 2 -, tendo a DG editado, muito recentemente, uma interpretação onde a cantora encarna a mesma personagem, ao lado do prodigioso Ben Heppner), Leonora, do Fidelio (igualmente disponível em dvd, da mesa casa e ladeada pelo citado Heppner).

(continua)

sábado, 19 de fevereiro de 2005

Les Troyens, The Complete Songs (Barber) e Terfel

Para este fim-de-semana, as (já precárias) economias deram-me para adquirir a interpretação mais recente de Colin Davis d´Os Troianos. Estou expectante quanto ao Eneias de Heppner, que cada vez mais se aproxima do registo dramático - autrefois heldentenor...
Quanto à leitura de Davis - um dos grandes especialistas de Berlioz -, segundo reza a Diapason, é exímia !

Mudemos de capítulo.

Saiu um registo do mais magnífico barítono mozartiano da actualidade: Terfel
Bem sei, bem sei... O marketing tem apertado com ele e - imagine-se - já chegou a gravar cd´s de duvidosa qualidade, onde - entre outros - era acompanhado por Bocceli...
Desta feita, Terfel oferece-nos (mais) um conjunto de canções inglesas de vários compositores, ao que julgo, maioritariamente britânicos - Britten e Vaughan Williams, entre outros.

Terfel gravou, há anos, um recital quase exclusivamente dedicado a Vaughan Williams - The Vagabond -, onde era acompanhado (como quase sempre) por M. Martineau.
O dito registo de há cerca de seis anos provou a sua mestria no território da interpretação extra-operática - lied, canções de Rogers e Hammerstein.

Do presente cd, nada sei, mas se quiserem um conselho... Terfel, no seu melhor... Aqui vão algumas referências: Don Giovanni (DECCA ´97) - por ele e pela deslumbrante D. Anna de Fleming -, Opera Arias (DG´96) - onde exibe o seu talento e mestria na interpretação de várias personagens mozartianas - The Vagabond ( DG´95) - o tal registo consagrado, primordialmente, a V. Williams. Oiçam, também, o milagre do João Baptista que canta ao lado da mais sensual de todas as Salomé´s, de seu nome C. Studer (DG´91) ! O Jochanaan que ladeia C. Malfitano (DECCA´95 ?) é ainda mais denso, em termos dramáticos... Não posso deixar de lado o Falstaff (DG´01) - ainda mais refinado do que o de T. Gobbi - ou o Figaro (ARCHIV´93), uma encarnação lendária... Nunca ouvi um Figaro desta envergadura cénica e vocal...

Mais tarde, se tiver ocasião, falarei de Barber e Studer...

Dionisio, Re di Portogallo & Sao Carlos pre-31 de Março

Hoje, sábado, pelas 16.00 h, vamos assistir à estreia desta ópera de Handel.
Dá dita ópera, nada sei ! Muito menos dos interpretes...

Ainda que a curiosidade seja grande, a ameaça de uma gripe está a comprometer a minha capacidade de fruição... Ver-se-á...

Pode ser que descubra um bálsamo para as minhas maleitas...

Na actual conjuntura política e cultural - ou devo dizer político-cultural, ou ainda desavergonhadamente acultural e, isso sim, polítqueira -, não deixa de ser assinalável a circunstância de esta ópera versar sobre um monárca português, que deixou obra feita !

Numa altura de desgoverno absoluto, onde a cultura anda ao sabor de caprichos de alguns, de jogadas políticas de outros e da ignorância de muitos, quem se trama é o povo ! Seria o cúmulo do absurdo se a temporada fosse, como chegou a dizer-se, encerrada em finais de Março !
Por muito que aprecie o trabalho de Pinamonre, não crei ter sido inocente esta jogada... Mas, quem sabe, ficaremos todos - público - a lucrar com esta estratégia, que, no essencial, consistiu em dizer " O rei vai nu" !

Que a presente produção de Dionísio inspire dirigentes !

Continuo a bater-me por uma opinião muito minha: a ópera não tem que ser um espectáculo de elites ! Porque razão, em itália, as crianças aprendem, desde tenra idade, a marcha triunfal da Aida ? Porque razão, em Viena, ouvimos os miúdos trautearem valsas de Strauss ? Em França, várias vezes ouvi - da boca de leigos, como eu - referências às grandes interpretes da Carmen - Berganza, Baltsa, Migenes, etc !

Dir-me-ão que as óperas em questão são populares... pois é, conseguiram esse feito, como diz Sérgio Azevedo !

Sou suspeito para falar do Don Giovanni, que é - em meu entender - a mãe da criação operática-clássica... Haverá ópera mais popular do que esta ??? Cheguei a ver crianças, absolutamente radiantes, na assistência de uma récita desta ópera-prima.

E o que me dizem de A Flauta Mágica ? Não são só as arias da Rainha da Noite que são populares !

Também vos digo que teria dificuldade em levar um filho meu, de tenra idade, ao São Carlos, para assistir a uma récita de o Grande Macabro, que muito aprecio, hoje em dia.

Enfim, esperemos que os próximos responsáveis pela cultura tenham outra visão e respeito por todos nós, que amamos a cultura e a criaçao artística.

Já agora, repararam que as mais famosas récitas do nosso Teatro Nacional de São Carlos tiveram lugar no tempo do outro senhor ? Com tudo o que o regime tinha de odioso - e não era pouco -, em matéria de ópera, não havia grandes razões de queixa !
Só para que conste, voto, convictamente, à esquerda !

terça-feira, 15 de fevereiro de 2005

Callas, Suliotis & Theodossiou

Há muito que nutro pelas três interpretes um particular interesse.

A Grécia dá cartas em matéria de canto lírico desde há décadas - recordo Rossi-Lemeni e Baltsa, entre outros -, sobretudo no que toca ao soprano lírico spinto ou dramático di agilitá, de que Callas, Suliotis e Theodossiou são destacadas representantes.

O que une as três interpretes que dão corpo ao título deste post - além da nacionalidade -, em meu entender, é a familiaridade com a tragédia, também ela grega. A arte das três reside na entrega absoluta à encarnação dramática, que investem com arrojo e despudor. As qualidades histriónicas das citadas gregas são de uma riqueza e densidade estrondosas: oiça-se a Anna Bolena da Suliotis (DECCA ´67), a Norma da Callas (EMI ´61) e recorde-se a Violetta da Theodossiou, nas recentes e célebres récitas de Lisboa, há duas temporadas.

Não será estranho o facto de as três exibirem uma notória afinidade com personagens românticas marcadas pelo trágico destino. Dir-me-ão - e com razão - que a heroína romântica apenas o é na medida em que perece precocemente. Em alternativa, a dita heroína é assolada pela insanidade, de forma aparatosa e trágica.

Violetta, Norma e Lucia - papeis que a Callas marcou de forma inexorável, particularmente na estratosférica dimensão dramática que lhes conferiu - têm, de antemão, um mesmo destino: a morte prematura, na flor da idade, qual Callas, qual Suliotis...

É certo que a dimensão spinto das interpretes em questão lhes abriu as portas da encarnação das grandes heroínas do Belcanto: destinadas a interpretar Bellini, Donizetti e as primeiras heroínas verdianas.

Recentemente, adquiri um cd dedicado, em exclusivo a Verdi, de uma das mais magníficas interpretes wagnerianas da segunda metade do século passado: la Nilsson (DECCA ´62). Sem concorrentes em matéria de heroínas "pesadas" wagnerianas - Isolda ou Brünnhilde - menos feliz na interpretação de personagens femininas mais ligeiras do mestre de Bayreuth - Elsa, Elisabeth e Senta - (onde Rysanek e Crespin eram insuperáveis), as personagens que B. Nilsson interpreta padecem de uma frieza arrepiante, em matéria de investimento dramático ! A técnica - perfeita - em nada auxilia, já que o timbre é de um soprano dramático e não de um spinto !

Como é saborosa a imperfeição vocal da Callas, da Suliotis e... da Theodossiou !
As fragilidades técnicas das gregas, paradoxalmente, enobrecem as respectivas encarnações dramáticas.

(continua...)


sábado, 12 de fevereiro de 2005

Mozart e Verdi em registos históricos !

Para bem de todos nós, as lojas que comercializam música também já aderiram aos saldos !
Por vezes, nestas ocasiões, temos a felicidade de descobrir artigos de fundo de catálogo !!!

Neste final de semana, depois de mais um périplo pelas lojas de disco de referência da capital, descobri duas pérolas, que há muito procurava: o célebre
Così de Busch - gravado em Glyndebourne, em 1935 - e, porventura, o mais lendário dos Falstaff, que o outrora violoncelista Toscanini dirigiu, em 50.

Quanto ao
Così, conta com dois interpretes que aprendi a apreciar, graças ao histórico Don Giovanni do mesmo Busch (também ele de 1936): Ina Souez (na pele de Fiordiligi) - a Donna Anna do Dissoluto - e John Brownlee (como Don Alfonso) - le Dissoluto lui-même.

Pelo que consta, a interpretação de G. Valdengo - no Falstaff - constitui uma referência.
Tenho sempre presente o Falstaff do saudoso Gobbi... Terfel, nas leituras de Haitink (em DVD) ou de Abbado (em cd), é exímio, sobretudo, pela mestria da expressão grotesca.

Há alguns anos, vi na Bastille um Lafont estrondoso, neste mesmo papel ! Pouco tempo depois, sob a direcção de mestre Gardiner, gravou-o... a crítica é que não o acolheu com grande entusiasmo... se o tivessem visto...
Estou também expectante quanto à Nanetta de Stich-Randall...