quinta-feira, 28 de junho de 2007

Os Revezes da Omnipotência



A personalidade narcísica combina de modo particular triunfalismo, arrogância e desprezo. Esta é, porventura, a mais clássica das tríades da psicopatologia.

Joe Berardo é uma caricatural ilustração clínica deste tipo de personalidade.
Self-made-man, exibe um orgulho infinito, apenas ofuscado pela omnipotência: mandou em Sintra, manda no governo, arrota postas-de-pescada no millenniumbcp, nomeia, demite, compra, manda calar, tudo a seu bel-prazer.

O episódio Mega Ferreira vs Berardo - que se consubstanciou na recusa do primeiro em obedecer à hegemonia do segundo, que pretendia ver hasteadas as suas bandeiras – tem o mérito de revelar a falha narcísica de Joe Berardo: o gesto MEGA de António Ferreira atentou contra a prepotência do magnata.

Ora, as bandeiras de Berardo, que Joe pretendia exibir, nada mais simbolizavam que a extensão da sua glória narcísica, quais galões de general caduco, qual monumental pénis.
A recusa de Mega em aceder à exigência tirânica de Berardo, que Joe viveu como catastrófica, confrontou o milionário com a sua condição humana, posto que dissolveu a sua megalomania.

Paradoxalmente, o exercício do poder por personalidades deste calibre – habitualmente discricionário e absoluto – mais não é do que a expressão de uma fragilidade imensa: apenas um narcisismo muito doente e frágil aspira à verdade monolítica, única, unanimemente aceite.

Consequentemente, a diferença de opinião, a desobediência e a contrariedade, que obviamente questionam a visão egocêntrica do mundo, redundam em perseguições, podendo estas assumir diferentes formas, como todos sabemos.

Desta feita, porém, Mega antecipou-se, revelando mais astúcia do que o empresário.

Cá entre nós, em abono da verdade, convenhamos que o apelido MEGA assenta que nem uma luva a António Ferreira, também ele cultor de um fascínio especular, bastante afim com o funcionamento narcísico. Contudo, narcísico, por narcísico, antes um educado e com modos, do que um incomensurável boçal, francamente desprezível.

6 comentários:

Anónimo disse...

Concordo com muito do que diz, mas acho que falta um detalhe: a colecção é muito boa e foi o Berardo que a fez. Algo que o estado NUNCA conseguiu fazer. Não há em Portugal uma única colecção pública com a importância e relevância artística desta. O comportamento narcísico poderá estar por detrás disto tudo, mas não está afinal por detrás da democracia? (votem em mim porque sou bom e ele é mau?)
Tal como se passa consigo, não morro de amores pelo personagem, mas acredito que ele prestou um serviço ao país.
Um abraço.

Anónimo disse...

Concordo com cv. Estou desejosa de visitar a exposição, a única em Portugal do calibre de um MoMA ou Tate Gallery. Quero lá saber do narcisismo do senhor!

Il Dissoluto Punito disse...

Caros Cv (Who are you?) e Moura,

Que a colecção é boa, ninguém duvida! Enaltecê-la é redundante! Neste post, interessou-me discutir a personalidade do senhor Berardo, tão só.

DL disse...

Ainda não pude visitar a colecção, por isso deixo para depois uma palavra sobre a importância da mesma ou a dimensão do "serviço prestado ao país". Só uma achega para dizer que no sítio do CCB não encontrei uma só referência à colecção. Em vez disso tive de procurar no google para chegar a http://www.berardocollection.com/. Em particular a secção The man behind the collection é bastante instrutiva...

Il Dissoluto Punito disse...

DL,

Um homem singelo, está bem de ver ;-)

Anónimo disse...

Já vi a colecção e não gostei nada, mas talvez isso tenha a ver com o meu gosto pessoal que não considero arte a maior parte daquilo a que se decidiu chamar Arte Contemporânea.
Raul