(DG 474 974 - 2)
Thielemann oferece-nos, desta feita, a sua proposta interpretativa, no que se refere a Tristan und Isolde.
A respeito da sua recente leitura de Parsifal, questionei-me sobre a sua pertinência, em virtude da panóplia de diferentes interpretações desta mesma ópera.
Re-coloco a questão, agora a propósito de Tristão e Isolde.
À semelhança de Parsifal, em Tristan und Isolde, Thielemann opta (ou é forçado a optar, por imperativos financeiros!) pelo live.
Confesso a minha particular admiração pelas (incontornáveis) interpretações desta ópera, ao vivo.
De cor, cito Reiner (1936), Karajan (1951) e Böhm (1966 e 1971, esta última em dvd, com Vickers e Nilsson).
Ouso considerar que a direcção de Thielemann tem o seu fascínio, à semelhança das citadas leituras orquestrais.
O maestro apresenta uma proposta colorida, não muito dinâmica, insistindo na dimensão disfórica da partitura.
Sem artificialismos de estúdio, Thielemann extrai uma expressão nobre da Orchester der Wiener Staatsoper, cujas cordas bordejam a mais absoluta espiritualidade, tal não é a mestria e singularidade da sua execução!
Bem sei que ando obcecado com este naipe, desta mesma orquestra, mas o óptimo deve, imperativamente, ser referenciado e aclamado!
Vamos a solistas, o calcanhar-de-Aquiles deste trabalho...
Deborath Voigt, nesta interpretação, ousa o impensável: encarnar, pela primeira vez, a mais complexa personagem feminina wagneriana, num teatro lírico vedado às intérpretes americanas (no tocante ao papel de Isolda)!
Pode ser acusada de tudo, menos de ousada...
Se é verdade que cantar esta personagem exige endurance, folgo e uma tremenda resistência, interpretá-la requer, no mínimo, uma expressão trifacetada: orgulho (Narrativa, acto I), erotização (dueto, acto II) e sensibilidade - leia-se submissão - à ansiedade de perda (acto III).
Isolda é um soprano dramático, navegando num território onde se cruzam ferida narcísica - perda e erotização.
Voigt, nesta interpretação, compõe uma Isolda surpreendente, dada a flutuação da personagem: exímia na Narrativa (por ser maravilhosamente altaneira), frustrante no dueto com Tristão (sem sombra de desejo expresso) e soberba no derradeiro acto (de uma elevadíssima sensibilidade à dor da perda).
A esta pessoal composição, acresce uma emissão parasitada por um vibrato dificilmente controlável... e tolerável!
Desde a Ariadne auf Naxos (Sinopoli) que a voz de Voigt vem acusando esta crescente fragilidade. Que pena, dada a beleza do timbre, sensual e nobre!
Curiosamente, nas gravações mais recentes desta ópera - Pappano 2004, nomeadamente - encontro duas linhas comuns: o vibrato das protagonistas - sendo que o de Stemme, além de mais controlado, é mais rico - e a desadequação das Brangänes!
Petra Lang, à semelhança de Fujimura, além de possuir uma voz feia, de timbre grosseiro, não revela nobreza alguma, muito menos cumplicidade com a heroína.
Voigt é ladeada por Thomas Moser, Tristão debutante.
Moser canta um herói pouco expressivo, sob uma capa demasiadamente baritonal. Monolítico, o intérprete respeita a partitura, sendo incapaz de modular a voz às inúmeras solicitações interpretativas: sem desejo, sem dor, sem valentia...
Embora sem grande brilho, apreciei as prestações de Holl (Rei Marke) e Weber (Kurwenal).
Cumprem, destacando-se Peter Weber, cujo Kurwenal revela densidade e robustez dramática. Facilmente se imagina a intimidade mantida com o herói (não com o intérprete do mesmo...).
Posto isto, caro leitor, tal como havia considerado, a respeito do Parsifal, de C. Thielemann, a grande virtude deste Tristão assenta, sem sombra de dúvida, numa leitura orquestral que respira e brilha.
Quanto aos intérpretes solistas, diria que havendo muitos melhores, vocal e dramaticamente, no essencial, oferecem leituras genuínas e autênticas, apesar da heterogeneidade reinante e das fragilidades já elencadas.
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