(DECCA 452 602-2)
Este registo é a expressão da falha, na sua acepção mais narcísica: marca da incompletude, da imperfeição e da finitude.
Fleming aborda, aqui, um dos compositores mais queridos e destacados dos primórdios da sua notável carreira lírica: Mozart.
René Fleming sempre foi uma mozartiana de mão cheia.
A sua voz imensamente lírica, radiosa e luminosa até ao âmago, possui um timbre de uma indiscutível elegância e graciosidade; a técnica segue a graça da emissão, suportando-a com uma perfeição diplomática: omnipresente mas diáfana, eficaz mas invisível, materializa o brilho vocal, como se não existisse, et pourtant, elle est toujours là!
O temperamento cénico da Fleming combina com Mozart, sobretudo no tocante às personagens puramente líricas - Susanna, Pamina e Donna Elvira (qualquer delas abordadas neste registo) -, cuja expressão dramática é soft e algo esbatida, diluindo-se numa emissão que se pretende delicada, suave, elegante e contida.
Dito isto, a soprano americana marca pontos na abordagem das ditas figuras, revelando-se uma hábil e cautelosa cultora e difusora do estilo mozartiano lírico mais ortodoxo. Ainda assim, é legitimo destacar-se alguma falta de densidade interpretativa... Por exemplo, Pamina tem um quê de melancólico que escapa à diva; Susanna é mais ágil e espontânea do que a personagem ora retratada.
Hélas, la Fleming não resiste a outros voos, nomeadamente por territórios da linha coloratura, algo avessos aos seus dotes, que consubstanciam o calcanhar-de-Aquiles deste registo.
Esquivando-se a Donna Anna - que mais tarde abordará, pelas mãos de Solti e Levine, sem grande brilho, sublinhe-se -, não aguenta a "pirotecnia", nomeadament de Konstanze (para não falar da dificilmente tolerável inabilidade da sua Fortuna, de Il Sogno di Scipione), cuja flexibilidade e capacidade de ornamentação, manifestamente, René Fleming não possui.
De facto, as árias ornamentadas, precisamente nas passagens mais agudas, revelam uma voz em esforço, claramente menos dominada, sendo que o brilho e luminosidade cedem lugar a uma perturbadora aspereza e acidez.
Em duas palavras, a falha está presente num repertório excessivamente eclético, em termos técnicos, que René Fleming não pode abranger, por limites vocais incontornáveis.
Anos mais tarde, esta soprano percebeu, inteligentemente, que o seu temperamento e dotes vocais combinavam, em absoluto, com a figura da Condessa, papel em que, ainda hoje, quase dez anos volvidos sobre as míticas Nozze do Met - que a juntaram a Terfel e Bartoli - não tem rival !
Fleming aborda, aqui, um dos compositores mais queridos e destacados dos primórdios da sua notável carreira lírica: Mozart.
René Fleming sempre foi uma mozartiana de mão cheia.
A sua voz imensamente lírica, radiosa e luminosa até ao âmago, possui um timbre de uma indiscutível elegância e graciosidade; a técnica segue a graça da emissão, suportando-a com uma perfeição diplomática: omnipresente mas diáfana, eficaz mas invisível, materializa o brilho vocal, como se não existisse, et pourtant, elle est toujours là!
O temperamento cénico da Fleming combina com Mozart, sobretudo no tocante às personagens puramente líricas - Susanna, Pamina e Donna Elvira (qualquer delas abordadas neste registo) -, cuja expressão dramática é soft e algo esbatida, diluindo-se numa emissão que se pretende delicada, suave, elegante e contida.
Dito isto, a soprano americana marca pontos na abordagem das ditas figuras, revelando-se uma hábil e cautelosa cultora e difusora do estilo mozartiano lírico mais ortodoxo. Ainda assim, é legitimo destacar-se alguma falta de densidade interpretativa... Por exemplo, Pamina tem um quê de melancólico que escapa à diva; Susanna é mais ágil e espontânea do que a personagem ora retratada.
Hélas, la Fleming não resiste a outros voos, nomeadamente por territórios da linha coloratura, algo avessos aos seus dotes, que consubstanciam o calcanhar-de-Aquiles deste registo.
Esquivando-se a Donna Anna - que mais tarde abordará, pelas mãos de Solti e Levine, sem grande brilho, sublinhe-se -, não aguenta a "pirotecnia", nomeadament de Konstanze (para não falar da dificilmente tolerável inabilidade da sua Fortuna, de Il Sogno di Scipione), cuja flexibilidade e capacidade de ornamentação, manifestamente, René Fleming não possui.
De facto, as árias ornamentadas, precisamente nas passagens mais agudas, revelam uma voz em esforço, claramente menos dominada, sendo que o brilho e luminosidade cedem lugar a uma perturbadora aspereza e acidez.
Em duas palavras, a falha está presente num repertório excessivamente eclético, em termos técnicos, que René Fleming não pode abranger, por limites vocais incontornáveis.
Anos mais tarde, esta soprano percebeu, inteligentemente, que o seu temperamento e dotes vocais combinavam, em absoluto, com a figura da Condessa, papel em que, ainda hoje, quase dez anos volvidos sobre as míticas Nozze do Met - que a juntaram a Terfel e Bartoli - não tem rival !
1 comentário:
Muito interessante a sua crítica. Não posso comentá-la porque não possuo o CD e depois de a ler não me sinto muito entusiasmado em o adquerir. Relativamente à récita do Met, que foi extraordinária, eu estava em NY e deu-a em directo pela televisão. Lembro-me dos grandes aplausos que a Fleming recebeu depois do "Dove sono", mas quando a Bartoli cantou o "Deh vieni, non tardare" a casa ía abaixo. Também não comenterei os Cds de Haendel e do Villarzon, porque também não os tenho e em relação ao primeiro nunca o compraria, por muitas razões. Relativamente ao da Rysanek, é diferente, porque já o tenho a uns anos.
O João ainda não me disse nada sobre a gravação do Met por ocasião dos 25 anos de direcção do Levine na casa.
Um abraço
Raul
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