segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Triunfal!


(VAI 4330)

Em finais dos anos 1980, dois colossos líricos defrontaram-se em Cardiff, no BBC Singer of the World: Bryn Terfel e Dmitri Hvorostovsky.

O primeiro triunfou na categoria de lied e o segundo na de ópera.

Pessoalmente, acho que ambos vieram (re) conferir ao barítono o merecido lugar de destaque que esta categoria vocal perdera, com o ocaso de Gobbi, Sereni, Taddei, Capuccilli, Milnes e Brusson.

Terfel e Hvorostovsky são, de facto, extraordinários. O primeiro no repertório mozartiano e wagneriano e o segundo no russo e verdiano.

Sem rival, Hvorostovsky é o mais proeminente barítono verdiano da actualidade lírica. Este intérprete possui uma voz musculada, firme e ampla, com assinalável elasticidade. O timbre é nobiliárquico e viril, com um toque altaneiro.

Este concerto, captado em Montréal, em 1998, é, a todos os títulos, memorável, dando conta de uma envergadura vocal vulcânica, aliada a uma impressionante versatilidade interpretativa – do aterrorizante e necrófilo Songs and Dances of Death (Mussorgsky-Chostakovich) ao hilariante Fígaro (Rossini), passando pelo fabuloso Verdi (Un Ballo, Don Carlo, Il Trovatore).

Hvorostovsky pavoneia-se, é certo, não disfarçando o seu imenso triunfalismo...
Fora eu um barítono da sua envergadura... faria o mesmo!

É possível ser-se talentosíssimo, vocal e cenicamente, esbelto, saudavelmente orgulhoso e justamente famoso. Que mais quer o narcisismo sadio?

INDISPENSÁVEL!


______
* * * * *

(5/5)

26 comentários:

Anónimo disse...

Eu tenho este DVD. Não podia ser melhor.

Il Dissoluto Punito disse...

Raul,

Melhor é impossível :-)))

Anónimo disse...

Sim, em DVD ele é ótimo, mas ao vivo a projecção deixa muito a desejar. Talvez se deixasse de imitar a projeção de Ettore Bastianini...

Il Dissoluto Punito disse...

Curioso! Não estou de acordo com a falta de projecção! Já o vi em várias salas - uma particularmente grande, o Met - e não fiquei com essa impressão!

Anónimo disse...

Eu também o vi no Covent Garden, no Rigoletto, e, embora ache a opinião do anónimo exagerada, é verdade que esperava mais da projecção da voz.

Anónimo disse...

O Met é notório por usar micrófonos. Eu o ouvi 5 vezes no Scala e mal se ouvia.

Ricardo disse...

Eu vi o recital na Gulbenkian há uns anos e não concordo nada que tenha problemas de projecção. Talvez o anónimo o tenha apanhado num mau dia...

José Carlos Neves Lopes disse...

Tenho esse DVD, é muito bom mesmo.

José Carlos

Il Dissoluto Punito disse...

Microfones no Met???
Nunca dei por isso e já lá fui, pelo menos, umas vinte e tantas vezes!
É boa, essa! Ah, ah!

Ricardo disse...

não me parece que a utilização de microfones no met seja prática corrente, da mesma maneira que continuo a discordar que Hvorostovsky tenha falta de projecção.

Talvez estejam a confundir projecção com "tamanho" vocal, e nesse caso, a voz não é especialmente grande, mas projecta-se bem. Tenho uma gravação ao vivo do Germont dele em Covent Garden e embora não esteja no seu melhor, a voz distingue-se sempre bastante bem mesmo em ensembles mais pesados.

Também não concordo nada que digam que ele "imita" o Ettore Bastianini. Isso implicaria uma produção vocal artificiosa e artificial (Lucia Aliberti, por exemplo, em que se distingue nitidamente a sua voz natural e a voz forçada com que tenta imitar a Callas) que não é o caso.

O Hvorostovsky em muito bom em Verdi. Mesmo mesmo muito bom! A voz padece um pouco de falta de agilidade para belcanto mais ornamentado (Belcore, Sir Riccardo), mas em Verdi diria que actualmente não tem rival. O Hampson também se mexe com relativa facilidade no Germont e no Rodrigo, mas não é uma voz nata para esse repertório como Hvorostovsky!

E sim, caro dissoluto! Se há alguma coisa capaz de rivalizar com a voz dele, é mesmo o ego. Quando esteve na Gulbenkian fui cumprimentá-lo aos bastidores e foi uma das piores experiências da minha vida. Mal educado e extremamente arrogante com toda a gente que cordialmente o saudava.

Anónimo disse...

Ricardo,
Porque se canta num coro, não é suficiente para dizer que as pessoas aqui fazem confusões. Isso também é uma forma , embora simples, de arrogância.
Eu já não vou a autógrafos. Fui a muitos, quando era jovem. Tenho de tudo: Cristoff, Caballé, Cossoto, Gobbi,... Hoje o cantor vai cantar e para isso ganhou dinheiro. Não me está a fazer nenhum favor, pois eu paguei para o ouvir. E basta.

Hugo Santos disse...

"Off topic", aproveito para informar que o grande tenor Gianni Raimondi faleceu ontem aos 85 anos.

Anónimo disse...

"Grande", Hugo ? Eu vi-o na Boémia.
Paz à sua alma.

Ricardo disse...

Caro Raul, não ataquei ninguém nem me dirigir de forma insultuosa/arrogante a ninguém. E não, não canto num coro... ou melhor, até canto, mas estou a acabar uma licenciatura em Canto, por isso sei do que estou a falar. Já não é a sua primeira resposta em que sinto que, de alguma forma, se sente sempre pessoalmente atacado pelo que escrevo por alguma razão que não percebo muito bem qual é.

E sim, continuo a insistir no ponto de o Hvorostovsky ter deixado muito a desejar enquanto pessoa apesar do recital fantástico.
Para se ser grande não é preciso ser-se mal educado, e o melhor exemplo disso é a Bartoli, que aquando do seu concerto "Opera Proibita" na Gulbenkian, acolheu toda a gente e ainda este alguns minutos em conversa comigo e com outros colegas, e sempre com uma disponibilidade e graça arrebatadores.
E fico genuinamente feliz pela sua colecção de autógrafos.

Anónimo disse...

Caros amigos

Já agora aprovito a comentar.
Também já houvi o Hvorostovsky ao vivo várais vezes mas só uma vez numa produção de ópera e curiosamente em Verdi no Convent Garden. O timbre é belissimo e não tem problemas em fazer-se ouvir no Convent Garden no entanto existe algo de estranho na produção vocal mas realmente seria de esperar um pouco mais de projeção e uma maior liberdade dinâmica. Suspeito que mais ou menos tudo é cantado mezo-forte e forte para se fazer ouvir plenamente apesar de não aparentar pois como a voz é homogénea e compacta e tem um timbre duma beleza intoxicante nenhum som menos belo nos adverte para a possibilidade do cantor se estar a esforçar.

J. Ildefonso.

Hugo Santos disse...

Raul, não seja "mauzinho" para com o Gianni Raimondi que era um tenor lírico de primeira água, de timbre belíssimo. Não era o melhor de entre os seus mas quem nos dera que hoje houvesse um como ele. Salvo erro cantou em duas ocasiões no São Carlos: em meados dos anos 60 numa Butterfly com a Scotto(?) e nessa Boheme que referiu, já nos anos 70 (72 ou 73???).

Anónimo disse...

Caro Ricardo,
Pace! Ninguém se ofendeu! Mas tem de concordar que às vezes tem uma aproximação um pouquinho arrogante. Eu compreendo: é o fabuloso ardor da juventude. Aqui, pelo menos na parte que me toca não estudei canto e tudo o que sei é fruto do ouvir e do ver, mas a experiência é muito longa e a ópera, como toda a música clássica em geral, é a minha paixão. Seguem-se as Línguas - tenho uma paixão por Gramática - a Literatura, a História, o Cinema and so on. Tirando a língua, em nada só "técnico", só paixão. Abordar a Ópera por dentro não quero. Gosto de ser o ouvinte, o que só aprecia, fazendo parte do grupo sem o qual os cantores e outros intérpretes não existiam. E sobre isto não vale a pena estar-me a repetir para uma pessoa inteligente como o Ricardo.
Voltando à projecção e ao volume, não me parece que houve confusão, porque o que eu ouço é o produto projectado. Cantores como a Schwarzkopf, o Gobbi e a Sciutti tinham pouco volume, mas projectavam bem as vozes. Outros associavam as duas coisas como a Flagstad, a Stignani e o Taddei, o que arrasa. O Hvorostovsky, como muito bem diz, tem volume, mas no Rigoletto que eu vi ouvia-se bem quando a orquestra tinha pouco volume. Para o concertante da Cena inicial, por exemplo, devia ter projectado melhor a voz.
Outra coisa:
Quando ouve o Baile de Máscaras não acha curioso ouvir o seu nome cantado. Eu acho um piadão ouvir a Simionato pronunciar o meu nome nos Huguenotes ao vivo do Scala.

Anónimo disse...

Caro Hugo,
O Raimondi não era mau, mas, por exemplo, "estraga" a Traviata da Scotto com ele e o Bastianini. Está mesmo muitíssimo inferior aos colegas.A Butterfly que a Scotto cantou em Portugal foi com o Michele Molese e o Raimondi cantou a Boémia com a Adriana Maliponti. Nesta Boémia, lembro-me de não assistir ao quarto acto, porque achava o acto muito ridículo, principalmente a parte final. Hoje não acho ridículo, mas tirando a chegada da Mimi e as frases que troca com o Rudolfo e também o Sono andati, todo o acto tem música sem beleza nenhuma, embora não banal.

Ricardo disse...

Caro Raul,

como adepto ferrenho do período belcantista que me considero, acho mais piada a ouvir o meu nome cantado no I Puritani... A cena da discussão entre o tio da Elvira e o Riccardo que precede o dueto "Suoni la tromba intrepida".
E também acho piada ser constantemente razão para olhares de esguelha/sorrisos em aulas e masterclasses quando alguém canta a ária da Norina do Don Pasquale "Quel guardo il cavaliere" e chega à parte "che il cavalier Riccardo, tutto d'amor conquiso giurò che ad'altra mai, non volgeria il pensier".

É uma pena não se fazer mais belcanto neste país apostando-se sempre nas mesmas coisas (Barbeiro e Elixir). Hoje em dia não se justifica!!! Cada ano são descobertas novas óperas de Rossini e Donizetti e o espólio de Bellini, não sendo enorme é Bellini!! Quando um I Puritani, quando uma Sonnambula, quando um Capuletti ed i Montecchi?

Já nem falo em Donizetti. Uma Lucia? Uma Anna Bolena? Um Don Pasquale... nada! E nem estou a ir ao repertório mais obscuro de Donizetti (por exemplo a ópera "Rita", excelente para inauguração de um estúdio de ópera!)

De Rossini, não me lembro de ter visto por cá um Signor Bruschino, um Cambiale di Matrimonio, uma Cenerentola... Ninguém pede que se mande vir o Florez e a Massis cantar a Matilde di Shabran, mas caramba! Varie-se o repertório!

Hugo Santos disse...

Raul, essa de ouvir o nosso nome cantado por uma personagem de ópera é bastante engraçada. Infelizmente, estou condenado à obscuridade já que, tanto quanto sei, o meu nome é apenas pronunciado na ópera "Ugo, Conte di Parigi" de Donizetti, embora exista gravação desta ópera.

Relativamente ao Gianni Raimondi, julgo que a gravação da Traviata não lhe faz justiça nenhuma. Acontece. Outra nota: eu julgo que a Adriana Maliponte cantou a Mimi em São Carlos em 1970. O Rodolfo era o Veriano Luchetti, o Marcello o Franco Bordoni e o Colline o Mario Rinaudo. É possível que o Raimondi tenha cantado também nessas récitas ou então, e aqui julgo mais provável, numa produção posterior da ópera. No que toca à música do acto final da Boheme, considero-a ao nível dos restantes actos, não fosse esta ópera um dos principais títulos do repertório. Se pensarmos bem, o último acto da Boheme é um fecho de ciclo, que naturalmente retoma temas e motivos do acto inicial.

Anónimo disse...

Caro Ricardo,
Imagine que na defunta Companhia Portuguesa de Ópera do Teatro da Trindade vi a Rita, numa noite em parelha com a Cavellaria Rusticana, La Scala di Seta e La Cambiale di Matrimonio. No São Carlos vi o ciclo donizettiano das três raínhas pela Zampieri.
Tem toda a razão, devia fazer-se mais belcanto. É incrível não se ouvir em Portugal o Pirata de Bellini e, mais incrível ainda, a Semiramide de Rossini, ópera que eu adoro e é para mim o suprassumo do belcantismo rosiniano.
Agora outra coisa pois voupedir-lhe um esclarecimento de terminologia canora. Portamento. Já li a definição, mas não tenho a certeza. "Portamento", "portare", então "levar", "transportar". No quarto verso da Casta Diva de cada uma das duas secções, a voz é sucessivamente transportada para uma região aguda sem respiração. É essa técnica de elevar a voz o "portamento"? Ou após os quatros versos serão aquelas modulações que o soprano troca com o coro? Tudo isto a propósito de uma crítica que li e que fala de "portamento" na Casta Diva.
Um abraço

Anónimo disse...

Caro Hugo:
As duas Boémias foram:
(1966): Adriana Maliponti, Gianni Raimondi, Enzo Sordello, Anna Gasparini, Paolo Washington
(1970): Adriana Maliponti, Veriano Lucheti, Franco Bordoni, Elena Baggiore, Mario Rinaudo

Quanto ao quarto acto da Boémia continuo a dizer-lhe que tirando aquelas partes, o resto não gosto. O faz a Boémia ficar no reportório e ser tão popular, para além do trama, é a música da sequência final do primeiro acto (sublime) , a ária da Musette, e todo o Terceiro acto. No início da ópera há grande ciência musical, Puccini segue um pouco as pisadas do Falstaff, mas só por si não se implanta. Mas, no total é uma grande ópera, embora eu prefira de longe a Tosca e a Madame Butterfly. Eu durante muitos anos só tive a Boémia da Tebaldi / Bergonzi. É uma opinião.

Ricardo disse...

Caro Raul,

as 2 subidas ao agudo na Casta Diva estão escritas na partitura. É um melisma ascendente.

O "portamento" é um recurso estilístico/expressivo que consiste em ligar uma nota à seguinte (normalmente separadas por um mínimo de 1 tom) cantando as notas intermédias com um ligeiro vibrato. Ouça uma Violetta que cante o sobreagudo no fim do sempre libera para ouvir o efeito. Regra geral, elas fazem um portamento entre o sobreagudo e a última nota. Funciona também ao contrário, de uma aguda para uma mais grave.
No caso da Casta Diva, as subidas ao agudo de que fala estão escritas, por isso não é um portamento, visto que este é mais da ordem da expressão estilística da obra. Aquilo a que a crítica que leu se refere deve ser ao final, em que normalmente as cantoras sobem a um agudo de preferência em pianíssimo (Caballé, Theatre Antique D'Orange é o melhor exemplo) e depois deslizam até à nota final. Se bem que aí, o termo "cromatismo" é mais correcto, uma vez que passam por todas as notas intermédias, de meio tom em meio tom, desde a mais aguda À mais grave.

Se a passagem for sem vibrato nas notas intermédias, recebe o nome de "glissando" e há por aí muito cantor que não sabe fazer portamentos e faz glissandos. A maneira pouco saudável como o Alagna ultimamente sobe ao agudo é um glissando... ataca as notas por baixo.

Isto explicar detalhadamente é um bocado complicado. Cantando e ouvindo é mt mais fácil.

Hugo Santos disse...

Raul, a sua é uma opinião e, na minha perspectiva, muito bem fundada. Não partilho totalmente da sua visão, mas não há como negar que os melhores momentos são de altíssimo nível e, como tal, outros fiquem na sombra. Para terminar, refiro só o segundo acto, para mim um brilhante ensemble.

Anónimo disse...

Caro Ricardo,
Muito obrigado pelo seu esclarecimento.
Digamos, então, que o Portamento é um recurso estilístico, apoiado tecnicamente, não escrito na partitura, onde a voz é transportada de uma nota para outra, nos dois sentidos. Para um melhor esclarecimento eu pergunto-lhe se será um portamento a passagem ao grave no recitativo da ária da Abigail e que a Callas tão magistralmente exibe ?
Não o maço mais.
Um abraço.

Ricardo disse...

Caro Raul,

não me esqueci de si, só que não encontro o meu CD do primeiro volume de árias de Verdi pela Callas... Tenho a caixa mas o disco deve andar perdido por outra caixa e não tenho tido tempo para o procurar.
Logo lhe direi... assim que voltar a organizar a minha colecção de CD's que neste momento se encontra espalhada por pelo menos 3 divisões diferentes da casa... :)