terça-feira, 11 de julho de 2006

Strauss, Wagner & a depressividade de Studer

(DG 439 865 - 2)
Neste registo, Cheryl Studer aborda um reportório que se adequa na perfeição às suas qualidades líricas.

Soprano lírico
- dramático (light) wagneriano - Elsa, Senta e Elisabeth - e straussiano - Marechala, Crisostemis, Imperatriz e Salomé -, em meu entender, esta intérprete possui a mais sensual e elegante voz lírica dos anos 1990.

O timbre, que irradia luminosidade, é de uma beleza raríssima, desenhando belos arcos melódicos, longos e aristocráticos. O vibrato - quase imperceptível - resiste aos mais agudos esforços; as vocalizações - longas e bem sustentadas - irradiam frescura e jovialidade.

Studer, sob a batuta do malogrado Sinopoli, interpreta dois dos mais populares e exigentes ciclos de lieder da escola romântica: as Quatro Últimas Canções, de Richard Strauss, e os Wesendonck Lieder, de Richard Wagner.

Herdeiros da tradição romântica e ultra-romântica, os dois ciclos de canções exploram o domínio da depressão, de forma, ora mais, ora menos simbólica, ora mais, ora menos metafórica.

Sob o domínio crepuscular, Strauss e Wagner aludem à solidão, perda, inactividade, serenidade e finitude, sempre num contexto de sensibilidade à perda. O primeiro mais prosaico e terreno; o segundo, mais transcendente e próximo da divindade.

A prestação de Cheryl Studer é absolutamente primorosa, sob o ponto de vista vocal, facto que não surpreende. A frescura e elegância da voz florida inebriam-me! A dicção é imaculada.

Em matéria de brilho vocal, talvez Jessie Norman e Lisa Della Casa se aproximem da prestação de Studer, ficando-lhe aquem, ainda assim.

A fragilidade de La Studer, no que se refere a estas duas interpretações, tem uma raiz comum: insuficiente em melancolia (depressão à máxima), a soprano americana aborda os textos sob o signo da depressividade (depressão à mínima).

Longe da insensibilidade, a intérprete reconhece e exprime a disforia dos textos, invariavelmente de modo light.

Dito isto, caro leitor, se procura a perfeição vocal, numa gravação recente e de óptima qualidade, opte pela leitura da dupla Sinopoli / Studer. Se, ao invés, procura uma interpretação plena de melancolia, correndo o risco de não primar pela originalidade, sugiro-lhe a segunda de Schwarzkopf.

9 comentários:

Anónimo disse...

Realmente acho que a palavra chave da interpretação da Studer é "fragilidade" o que dá um caracter muito particular e apelativo à gravação em questão que fornece a minha estante de c.d's há já muito tempo sem nunca ter tido oportunidade de ganhar pó ao contrario de outras interpretações muito mais famosas e elogiadas.

J. Ildefonso.

Anónimo disse...

Lembro-me agora que a Studer cantou as "4 Ultimas Canções" em Lisboa. Infelizmente não estava em tão boa forma como no anterior recital em que também cantou Strauss. Tivemos cá mais ou menos pela mesma época também a Debora Voigt (depois de cantar os Troianos) e a Debora Polaski a cantar exactamente o mesmo reportório. Tempos afortunados em que não tinhamos que "gramar" um Nariz completamente desprovido de graça e consistência. Que desperdicio de recursos!

J. Ildefonso.

Anónimo disse...

Viva J. Ildefonso,
Não me pronuncio sobre esta gravação, mas posso imaginá-la, dado o timbre tão straussiano da Studer. Pergunto-lhe se conhece a gravação da Leontyne Price dirigida pelo Erich Leinsdorf ?
Raul

Anónimo disse...

Caro Raul.

Não conheço a gravação que refere. Deve ser uma mina de sons carnais e sensuais:-))) Aliás conheço mal a carreira da Price. Quero há muito tempo comprar a sua Aida com o Vichers mas só encontro numa versão mid-price e gostava do grafismo do c.d. original.

J. Ildefonso.

J. Ildefonso.

Anónimo disse...

Já agora! A versão mais excêntrica das "4 Ùltimas Canções" que tenho é a da Freni ao vivo com o Peter Maag a dirigir. É muito curiosa porque estabeleçe com muita clareza uma ligação entre os contemporaneos Strauss/Pucini.

J. Ildefonso.

Anónimo disse...

Caro J. Ildefonso,
A Freni a cantar As Quatro Últimas Canções !!! Sim, deve ser interessante essa ligação Puccini-Strauss que tem toda a razão de existir. A música do Verismo é uma leitura de melodia imediata da influência wagneriana na ópera. As ideias do Falstaff só convenceu Puccini no Gianni Schichi e nalgumas linhas do Primeiro Acto da La Bohéme.
Mas voltando à Price, aconselho-o vivamente a adquerir (RCA6722-2RG).
Além das canções tem um Despertar da Imperatriz da "Mulher sem Sombra" que nos fica gravado na alma. O CD contem também o Also Sprach Zarathustra.
Raul

Anónimo disse...

Vou procurar porque despertou o meu interesse. Muito obrigado.

J. Ildefonso.

Anónimo disse...

J. Ildefonso,
Se não encontrar, diga-me.
Raul

Anónimo disse...

Tem razão Raul. Ouvi há já muito tempo na casa dum amigo a Price a cantar a referida faixa da "Mulher sem Sombra" e ainda me lembro que praticamente saltei do sofá:-)))

J. Ildefonso.