quarta-feira, 27 de setembro de 2006

Mozart & Fanatismo: paradoxos da omnipotência

Nunca a Ópera de Berlim esteve tanto na berra, por razões absolutamente estranhas ao mérito das suas produções!

O caso Idomeneo é patético e paradoxal!

A propósito de uma alegada ameaça fanática, a directora da citada ópera decidiu retirar da programação da actual temporada uma produção de Idomeneo, de Mozart.

A ópera - de segunda linha -, na produção em questão, incluía uma exibição das cabeças de Jesus Cristo, Buda e Maomé, entre outros, numa clara alusão à fragilidade dos profetas.

Daí a outras críticas, extensíveis às religiões que os ditos profetas representam, vai um tirinho!

Aqui para nós, apesar de ser agnóstico, creio que a renúncia categórica ao divino merece ser enquadrada no âmbito da (nossa) omnipotência criadora: negar / exterminar o criador - seja ele qual for - equivale a concentrar no humano toda a génese!

Se a tese pode vingar, em termos científicos, o que dizer do simbolismo subjacente a tal renúncia?

Bem ou mal, o nosso imaginário encontra-se ancestralmente dominado pela ideia de fragilidade = humana vs omnipotência = divina.

Idomeneo
, na criação mozartiana, questiona estas últimas equações; a produção da Ópera de Berlim, vai mais longe!
Dir-se-ia tratar-se da omnipotência elevada ao quadrado!

Eis senão quando, face a uma simples ameaça,
a dita produção é retirada de cena, numa claro volte-face impregnado da mais pura fragilidade humana.

Interessante é, justamente, esta capacidade de, num momento enaltecer a soberania humana - governada pela toute-puissance -, para, no momento seguinte, paradoxalmente, se assumir a incontornável dependência e fragilidade (tão tipicamente) humanas!

terça-feira, 26 de setembro de 2006

Dissoluto Punito & Seus Ódios Figadais!!!

Consola-me saber que adjectivos como "mau" se refinam, mercê de um esforço absoluto, sintético, seja lá ele qual for!

Com raras excepções - Tosca e La Boheme -, Puccini desagrada-me!

Pior...

A Madama Butterfly é uma pepineira execrável!
(aqui há dez anos, no Teatro Verdi - em
Florença - assisti a uma récita desta ópera cuja mediocridade teve o mérito de ultrapassar a xaropada da própria peça, coisa difícil!!!)

Pior...

A nova política comercial do Met - cuja saúde financeira vacila a olhos vistos - optou por difundir a première desta temporada - imagine-se!!! - em Time Square, que é o mais detestável local de uma das mais extraordinárias cidades que conheço!

Moral da história: como o belo, também o horrendo se transcende!

ps a Vós - caríssimos João Ildefonso & Raul, os meus mais fieis leitores - vos digo que, de vez em quando, polémicas é comigo!!!

Mozart 22 / DG... Ou Disse-me um Passarinho...

É já em Novembro próximo que a major DG inicia a comercialização do projecto Mozart 22, que animou a última edição do Festival de Salzburgo.

Aqui ficam algumas suculentas novidades...



...veremos se a coisa merece a pena...

sábado, 23 de setembro de 2006

Inconcebível!


(DG 00289 477 5886)

Pouco dado a epítetos, ainda em estado de choque pela audição deste monumental registo, aqui vão as minhas primeiras impressões, claramente dominadas pela indisfarçável comoção...

Para lá do antitético, nesta obra - maior, Mozart e Terfel fundem-se: o espírito e a carne, o dentro e o fora, conteúdo e forma, a razão e a fé...

Esta fusão é da ordem do divino!

Bryn homenageia Wolfgang, como ninguém o fizera neste ano de comemorações, recriando a lírica mozartiana em toda a sua plenitude, num exercício de versatilidade raramente observável: buffo, pueril, lírico, recatado, singelo, corrosivo, malicioso, tremendo, colossal...
Mas, invariavelmente melodioso, metódico e disciplinadíssimo!

Símbolo absoluto do apogeu e maturidade de Bryn Terfel, este registo revela um intérprete genial, capaz de revitalizar o universo mozartiano, que requer, sem concessões, recato e sentido de câmara, singeleza, lirismo, brio, ironia e malícia...

A voz - agora solar, dourada... - mantém o corpo e densidade de sempre, convocando o pudor e o descaramente, sempre que necessário! Como (quase) ninguém, Terfel materializa o histrionismo: na mesma linha, revela-se dócil e terno, matreiro, pérfido, explosivo, colérico...

Em matéria de Mozart lírico (desde este memorável e deste incontornável), na actualidade, o resto é acessório!

Cada vez mais, creio que Mozart, no tocante à voz masculina média e grave (ou média - grave, a ler como baixo-barítono, rigorosamente) escreve-se com T.

Correndo o risco de pouco mais ter a acrescentar, prometo re-visitar este registo, assim que a razão tomar a dianteira...

Heresias!?

Wagner desvirtuado, heterodoxo, alternativo, violado?
Saiba tudo, aqui.

sexta-feira, 22 de setembro de 2006

Semiramide - Sutherland, Horne & Bonynge

Sai (mais) um fundo-de-catálogo, quentinho, quentinho, acabadinho de sair!


(DECCA - 475 7918)


Próximo da ruína, Dissoluto Punito conta com mais uma audição para o fim-de-semana...

Tutto, tutto, tutto, tutto, tutto, tutto, tutto, tutto TERFEL!!!!!!!!!!!!!



Enfim, já cá canta!
Urrrrrrrrrrrra!
(ando à espera desta pérola - seguramente! - há annnnnnnnnnos!)

Por ora, o tempo é de audições...
Dissoluto Punito promete, para breve, muita prosa, a propósito deste Mozart!

quarta-feira, 20 de setembro de 2006

A Valquíria, segundo Furtwangler... Ou Disse-me um passarinho

... é uma das mais perfeitas! Incontornável! Conta com Modl, Frantz, Rysanek e Suthaus!!!

Nada mais, nada menos!

A minha edição - da EMI Référence -, encontrei-a em Paris, num golpe de sorte!

É pena que Furtwangler não tenha gravado, em estúdio, as restantes obras que compõem o ciclo... Resta uma interpretação live at alla Scala.

Bom, o que aqui me trás é a descoberta desta edição, da Naxos, da referida interpretação!!! Ainda para mais, deve custar mais dúzia de cobres...

Toronto - O Anel quadrifacetado

É redundante falar da Tetralogia wagneriana, fazendo alusão às quatro "faces" que a compõe! A menos que se trate de uma original (mas não única!) proposta de entregar a encenação da dita cuja a quatro encenadores diferentes.



(imagens da nova produção de O Anel do Nibelungo, no
Four Seasons Center for the Performing)

Assim foi, em Toronto, no recém-inaugurado Four Seasons Center for the Performing Arts, como aqui se relata.


(o
Four Seasons Center for the Performing, em Toronto)

segunda-feira, 18 de setembro de 2006

O Contralto Rossiniano

Nos dias que correm, o contralto encontra-se em extinção!

Em boa verdade, desde o desaparecimento (prematuro...) de Kathleen Ferrier, os papeis de contralto passaram a ser assumidos por tessituras próximas - mezzo, no caso feminino, ou contratenor, no masculino.

Sendo discutível, a opção decorre da manifesta raridade de vozes femininas que se movimentem com grande à-vontade nos registos mais graves.

Os repertórios barroco, clássico e belcantista / romântico - falo de Rossini, sobretudo - consagraram inúmeras páginas ao contralto (sendo que, na época, a actual divisão de tessituras era inexistente).

Destacaria, neste âmbito, a escrita rossiniana, porventura a mais exigente, dado o virtuosismo que encerra.

Há dias, por mera casualidade, deparei com este registo de Ewa Podles, integralmente dedicado ao contralto rossiniano. Não hesitei um só segundo em adquiri-lo!

Podles fascinara-me, há uns anos, na Ariodante (de Handel), onde sob a direcção de Minkowski interpretou um Polinesso impressionante.

Nesta interpretação - que os franceses veneram, não sem razões... -, é interessante observar a diferença nítida entre as tessituras de Von Otter (mezzo) e Podles (mais na linha do contralto).
Não há margem para dúvidas!!!

De qualquer modo, curiosamente, na maioria dos casos, a intérprete polaca apresenta-se como mezzo! Surpreende-me, pois a meu ver, o seu registo dominante é o grave!!!

Porém, a razão que ora aqui me trás prende-se com este artigo, que conta já com alguns anitos.



(NAXOS 8.553543)

Ewa Podles aborda todo o leque rossiniano - buffo, serio, lírico e coloratura, etc.

Sinteticamente, diria que esta magistral cantora se impõe pela robustez cénica e vocal, evidenciando fragilidades no tocante à agilidade.

Podles possui uma voz grande e ampla, bem cheia. Combina bem com o domínio heróico e lírico-travestido - Arsace (Semiramide) Tancredi (da ópera homónima), Calbo (Maometto II) e Malcolm (La Donna del Lago).

Já no tocante ao domínio buffo-coloratura, se é verdade que convence pelo humor, no que se refere à ornamentação vocal (leia-se agilidade / coloratura), titubeia.

Ainda assim, não possuindo, nem a disciplina, nem a técnica belcantista (vide Horne, Valentini-Terrani, Baltsa e Bartoli), esta singularíssima intérprete convence!

Ewa Podles goza de uma impar versatilidade teatral, a que se associa uma imensidão de meios!



Nota: não servindo de argumento - espera-se! -, advirto que este registo ronda os 6 euros, dado que a NAXOS mantém a sua politica baseada em intérpretes pouco conhecidos (!?), comercialmente não onerosos...

domingo, 17 de setembro de 2006

Fleming 2 / 2... ou Disse-me um passarinho

Para muito breve, La Fleming estará disponível num registo discutível...
Cheira a pressão da major DECCA (como neste caso)...

Bem ao jeito pop´larucho, Fleming reincide num repertório pouco conforme à sua personalidade artística, aparentemente.

Ver-se-á...

Fleming 1 / 2

Este registo - um produto do (tão em voga) crossover -, fruto da colaboração entre Brad Mehldau & Renée Fleming, de sublime apenas tem as sumptuosas vocalizações da citada senhora, que desenham arcos melódicos intermináveis, a par da última faixa - Love Sublime -, efectivamente deslumbrante!


Quanto à composição de Mehldau - que apenas conheço do Jazz, género que objectivamente não domino... -, soa a dissonâncias gratuitas, sem consistência alguma.

As letras, em redor de um misticismo de trazer por casa, em nada ajudam...

Bref
, uma curiosidade sem grande interesse...

sábado, 16 de setembro de 2006

Mozartiana(o)s... A propósito da androginia de Kozená

Em pleno ano de comemorações mozartianas, eis um dos mais aguardados registos discográficos da rentrée!


(ARCHIV 00289 477 5799)

Em meu entender, a actual geração de cantoras líricas conta com destacadas intérpretes mozartianas: Fleming, Bartoli, Bonney, Graham, Kasarova e Garanca, além de Kozená, cuja veia mozartiana merece uma discussão mais profunda...

Pessoalmente, no que ao compositor em questão concerne, impressionam-me as três primeiras.



Se é verdade que Fleming (soprano) é algo superficial, nunca é de mais sublinhar a pureza do timbre, a par da voz infinitamente redonda e luminosa, atributos que combinam na perfeição com o Mozart puramente lírico - Condessa, Fiordiligi, Donna Elvira, Pamina, etc.

Já Bartoli (mezzo-sopramo) investe noutra linha. Combina agilidade e lirismo como ninguém, acrescentando uma espessura temperamental vincada às suas interpretações.

Na minha perspectiva, Cecília Bartoli é a mais fina representante do Mozart - latino. As encarnações de La Bartoli contêm todas, sem excepção, garra, sangue fervilhante e fogosidade a rodos.

Bonney (soprano) - que já teve tempos mais felizes... -, como ninguém, é terna, muito doce e envolvente.

Prosaicamente, diria que Fleming cintila, Bonney adocica e Bartoli enerva, voilà!

Haverá espaço, neste contexto, para outras intérpretes? Seguramente! A prova reside na geração ora emergente, que Garanca e Kozená (esta última não sem reserva...) tão bem representam.

Vem esta longa prosa na sequência do registo de Magdalena Kozená integralmente consagrado a Mozart.

Há um bom par de anos, Kozená levantou a ponta do véu do seu Mozart...

Numa palavra, fascinou-me! O seu lirismo, contido, algo floral, cintilante, prefigurava uma intérprete mozartiana de mão cheia!
Num ápice, imaginei um Sesto heróico, um Cheru
bino audacioso, quiçá uma Vitellia mais humanizada do que o habitual...

Mas, Salzburgo - edição de 2002 -, contra todas as expectativas, revelou um Kozená-Zerlina decepcionante...

Doravante, vá-se lá saber por que razão (!?), a bela Magdalena apontou baterias a Handel, triunfando, nomeadamente como Cleópatra (Giulio Cesare); paralelamente, (re)investiu em Gluck, por exemplo como Paride (Paride ed Elena), onde se fundiu com a glória!
Fez muito bem, digo eu!!

Nos últimos tempos, por força das comemorações mozartianas, regressou a Mozart em dois momentos. Primeiro, pela mão de Mackerras, gravou um extraordinário Sesto, disciplinadíssimo e certeiro na coloratura, além de melodioso e translúcido na expressão. Mais tarde, partilhou com o marido - Simon Rattle - um registo de árias de ópera e concerto de Wolfgang Amadeus Mozart.

Centremo-nos, agora, neste último registo, que justificou o (já muito longo) post.

Magdalena Kozená tem, em absoluto, todos os requisitos vocais e técnicos para abordar Mozart. Não sei se poderei dizer o mesmo, com igual convicção, dos seus atributos artísticos (interpretativos e dramáticos)...

A voz - muito aberta, magra, fina e delgada, de grande elegância e brilho, cristalina, com um toque algo pueril e assaz diáfano, roçando o andrógino - corresponde, na perfeição, ao registo de mezzo lírico mozartiano - travestido (Ludwig, dos primeiros tempos, Von Stade, Von Otter, Kirchslager, por exemplo), registo que se consubstancia em personagens como sejam Cherubino, Idamante (Idomeneo), Cecilio (Lucio Silla), Sifare (Mitridate, Re di Ponto) e Sesto.

Ora, no presente registo discográfico, Kozená aborda algumas personagens que se encontram aquém e além da sua tessitura e dotes interpretativos. Falo de Suzanna, Vitellia e Fiordiligi, por exemplo. O risco deste projecto é, pois, indiscutível.

Paralelamente, são ainda encarnadas figuras (femininas) mais buffas do mesmo repertório, que convocam humor fino, ironia e malícia - Dorabella e Despina.

Em meu entender, o registo Mozart Árias - inquestionavelmente arrojado, pelos riscos - impressiona, ma non tropo!

É verdade que a voz conserva o brilho e luminosidade de sempre, mas interpretar Mozart é bem mais difícil e sério do que parece, exigindo muito mais do que uma disciplina vocal sólida, que Kozená possui, sem sombra de dúvida!

Falta-lhe, antes de mais, feminilidade, ousadia, malícia e capacidade de sedução, na construção das personagens femininas - o calcanhar-de-Aquiles deste projecto!

Diria que Madalena Kozená peca por um certo anonimato sexual, presa que se encontra da androginia.

Um toque picante, mais teatral, nas interpretações, seria o bastante para retirar as personagens da indiferença e limbo afectivo!

Gosto de uma Susanna mais solta e atrevida - não tão bem comportada -, de uma Despina sábia e matreira, de uma Dorabella mais feminina e habitada - que aqui soa a rapazinho!!! -, de uma Vitellia fêmea - condoída, de uma Fiordiligi menos neutra!

Em contrapartida, o Cherubino, apesar do excesso de liberdades, é audacioso e palpitante, levando a melhor!

Em duas palavras, diria que, lado-a-lado com uma disciplina e sanidade vocal inquestionáveis, caminha uma parca feminilidade.
Se é verdade que a voz é graciosa, as mulheres de Kozená mais parecem criaturas de identidade sexual dúbia (para não dizer aprendizes de camionistas, pese embora o meu exagero!)...

Definitivamente, em minha opinião, este projecto vem provar duas coisas: Kozená não é uma intérprete teatralmente versátil - escapa-lhe o buffo, sendo certo que triunfa no serio; para além disso, à semelhança de Von Otter, o seu futuro profissional passa, indubitavelmente, pelos papeis travestidos (sublinho o travestismo profissional, pois que a sua feminilidade e beleza falam por si, não suscitando quaisquer dúvidas!).

quarta-feira, 13 de setembro de 2006

Natalie la GRANDE à l´ouverture de la saison 2006 / 2007 de l´ONP

Começou como soprano ligeiro, cresceu como spinto...
É uma cantora extraordinária, com uma notável veia teatral, tão buffa quanto seria!
Sempre imaginei que, um dia, seria Violetta V.
Só não acerto no loto...

Por ora, é 100% Lucia - recordo que já foi Lucie! -, numa reprise de uma produção a que tive a felicidade de assistir (duas vezes! Sim, duas!!) com Anderson e Lopardo nos papeis titulares, corria o ano de 2000.
Sem surpresas, a mise-en-scène de Serban foi pateada até ao âmago...



Pergunto-me, querida Natalie, se acedeste à acrobacia da flauta / vocalização - no final da cena de loucura -, que sempre disseste recusar, dado que Donizetti não a escreveu?!
A de Anderson foi inimaginável... Não duvido um só segundo da tua...

segunda-feira, 11 de setembro de 2006

11 / 09: a Castração

Há alguns meses, a propósito do filme de Oliver Stone que versa sobre os trágicos acontecimentos de 11 de Setembro de 2001, escrevia eu, num acesso delirante (conforme aqui se pode ler):

"Os trágicos acontecimentos ocorridos a 11 de Setembro de 2001 - particularmente no tocante à absoluta destruição do World Trade Center -, além de darem conta da vulnerabilidade estado-unidense (nos antípodas da omnipotência, sentimento que até à dita data reinou, sobretudo), a meu ver, decorrem de uma ansiedade tipicamente neurótica, na acepção psicanalítica: a ansiedade de castração.

De facto, não creio existirem símbolos mais afins com o poder fálico do que o World Trade Center, bem como a super-estrutura armada Pentágono!

Obviamente refiro-me à expressão fálica em termos simbólicos, dado que ambos os edifícios constituem duas expressões de poder absoluto: financeiro - no caso das torres - e militar - no caso do Pentágono.

Em minha opinião, o que se pretendeu com os atentados ocorridos a 11/09 nada teve que ver com um desejo de aniquilamento ou de erradicação maciça!
Antes se procurou lesar uma parte do mundo, isto é, castrá-la, tão profundamente quanto possível.

Resta dizer que, no que ao desenvolvimento psíquico diz respeito, a ansiedade de castração é organizadora, não apenas por confrontar o individuo com os seus limites e fragilidades, como por estabelecer alguns dos interditos fundamentais (nomeadamente os que decorrem da regra fundamental da interdição do incesto)..."

Mantenho o que disse!



Esta magnífica imagem - retirada desta notícia do The New York Times - fala por si: em redor da ausência / falha, há uma imensidão, uma vastidão de edifícios que evocam poder e soberania.

Mas, O BURACO (ground zero) é indisfarçável...

domingo, 10 de setembro de 2006

Met Opera House - 2006 / 2007

Com um Don Carlo desta craveira, não admira que a minha viagem a New York - a banhos, leia-se! - tenha de sofrer uma pequena antecipação!!!
Como alternativa, aqui vai um obrigatório Don Carlos (versão francesa), que em tempos recomendei.

sábado, 9 de setembro de 2006

I let the (BAD TASTE) music speak

Enquanto Fleming faz incursões jazzisticas, Von Otter entrega-se ao - ora em voga - crossover...



Pela parte que me toca, assumidamente preconceituoso que sou, recuso-me a embarcar nesta aventura!

Von Otter sempre se afirmou pelo ecletismo, sinceridade, seriedade e talento, em Monteverdi, Strauss, Berg, Mozart, Haendel, etc., etc.

Depois da escapadela por territórios de Costello, é agora a vez do mau gosto despudorado assumir a dianteira: cons
agrar um registo discográfico, em exclusivo, aos ABBA, que encarnam o horror pop dos idos 1970, é o cúmulo!!!

Estas palavras, minha cara e adorada Anne Sofie, são areia para os olhos!!! Diz, ao invés, que a gananciosa DG te pretende arrancar as entranhas da voz, antes que cesses de cantar!

Interessante é observar como esta obscenidade vinga em território luso: é ver, Senhoras e Senhores, como, num ápice, Von Otter e o seu bad-taste Project esgotam a sala da fina flor dos melómanos da capital...

Pode ser que, na próxima temporada, a programação opte por António Calvário, por exemplo, interpretando O Lamento de Ariana!

Pergunto-me, paciente leitor, para quando uma Ora Zumba da Caneca interpretado por Anne Sofie Von Otter, ou um Eu Tenho Dois Amores?!

Crossover, por crossover...

Ele há coisas...

sexta-feira, 8 de setembro de 2006

Real vs Ideal...

Entrementes, algumas major´s contrapõem homenagens a figuras reais da lírica: Sutherland e Vishnevskaya. Ambas geniais, pela humanidade e assumida fragilidade: a primeira, imbatível na técnica, pecava pela inabilidade interpretativa; a segunda, de técnica mais frágil, de timbre menos esbelto, era sumptuosa na criação dramática.



Sutherland e Vishnevskaya mostram-nos o que de mais extraordinário há no género humano, sem que pretendam ocultar o que de mais inexorável povoa a nossa natureza: a falha.

Nos antípodas, a recentemente falecida Schwarzkopf - à semelhança d´A Callas -, vítima incontestável da ferida narcísica, almejava a divindade, procurando fazer da citada falha uma miragem...

É o retomar do velho debate entre o Real e o Ideal.

quarta-feira, 6 de setembro de 2006

Obituário: Astrid Varnay (1918 - 2006)

Definitivamente, este blog encontra-se ensombrado pela ansiedade de perda...



Após o rol de desaparecimentos de notáveis intérpretes das décadas de 1950 e 1960, é agora a vez de a última grande actriz-cantora wagneriana entregar a alma ao criador, juntando-se aos demais deuses, no Walhalla.

A morte de Varnay - soprano dramático wagneriano e (é bom não esquecê-lo!) straussiano - encerra um ciclo, que ora finda. Astrid perece, depois de Flagstad, Hotter, Windgassen, King, Rysanek e Nilsson. Com ela parte a mítica geração de intérpretes wagnerianos...

A perda e o trabalho de luto - labor depressivo - rimam, também, com a idealização, há que dizê-lo, com clareza!

Pessoalmente, recordo Varnay como Salome, Brunhilde, Isolda e Klytaemnestra. Admiro, sobretudo o seu infinito talento dramático, não negando as suas inúmeras fragilidades vocais.

Os duros empregos a que submeteu a voz, ao longo da década de 1950, comprometeram inexoravelmente as suas interpretações. Ainda assim, com inteligência e talento, à semelhança de Leonie Rysanek, passou de soprano dramático a mezzo-dramático, encarnando uma incontornável e definitiva
Klytaemnestra (como aqui referi), a par de uma não menos famosa Kostelnicka (Jenufa, de Janaceck)

A meu ver, Astrid V. foi uma soberba actriz dramática com dotes vocais apreciáveis. É assim que se perpetua na minha memória.

O The Guardian e o New York Times apresentam interessantes resenhas da carreira invulgar desta «besta-cénica».



Paz à sua alma...

sexta-feira, 1 de setembro de 2006

Fim-de-semana com... Rossini serio & buffo!!!

Parto, em viagem de fim-de-semana, na companhia de Rossini.
Centrarei (parte d´) o meu lazer em duas preciosidades que adquiri em Florença, há sensivelmente um ano...
Depois, dir-vos-ei!!!

Elisabeth SCHWARZKOPF: best of Opera (EMI)



Como tive ocasião de referir inúmeras vezes, a meu ver, Schwarzkopf foi o soprano lírico mozartiano e straussiano dos anos 1950, tendo apenas disputado este estatuto com Lisa Della Casa (sendo que, no essencial, Elisabeth levou a melhor...).

À semelhança do que havia prometido, por ocasião do desaparecimento da mítica intérprete, consagro este post a um (pessoalíssimo) best of opera discográfico de Elisabeth Schwarzkopf, apenas e só no tocante às edições da EMI Classics, a sua casa de referência, por razões sobejamente conhecidas de todos os apreciadores de lírica.

Advirto o leitor para a circunstância louvável de dispormos de uma trilogia mozartiana ao quadrado!

Schwarzkopf teve a ocasião de interpretar em estúdio (excepção feita ao primo Don, captado ao vivo em Salzburgo) a célebre trilogia, em dois momentos da sua carreira: Così Fan Tutte, 1955 & 1963, Le Nozze di Figaro, 1952 & 1961 e Don Giovanni, 1954 (live) & 1961.



Se é verdade que a frescura vocal marca as interpretações da década de 1950, as da década seguinte contêm a marca inabalável da mestria teatral. É só escolher, como se tal fosse possível!

Já no tocante a Richard Strauss, infelizmente não dispomos de igual sorte...

Ainda assim, a discografia deste compositor conta com leituras absolutamente indispensáveis, protagonizadas por Elisabeth Schwarzkopf: Ariadne auf Naxos, Capriccio e Der Rosenkavalier. Pergunto-me por que razão não gravou A Mulher sem sombra, Daphne ou mesmo Arabella?!



De facto, em todas elas, teria de afrontar as titulares discográficas e cénicas dos papeis principais femininos, respectivamente Ryzanek, Guden e Della Casa (esta última imbatível, na época!!!)

Termino com um registo não - operático absolutamente incontornável, porventura o maior, mais belo e eloquente legado de La Schwarzkopf (ex equo com a Condessa d´As Bodas de Fígaro, preferencialmente no registo de 1961, sob a batuta genial de Giulini): ...Vier Letzte Lieder, de Richard Strauss, na extraordinária e soberana interpretação de 1966, tão bela e pueril quanto melancólica, diáfana e dilacerante!
Um monumento lírico com poucos paralelos!!



nota: caso o leitor pretenda a lista integral de registos da intérprete, disponíveis na EMI, clique aqui.

Hans Hotter & La Calunnia (Rossini)



Na história da lírica, Hans Hotter ocupa um lugar único.
O baixo-barítono alemão é, para mim, o mais impressionante intérprete de sempre, sendo O meu cantor de eleição.

Especialmente para si, caro leitor, que apenas identifica Hotter com o repertório (pesado) wagneriano, aqui vai um Hotter buffo até à medula!

Os grandes, grandes intérpretes são versáteis, além de monumentais!!!