Ópera, ópera, ópera, ópera, cinema, música, delírios psicanalíticos, crítica, literatura, revistas de imprensa, Paris, New-York, Florença, sapatos, GIORGIO ARMANI, possidonices...
quinta-feira, 30 de agosto de 2007
Salzburgo VII - O Balanço
No ocaso da edição de 2007, exultante, Jürgen Flimm diz de sua justiça:
«[Le public est-il toujours aussi snob et argenté qu'on le dit ? ]"Je me réjouis que des gens riches achètent les places les plus chères, pour de bonnes ou de mauvaises raisons, et qu'ils organisent des fêtes somptueuses. Mais les riches ne sont pas toujours les plus bêtes... Et c'est un ancien soixante-huitard qui vous dit ça !"»
Portanto, fica o leitor a saber que este escriba, de tonto, nada tem!
Imagens de um conservador...
...de trazer por casa ;-)))
G.W.Bush, ossia O Acéfalo, não pode ter melhor sorte senão esta: ser distorcido pela pornografia.
Isto, sim, é obra da (mui nobre) perversão!
Mysterious Skin: da perversão à histeria
Mysterious Skin é um filme absolutamente brutal, que versa sobre a repercussão do abuso sexual na vida de dois jovens.
Duas crianças da América profunda, de idades muito próximas – cerca de oito anos - são sexualmente abusadas por um treinador de baseball, que dirige a equipe onde ambas jogam.
Doravante, os destinos destes dois indivíduos não mais se cruzarão, à excepção de um encontro pontual, ainda que profundamente marcante.
As crianças provinham de famílias francamente distintas. A de Brian, mais convencional, apesar de o pai se encontrar pouco implicado na dinâmica familiar, mormente na educação do filho, sendo que, mais tarde, o mesmo pai se separa da família, mantendo contactos muito esporádicos com o filho. A família de Neil, monoparental, conta com uma mãe sui generis, afectivamente muito instável – múltiplos parceiros, relações fugazes -, com um relacionamento com o filho marcado pela ausência de limites.
Do ponto de vista psicológico, o filme tem o mérito de questionar algumas verdades feitas, nomeadamente as que sustentam a tese do traumatismo pós-abuso sexual, como se o dito traumatismo fosse universal, não variando em função da estrutura do abusado (e do contexto em que este se organizou e vive).
Ora, curiosamente – ou não – as duas crianças fazem evoluções radicalmente distintas, após a violação de que são alvo, perpetrada pelo treinador.
Neil, o narrador, faz uma evolução claramente perversa, enveredando pela prostituição homossexual. Frio, cru, desviante, calculista e incapaz de estabelecer vínculos, este indivíduo choca o espectador – entre outras coisas – pela ausência de culpabilidade ligada ao seu estilo de vida.
Já Brian evolui numa linha claramente histérica, sendo a inibição marcante na sua conduta. À boa maneira neurótica – histérica, no caso -, este sujeito defende-se da situação traumática por via da acção do reprimido: a representação do acontecimento é literalmente esquecida, sendo afastada da consciência. Por outro lado, o sintoma – o sangramento frequente do nariz – e bem assim os sonhos de repetição - pesadelos de rapto -, ambos impregnado de simbolismo que evoca o traumatismo originário, constituem-se como representantes do retorno do recalcado, ou seja, permitem aos conteúdos inconscientes migrarem (ainda que de forma camuflada) para a consciência.
Pela natureza da sua organização neurótica, Brian estrutura uma narrativa explicativa da situação traumática, que embora aberrante e pouco credível, atesta da sua capacidade psíquica: o sujeito pensa, verdadeiramente, não tendo necessidade de agir, contrariamente a Neil, claramente impulsivo, incapaz de pensar (ou seja, fantasiar, criar uma narrativa, ter actividade psíquica, reprimir, enfim).
Freud definira a neurose como o negativo da perversão. Pois bem, a trama deste filme só vem reforçar a actualidade desta tese! Neil, o perverso, segue a linha da impulsividade, ao passo que Brian, o histérico, mantém uma actividade psíquica constante, francamente condicionada pela acção defensiva do recalcamento.
Segundo penso, as evoluções pós-trauma das personalidades descritas – radicalmente antagónicas, como explicitei – decorrem de estruturas psíquicas distintas, não sendo negligenciável, neste contexto, o papel do meio.
De facto, no caso do sujeito mais perturbado, deparamos com uma estrutura familiar marcada pela ausência do paterno, ab initio. Se bem repararmos, jamais é feita uma singela referência ao pai de Neil!
Dir-me-á o leitor – não sem razão – que a ausência paterna não redunda, necessariamente, numa evolução homossexual, muito menos numa estrutura perversa! Contudo, neste caso, o mais aberrante é a inexistência de espaço psíquico para o paterno, tanto na mãe, como no filho. Ironicamente, quando a mãe "decide dar um pai ao filho", oferece-lhe um (treinador) perverso...
Já no caso de Brian, a configuração familiar é de molde a determinar uma evolução mais sadia. Além de uma mãe mais adequada, existe um pai, fisicamente esguio, embora presente mentalmente; há um pai, para o bem e para o mal, com quem o sujeito pode zangar-se – reclamando pela sua ausência, nomeadamente.
Pessoalmente, diria tratar-se de um filme notável, ainda que de uma crueza quase insustentável, sem o mais leve laivo de moralismo. Incontornável, para (alguns) psis.
domingo, 26 de agosto de 2007
Ladrões de bicicletas
Ladrões de bicicleta é, seguramente, dos mais belos filmes a que assisti.
Do meu ponto de vista, esta película constitui uma esplendorosa ilustração da Castração, tal como Freud a definiu. Aliás, se algum movimento artístico prestou homenagem à Freudiana, por via do enaltecimento da dita Castração, inequivocamente, tal movimento foi o neo-realismo italiano.
No essencial, a Castração – que Frued define no contexto do complexo de Édipo - mais não é do que uma metáfora sobre a impotência, os limites do humano. Prosaicamente, a Castração define o humano-neurótico, como a omnipotência caracteriza o funcionamento narcísico: o reconhecimento do limite, a assunção da incapacidade – que organizam e estruturam o psiquismo do normalo-neurótico – encontram na omnipotência narcísica – autarcia, toute-puissance - o seu contrário.
Ao nível manifesto, de facto, o que as obras de Viscontti – Ossessione, Rocco e os seus irmãos, Belissima –, Rossellini – Roma, cidade aberta - e De Sica – Ladrões de bicicletas – retratam é, fundamentalmente, a adversidade poliforme, ditada pela guerra e capitalismo desumano.
Já no plano latente – cuja leitura implica uma depuração radical do manifesto -, o discurso assume outros contornos, posto que o homem – o homem do povo, entenda-se - é colocado no trilho da incapacidade: vítima de um sistema (capitalista, evidentemente) desumano e frio, o plebeu surge na sua condição mais desprotegida, incapaz de escapar ao destino, destino forçosamente adverso e inexorável.
Ora, em Ladrões de bicicletas, o olhar de De Sica sublinha a impotência de um homem do povo: a realidade plenamente adversa cerceia as aspirações de Antonio, que pretende, apenas, laborar e, por essa via, expressar a sua condição de homem, activo, produtivo, viril e leader.
O roubo da bicicleta – haverá exemplo mais eloquente da "apropriação [indevida] dos meios de produção", que tanto excitou uma certa esquerda (à época pertinente, hoje tão caduca)? – constitui, na película, a condenação derradeira do herói à impossibilidade de agir e produzir, impossibilidade tributária da suma incapacidade, bem entendido.
Do meu ponto de vista, esta película constitui uma esplendorosa ilustração da Castração, tal como Freud a definiu. Aliás, se algum movimento artístico prestou homenagem à Freudiana, por via do enaltecimento da dita Castração, inequivocamente, tal movimento foi o neo-realismo italiano.
No essencial, a Castração – que Frued define no contexto do complexo de Édipo - mais não é do que uma metáfora sobre a impotência, os limites do humano. Prosaicamente, a Castração define o humano-neurótico, como a omnipotência caracteriza o funcionamento narcísico: o reconhecimento do limite, a assunção da incapacidade – que organizam e estruturam o psiquismo do normalo-neurótico – encontram na omnipotência narcísica – autarcia, toute-puissance - o seu contrário.
Ao nível manifesto, de facto, o que as obras de Viscontti – Ossessione, Rocco e os seus irmãos, Belissima –, Rossellini – Roma, cidade aberta - e De Sica – Ladrões de bicicletas – retratam é, fundamentalmente, a adversidade poliforme, ditada pela guerra e capitalismo desumano.
Já no plano latente – cuja leitura implica uma depuração radical do manifesto -, o discurso assume outros contornos, posto que o homem – o homem do povo, entenda-se - é colocado no trilho da incapacidade: vítima de um sistema (capitalista, evidentemente) desumano e frio, o plebeu surge na sua condição mais desprotegida, incapaz de escapar ao destino, destino forçosamente adverso e inexorável.
Ora, em Ladrões de bicicletas, o olhar de De Sica sublinha a impotência de um homem do povo: a realidade plenamente adversa cerceia as aspirações de Antonio, que pretende, apenas, laborar e, por essa via, expressar a sua condição de homem, activo, produtivo, viril e leader.
O roubo da bicicleta – haverá exemplo mais eloquente da "apropriação [indevida] dos meios de produção", que tanto excitou uma certa esquerda (à época pertinente, hoje tão caduca)? – constitui, na película, a condenação derradeira do herói à impossibilidade de agir e produzir, impossibilidade tributária da suma incapacidade, bem entendido.
sábado, 25 de agosto de 2007
La Bayo
Maria Bayo é uma intérprete de referência, com uma voz plenamente lírica, radiosa, muito fresca e dotada de uma musicalida extraordinária.
O meu primeiro encontro marcante – verdadeiramente, sublinho – com a soprano deu-se em Handel, por via deste magnífico registo, cuja interpretação floral e pueril de Da Temepeste (Giulio Cesare) me arrebata!
Segundo reza esta notícia, San Sebastian rendeu-se ao seu charme, num recital consagrado ao repertório francês e zarzuela:
«Bayo se creció, sintiéndose además correctamente acompañada por la orquesta suiza y su director español. Elevó el listón con Las hijas de Cádiz, de Delibes, en la primera propina, y se lanzó al infinito con una interpretación antológica de Chateaux Margaux. En pleno clima de apoteosis, la soprano recordó con La tarántula, que era alumna y admiradora de Teresa Berganza, pero conservando su personalidad. El público se puso en pie -algo no tan habitual en San Sebastián como en otros festivales- coronando la velada en atmósfera de franco éxito. De la orquesta quizá su momento más destacado fuese el intermedio de El baile de Luis Alonso. No perjudicó, en cualquier caso, a la cantante y acompañó con corrección en todo momento. Fue un recital, por encima de todo, amable, de los que conquistan y en los que se establecen vínculos de comunicación entre los artistas y el público.»
Não me surpreende que a aclamem!
O meu primeiro encontro marcante – verdadeiramente, sublinho – com a soprano deu-se em Handel, por via deste magnífico registo, cuja interpretação floral e pueril de Da Temepeste (Giulio Cesare) me arrebata!
Segundo reza esta notícia, San Sebastian rendeu-se ao seu charme, num recital consagrado ao repertório francês e zarzuela:
«Bayo se creció, sintiéndose además correctamente acompañada por la orquesta suiza y su director español. Elevó el listón con Las hijas de Cádiz, de Delibes, en la primera propina, y se lanzó al infinito con una interpretación antológica de Chateaux Margaux. En pleno clima de apoteosis, la soprano recordó con La tarántula, que era alumna y admiradora de Teresa Berganza, pero conservando su personalidad. El público se puso en pie -algo no tan habitual en San Sebastián como en otros festivales- coronando la velada en atmósfera de franco éxito. De la orquesta quizá su momento más destacado fuese el intermedio de El baile de Luis Alonso. No perjudicó, en cualquier caso, a la cantante y acompañó con corrección en todo momento. Fue un recital, por encima de todo, amable, de los que conquistan y en los que se establecen vínculos de comunicación entre los artistas y el público.»
Não me surpreende que a aclamem!
sexta-feira, 24 de agosto de 2007
quinta-feira, 23 de agosto de 2007
Rose Bampton (1907-2007)
Aos 99 anos de idade, Rose Bampton, mezzo-soprano-mezzo, entrega a alma ao criador.
Bampton, ao longo da sua carreira, balanceou, sucessivas vezes, entre o registo médio e o agudo – ora Amneris, ora Aïda, na mesma produção, imagine-se!
Fez mais furor no continente americano – EUA e Argentina, sobretudo – do que no velho continente.
O melómano mais refinado recordá-la-á como a Leonora de Toscanini, cuja “capa” aqui recordo.
Bampton, ao longo da sua carreira, balanceou, sucessivas vezes, entre o registo médio e o agudo – ora Amneris, ora Aïda, na mesma produção, imagine-se!
Fez mais furor no continente americano – EUA e Argentina, sobretudo – do que no velho continente.
O melómano mais refinado recordá-la-á como a Leonora de Toscanini, cuja “capa” aqui recordo.
quarta-feira, 22 de agosto de 2007
Colecções ALTAYA & DG
Embora haja muito de dispensável, a verdade é que alguns dos artigos desta colecta constam do catálogo da yellow-lab, a full-price.
Dito isto, para começo de conversa, recomendo os fascículos nºs 1, 4 e 5 (para além do nº 2, caso o leitor seja pucciniano, que não é o meu caso, à parte algumas excepções bem conhecidas!).
terça-feira, 21 de agosto de 2007
Drugs, Alcohol & Opera
Um leitor assíduo fez-me chegar este artigo, que versa sobre os bastidores (podres, diga-se!) da lírica: barbitúricos, droga e álcool constituem o melhor amigo dos intérpretes contra Ansiedade e Pressão empresarial, os dois cancros do mundo artístico.
Se me dissesse surpreso, estaria a mentir...
Em todo o caso, a proporção que o fenómeno atingiu é motivo de inquietação para todos os amantes (entre outras) da lírica.
«The disgraced world of cycling? No, this is a description of the stately world of opera, which is increasingly becoming the domain of drug and alcohol abusers, according to a top-class tenor.»
Curiosamente, na edição de hoje do Corriere della Sera, o mesmo "delator" volta à carga, como segue:
«In due parole: sui palchi della grande lirica ci si droga come sui tornanti del Tour de France. Mentre gli impresari chiudono un occhio: o peggio, contribuiscono alla rovina dei propri beniamini. Tutto questo lo dice, anzi lo urla, un esperto come Endrik Wottrich, 43 anni, celebre ugola wagneriana (e fidanzato della trisnipote di Wagner): «Certi manager sono come locuste, sanno che una bella voce può rendere milioni. Così vogliono sfruttarla il più possibile, e questa è prostituzione ». L'opera lirica «si sta cannibalizzando da sola — parole della mezzosoprano bulgara Vesselina Kasarova — gli impresari pretendono troppo, e sono sempre di più quelli fra noi che usano i farmaci per reggere a un certo stile di vita, o la chirurgia plastica per migliorare il proprio aspetto fisico».»
Pelo andar d'a coisa, ainda vamos ver as estrelas do firmamento lírico urinarem, no final das récitas, com vista a realizarem testes de despiste de substâncias psicoactivas, lícitas e ilícitas!
Se me dissesse surpreso, estaria a mentir...
Em todo o caso, a proporção que o fenómeno atingiu é motivo de inquietação para todos os amantes (entre outras) da lírica.
«The disgraced world of cycling? No, this is a description of the stately world of opera, which is increasingly becoming the domain of drug and alcohol abusers, according to a top-class tenor.»
Curiosamente, na edição de hoje do Corriere della Sera, o mesmo "delator" volta à carga, como segue:
«In due parole: sui palchi della grande lirica ci si droga come sui tornanti del Tour de France. Mentre gli impresari chiudono un occhio: o peggio, contribuiscono alla rovina dei propri beniamini. Tutto questo lo dice, anzi lo urla, un esperto come Endrik Wottrich, 43 anni, celebre ugola wagneriana (e fidanzato della trisnipote di Wagner): «Certi manager sono come locuste, sanno che una bella voce può rendere milioni. Così vogliono sfruttarla il più possibile, e questa è prostituzione ». L'opera lirica «si sta cannibalizzando da sola — parole della mezzosoprano bulgara Vesselina Kasarova — gli impresari pretendono troppo, e sono sempre di più quelli fra noi che usano i farmaci per reggere a un certo stile di vita, o la chirurgia plastica per migliorare il proprio aspetto fisico».»
Pelo andar d'a coisa, ainda vamos ver as estrelas do firmamento lírico urinarem, no final das récitas, com vista a realizarem testes de despiste de substâncias psicoactivas, lícitas e ilícitas!
segunda-feira, 20 de agosto de 2007
Rocco, de Visconti: Cara & Coroa
Em Rocco e os seus irmãos, na senda da verosimil e crua realidade, uma vez mais, Visconti retrata a inexorabilidade do destino: "desafortunado nasceste, desafortunado morrerás".
Se é verdade que a escola que Luchino Visconti fundara – o neo-realismo, justamente – eleva os enteados da fortuna à categoria de heróis, não menos verdade é a circunstância de a dita escola apregoar a Castração (no sentido freudiano), que se oculta sob a capa da imutabilidade: "os desfavorecidos jamais vingarão!"
À semelhança do que aqui se explicitou, é interessante verificar que, chez Visconti, os discursos político-sociológicos (e artísticos ou culturais) se opõem radicalmente à verdade da psicanálise, posto que a denúncia da injustiça e desigualdade apenas sublinha a incapacidade da vítima para inverter o infortúnio.
Em todo o caso, ainda que esta seja uma das linhas que mais se evidencia na película, do meu ponto de vista, deve ser dado particular relevo a duas personagens, porventura as mais destacadas da trama: Rocco e Simone, cara ou coroa (como se preferir).
Ambos se unem, na medida em que um é o negativo do outro: Rocco, hiper-adaptado, submisso e conforme, oculta as suas verdadeiras necessidades e aspirações, agrilhoando incondicionalmente a espontaneidade. Masoquista até ao limite do concebível, Rocco encarna o bom filho, amante abnegado e resignado, disposto a converter putas e marginais; Simone, impulsivo, estranho à lei e ordem, desviado, é o paradigma do desadaptado.
Psicopatologicamente, Rocco é o exemplo sumo do falso-self, enquanto Simone representa a patologia border-line, na sua expressão mais esplendorosa – vítima da ansiedade de perda, que nega a todo o custo, adicto, procura subjugar a realidade ao prazer, agindo por impulso, sempre em ruptura com a ordem.
Bem vistas as coisas, em jeito de balanço, diria que, embora os funcionamentos de Rocco e Simone sejam antagónicos, na expressão, do ponto de vista da problemática, estamos num território semelhante!
domingo, 19 de agosto de 2007
O Eterno Retorno
Findo o ciclo, como bem dita o mito, regressa-se ao início.
Com ou sem discussões em torno da génese da lírica operática, para o bem e para o mal, costuma considerar-se Orfeo - o de Monteverdi, claro está - a prima opera.
Esta é, pois, a face autêntica do número 25 - o último, está bem de ver! - da eternamente louvável colecção OS CLÁSSICOS DA ÓPERA - 400 ANOS.
Com ou sem discussões em torno da génese da lírica operática, para o bem e para o mal, costuma considerar-se Orfeo - o de Monteverdi, claro está - a prima opera.
Esta é, pois, a face autêntica do número 25 - o último, está bem de ver! - da eternamente louvável colecção OS CLÁSSICOS DA ÓPERA - 400 ANOS.
Katharina WAGNER strikes again
São já um fait divers as provocações de Katharina Wagner, que por via da provocação procura conquistar o "trono" de Bayreuth.
A estratégia, contudo, afigura-se eficaz. Quanto ao resultado da investida, apenas saberemos algo no final do mês, por ocasião da esperada reunião das cabeças pensantes (?) que dirigem o festival.
Provocadora ou não, acho graça à concepção da encenadora sobre Hans Sachs, habitualmente retratado como "certinho e bem comportado". Por que não perverter a coisa?
«Es, en general, el tratamiento del personaje de Sachs por la biznieta de Wagner lo que rompe todos los esquemas. Para Richard, era casi un álter ego, que compendia su mensaje positivo en una obra que trata de la lucha del arte nuevo por abrirse camino entre lo viejo. Para Khatarina, Sachs es un cooperador del sistema opresivo, un fumador empedernido y grafómano que recuerda curiosamente a Günter Grass, aunque "tampoco principalmente, porque son muchos los intelectuales liberales que con el tiempo se han vuelto muy conservadores". Otro personaje, Beckmesser, un oscuro funcionario que plagia y trampea para ganar el concurso de canto, encarna, en cambio, las fuerzas renovadoras.»
Aqui para nós, a motivação mais profunda da jovem tem matéria interessante para os psicanalistas: romper com o pai-todo-poderoso-criador... desidealizando-o, apenas e só! Ainda assim, algo que os descendentes mais directos não ousaram.
Et pourtant, Wagner continua magistral, como criador. Quanto ao resto, é irrelevante, no que à história da música diz respeito.
Os que se interessam por retratar e sublinhar o lado canalha de Wagner, que vejam (e revejam) Ludwig, por exemplo. Não façam é como os que o idealizam, entregando-se à clivagem, pois Wagner era - por certo -, entre muitas outras coisas, um "filho-da-mãe", como tantos outros.
sábado, 18 de agosto de 2007
Può Esere ??? Ossia, disse-me um passarinho...
...que estão para breve duas novidades, tão bombásticas, quanto arriscadas!
E mais não digo, por recomendação do Sr. Dr.
Para levantar a ponta do véu, apenas adianto que La Bartoli homenageia, com este trabalho, a célebre Maria Malibran. E mais não digo. Agora é que é de vez!
Bom, não morro por ceder a track-list...
Ei-la, pois:
1 Se un moi desir … Cedi al duol
2 Ira del ciel Giovanni Pacini Irene o l’assedio di Messina
3 Cari Giorni Giuseppe Persiani Ines de Castro
4 Infelice Scena ed Aria Felix Mendelssohn, London version
5 Yo que soy contrabandista Manuel Garcia El Poeta Calculista
6 Ah ! Non credea mirarti
7 Ah ! Non Giunge Amina Vincenzo Bellini La Sonnambula
8 Air à la Tyrolienne avec variations Johann Nepomuk Hummel
9 E non lo vedo … Son regina Semiramide Manuel Garcia La Figlia dell’aria
10 Rataplan Maria Malibran
11 Dopo tante e tante pene Giovanni Pacini For Rossini’s Tancredi
12 O Rendetemi la speme … Qui la voce
13 Vien, diletto Elvira Vincenzo Bellini I Puritani Version Malibran
14 Come dolce a me favelli Jacques Fromental Halévy Clari
15 Scorrete, o lagrime Lauro Rossi Amelia ovverro otto anni di costanza
16 Prendi, per me sei libero Adina Maria Malibran For Donizetti’s l’Elisir d’Amore
17 Casta Diva Vincenzo Bellini Norma
Quanto a Flórez, por seu lado, presta homenagem a O Rei dos Tenores do Século XIX, de sua graça Giovanni Battista Rubini.
E como quem cede uma, cede duas, eis a track-list do segundo artigo:
1 Bellini - Il pirata - Nei furor delle tempeste
2 Del disastro
3 Bellini - Il pirata - Per te di vane lacrime
4 ROSSINI : Elisabetta Regina [12’27] : 4. Che intesi
5 Rossini - Elisabetta Regina - Deh ! Troncate
6 Vendicar sapro
7 Donizetti - Marin Faliero - No no dabbandonaria
8 Di mia patria
9 Donizetti - Marin Faliero - Ma un solo conforto
10 ROSSINI : Il Turco in Italia [05’37] : 10. Intesi : ah tutto intesi
11 Rossini - Il Turco in Italia - Se il moi rival
12 BELLINI : Bianca e Fernando [14’36] : 12. Tutti siam
13 Bellini - Bianca e Fernando - Economi alfin
14 All’udir del padre
15 Bellini - Bianca e Fernando - Degna suora
16 Odo il tuo pianto
17 Rossini - La donna del lago - Pace non trovo
18 Tu sorda ai miei lamenti
19 Rossini - La donna del lago - Ah come nascondere
20 ROSSINI : Guglielmo Tell [12’36] : 20. Non mi lasciare
21 Rossini - Guglielmo Tell - O muto asil
22 Vendetta
23 Rossini - Guglielmo Tell - Corriam ! Voliam !
Moral da história: belcantistas do mundo, uni-vos!
Serei o primeiro a avançar?!
ps o leitor mais curioso irá, por certo, ao site da DECCA, em busca de informações adicionais... Será em vão, pois a minha fonte é outra, que não revelo, nem por uma ida ao TEATRO CÓLON, para breve ;-)
E mais não digo, por recomendação do Sr. Dr.
Para levantar a ponta do véu, apenas adianto que La Bartoli homenageia, com este trabalho, a célebre Maria Malibran. E mais não digo. Agora é que é de vez!
Bom, não morro por ceder a track-list...
Ei-la, pois:
1 Se un moi desir … Cedi al duol
2 Ira del ciel Giovanni Pacini Irene o l’assedio di Messina
3 Cari Giorni Giuseppe Persiani Ines de Castro
4 Infelice Scena ed Aria Felix Mendelssohn, London version
5 Yo que soy contrabandista Manuel Garcia El Poeta Calculista
6 Ah ! Non credea mirarti
7 Ah ! Non Giunge Amina Vincenzo Bellini La Sonnambula
8 Air à la Tyrolienne avec variations Johann Nepomuk Hummel
9 E non lo vedo … Son regina Semiramide Manuel Garcia La Figlia dell’aria
10 Rataplan Maria Malibran
11 Dopo tante e tante pene Giovanni Pacini For Rossini’s Tancredi
12 O Rendetemi la speme … Qui la voce
13 Vien, diletto Elvira Vincenzo Bellini I Puritani Version Malibran
14 Come dolce a me favelli Jacques Fromental Halévy Clari
15 Scorrete, o lagrime Lauro Rossi Amelia ovverro otto anni di costanza
16 Prendi, per me sei libero Adina Maria Malibran For Donizetti’s l’Elisir d’Amore
17 Casta Diva Vincenzo Bellini Norma
Quanto a Flórez, por seu lado, presta homenagem a O Rei dos Tenores do Século XIX, de sua graça Giovanni Battista Rubini.
E como quem cede uma, cede duas, eis a track-list do segundo artigo:
1 Bellini - Il pirata - Nei furor delle tempeste
2 Del disastro
3 Bellini - Il pirata - Per te di vane lacrime
4 ROSSINI : Elisabetta Regina [12’27] : 4. Che intesi
5 Rossini - Elisabetta Regina - Deh ! Troncate
6 Vendicar sapro
7 Donizetti - Marin Faliero - No no dabbandonaria
8 Di mia patria
9 Donizetti - Marin Faliero - Ma un solo conforto
10 ROSSINI : Il Turco in Italia [05’37] : 10. Intesi : ah tutto intesi
11 Rossini - Il Turco in Italia - Se il moi rival
12 BELLINI : Bianca e Fernando [14’36] : 12. Tutti siam
13 Bellini - Bianca e Fernando - Economi alfin
14 All’udir del padre
15 Bellini - Bianca e Fernando - Degna suora
16 Odo il tuo pianto
17 Rossini - La donna del lago - Pace non trovo
18 Tu sorda ai miei lamenti
19 Rossini - La donna del lago - Ah come nascondere
20 ROSSINI : Guglielmo Tell [12’36] : 20. Non mi lasciare
21 Rossini - Guglielmo Tell - O muto asil
22 Vendetta
23 Rossini - Guglielmo Tell - Corriam ! Voliam !
Moral da história: belcantistas do mundo, uni-vos!
Serei o primeiro a avançar?!
ps o leitor mais curioso irá, por certo, ao site da DECCA, em busca de informações adicionais... Será em vão, pois a minha fonte é outra, que não revelo, nem por uma ida ao TEATRO CÓLON, para breve ;-)
sexta-feira, 17 de agosto de 2007
Freud: Sartre vs Huston
Sabia da polémica, entre Sartre e John Huston, a propósito de um filme sobre o criador da psicanálise?
«En 1925, Samuel Goldwyn s'était déplacé jusqu'à Vienne pour tenter de convaincre Sigmund Freud d'écrire une histoire d'amour pour Hollywood. En vain. Quant à la collaboration entre Jean-Paul Sartre et John Huston sur le film Freud, elle avait bien commencé mais s'est mal terminée.»
«En 1925, Samuel Goldwyn s'était déplacé jusqu'à Vienne pour tenter de convaincre Sigmund Freud d'écrire une histoire d'amour pour Hollywood. En vain. Quant à la collaboration entre Jean-Paul Sartre et John Huston sur le film Freud, elle avait bien commencé mais s'est mal terminée.»
O horror da Beleza: um olhar psicanalítico
Habitualmente, Ossessione é considerado o marco fundador do neo-realismo italiano.
Pessoalmente, Belissima é O filme neo-realista, por excelência. Nele, a adversidade, brutalidade e crueza do mundo plástico-artístico são retratadas de forma esplendorosa, senão hiperbólica.
No essencial, o filme aborda a exploração de que são alvo adultos e crianças, por parte da industria cinematográfica, que alimenta de forma absolutamente perversa um ideal de fama e glória: pretende sacrificar-se a infância, a troco de reconhecimento artístico e valorização.
Obviamente, a promessa é vã.
Psicanaliticamente, o filme versa sobre a questão da valorização narcísica.
A mãe da criança – Ana Magnani, soberba! -, uma mulher de classe média-baixa, sente-se condenada à mediocridade, malgrado os esforços incessantes para ascender social e economicamente, por via do trabalho. Um dia, decide responder ao apelo da Cinecittà, que procura uma criança-prodigio, para interpretar um papel num filme. A senhora vê na filha o sonho da glória acalentada.
O aspecto mais marcante da trama – além das óbvias leituras político-sociológicas que a escola neo-realista pretende difundir, nomeadamente as que animam o pensamento da linha marxista (e sucessivas derivações) -, do meu ponto de vista, tem que ver com a relação instrumental estabelecida entre mãe e filha.
A pobre criança mais não é do que uma extensão da progenitora, um prolongamento narcísico da mesma: sem vontade nem desejo, a menina apenas existe para servir a mãe, que aspira à glória e reconhecimento, para não mencionar a ascensão social almejada!
Bem ao estilo da relação narcísica, o sujeito asfixia a vontade do objecto, servindo-se dele, apenas e só, com o intuito de retirar proveito próprio. Sob a égide do egoísmo, jamais é concedido espaço ao objecto para se realizar, expressar os seus anseios ou concretizar a sua vontade. “Existes para me servir”, eis a máxima seguida pela personalidade em questão.
Interessante, ainda, é observar quão contrastantes são os discursos que se cruzam na interpretação da película: de um lado, a leitura sociológica e política, que protege mãe e filha, representando-as como vítimas de um capitalismo malfeitor e desumano, e de outro, a psicanálise, que vê no desejo narcísico da mãe o paradigma da opressão.
Édipo chez Visconti
Em Ossessione, Visconti brinda-nos com uma revisitação da situação edipiana, tal como Freud a concebeu (a partir de Sófocles).
Dir-me-á o leitor que a trama do filme foi decalcada de O carteiro toca sempre duas vezes. Indubitavelmente! Ainda assim, não mudo uma vírgula à leitura psicanalítica da citada trama, seja ela proveniente de Ossessione ou d’O carteiro toca sempre duas vezes. Senão, vejamos a coisa pelo prisma da ciência freudiana.
Desde logo, o amor de Gino por Giovanna contém a marca do interdito, posto que a jovem se encontra unida a Bragana, homem substancialmente mais velho. Bragana representa o pai edipiano, poderoso – castrador (por via da autoridade que encerra: o dono, o proprietário, o representante da lei, do interdito) e afectuoso – acolhedor (que recebe Gino em sua casa, oferecendo-lhe protecção, guarida e trabalho).
O pai - Bragana é produto da ambivalência: ama-se e odeia-se, suscitando, em simultâneo, um desejo de proximidade – identificação e um ódio brutal, cujo anseio parricida constitui o exemplo sumo.
A própria entrada em cena de Gino - que vem da estrada, penetrando na casa do casal - comporta uma óbvia alusão à cena primitiva, que mais não é do que o desejo infantil de penetrar e / ou assistir na / à intimidade do casal parental.
A união de Gino a Giovanna – de Édipo a Jocasta, melhor dito - será, neste quadro, a concretização do desejo proibido: a união incestuosa, apenas tornada possível pelo parricídio.
Obviamente, a morte do progenitor não facilita a união proscrita, antes a condenando! A culpabilidade secundário ao(s) crime(s) – o incesto e o parricídio -, na película, determina a sua dissolução: Gino, num rasgo exogâmico, abandona Giovanna, unindo-se à prostituta. Tarde de mais...
O castigo supremo – a morte da mãe-amada, no acidente de automóvel, e o subsequente ajuste de contas com a lei-paterna -, constitui a marca da castração (que na tragédia se materializa no vazamento dos olhos, pelo próprio Édipo).
Segundo consta, a personagem Spagnuolo constitui uma das maiores liberdades de Visconti, dado que, em Ossessione aquele adquire uma centralidade e espessura em tudo estranhas ao original.
Spagnuolo – que no filme representa a orientação homo – oferece-se a Gino como alternativa ao amor interdito.
A conflitualidade dos amores interditos – o incestuoso (sobretudo) e o homo, alternativo – sublinha, pois, a dimensão neurótica da personagem Gino, irremediavelmente agrilhoado a uma tenaz luta entre desejo e defesa contra a realização do mesmo.
quarta-feira, 15 de agosto de 2007
Rossini Opera Festival I - La Gazza Ladra
O Festival de Pesaro (ossia Rossini Opera Festival), relativamente aos demais festivais de Verão, sempre teve um estatuto algo periférico. O Otello (de Rossini, justamente), com o inigualável Flórez, e esta La Gazza Ladra parecem conceder ao dito festival um espaço mais (a)firmado, felizmente!
«Vaya por delante una precisión. La gazza ladra es una de las mejores óperas de Rossini, en su combinación de retrato ambiental, tragedia rural y social, palpitación vital y fuerza rítmica. Musicalmente es arrolladora, con una obertura deslumbrante que aparece en momentos trascendentales del desarrollo. Luego está la inspiración melódica, la faceta constructiva, la alegría de sentir. La soprano granadina Mariola Cantarero encabeza el reparto. Está sensacional, con una sensibilidad a flor de piel, que arrasa con todo. La mitad de la representación canta descalza y con los pies en el agua. No le afecta. Desgrana meticulosamente el personaje de Ninetta, a medio camino entre la pasión y el análisis. Alex Esposito, Michele Pertusi, Manuela Custer la acompañan en un recorrido lleno de musicalidad y entrega. El chino Lü Jia elige acertadamente los tempos, tiene una precisión rítmica impecable y obtiene un sonido ligero y a la vez con cuerpo de la orquesta Haydn de Bolzano y Trento. Una sorpresa, más bien un sorpresón, esta oleada de frescura.»
By the way... alguém conhece a Senhora Cantarero???
Pelléas et Mélisande (et Cluytens!)
Perto do ocaso, a colecção OS CLÁSSICOS DA ÓPERA - 400 ANOS, na semana que passou, propôs-nos este Pelléas et Mélisande, intrinsecamente francófono:
segunda-feira, 13 de agosto de 2007
Os Castelos de Ludwig, para além da (pseudo) excentricidade megalómana
(Ludwig, de Luchino Visconti)
Não há paralelo possível entre Ossessione e Ludwig, ambos de Luchino Visconti.
Ludwig, a par de Morte em Veneza e O Leopardo, corresponde à última fase criativa do cineasta italiano.
Se o primeiro constitui a pedra de toque do neo-realismo italiano, o segundo enquadra-se numa lógica criativa mais pessoal, liberta das regras da escola e / ou movimento artístico, embora centrada numa problemática pessoal.
A passagem de um a outro dos citados filmes (do início ao final da carreira) dá conta de uma mudança de investimento radical: Ludwig decorre de uma centração narcísica – onde Visconti aborda as suas questões mais íntimas, mormente a homossexualidade e a decadência (de pergaminhos e costumes) -, enquanto Ossessione contém a marca da objectalidade, dado focar-se no outro, no objecto, psicanaliticamente falando.
Pouco originais – embora incontornáveis, reconheço – serão os paralelos entre Luchino e Ludwig, a personagem: ambos amantes da arte, gays, aristocratas e megalómanos.
A figura de Ludwig, contudo, contém aspectos peculiares, magistralmente retratados, nomeadamente a evolução psicótica, de tipo eminentemente insidioso.
A insanidade instala-se discretamente, evoluindo para a deterioração, de modo progressivo. A espectacularidade da bizarria é crescente, como crescente é a retirada autista do rei da Baviera.
Provavelmente, Ludwig padecia de uma esquizofrenia paranóide, cuja evolução é crónica.
Pessoalmente, fascinou-me a obsessão da personagem com a edificação quase incessante de castelos.
(O Castelo de Neuschwanstein - Novo Cisne de Pedra)
Habitualmente, o fascínio de Ludwig da Baviera por castelos é enquadrado na sua megalomania, no esplendor e grandiosidade que lhe eram característicos.
Do meu ponto de vista, esta será uma explicação possível, que enferma de superficialidade! De facto, o quadro psicótico tem uma dinâmica própria, ditada pelo corte com o real, pela dissociação e pela ansiedade de fragmentação e / ou de perseguição.
No esquizofrénico – como em Ludwig – há um vivido persecutório crescente, movido pela identificação projectiva: o perseguidor que o sujeito descreve mais não é do que uma parte intolerável de si próprio, que o indivíduo coloca no objecto, criando assim a ilusão de a controlar.
Ora a edificação de castelos, a meu ver, deverá ser explicada pela lógica da ansiedade de perseguição (sendo que o retraimento autista em muito contribui para a elucidação desta obsessão).
(O Palácio de Linderhof)
O castelo-couraça protege o sujeito do perseguidor, ao mesmo tempo que lhe proporciona uma dimensão de clausura-corte com a realidade externa.
Porém, a construção de um castelo poderá, ainda, ser secundária à necessidade de coesão de um self – um aparelho psíquico, uma mente, se quisermos – que ameaça fragmentar-se, a todo o instante. Se assim for, ao invés de uma mera excentricidade, a construção do dito castelo deverá ser interpretada como um movimento no encalço da saúde - uma busca de limites, de fronteiras entre fora e dentro.
(O Palácio de Herrenchiemsee)
Deste modo, posto que o castelo, além de representar o espaço de invulnerabilidade almejada pelo doente, proporciona um corte com o exterior, ao mesmo tempo que oferece uma ilusão de coesão identitária, a tese da megalomania / excentricidade revela a sua manifesta inconsistência.
(Luchino Visconti, Romy Schneider e Helmut Berger)
Ludwig, a par de Morte em Veneza e O Leopardo, corresponde à última fase criativa do cineasta italiano.
Se o primeiro constitui a pedra de toque do neo-realismo italiano, o segundo enquadra-se numa lógica criativa mais pessoal, liberta das regras da escola e / ou movimento artístico, embora centrada numa problemática pessoal.
A passagem de um a outro dos citados filmes (do início ao final da carreira) dá conta de uma mudança de investimento radical: Ludwig decorre de uma centração narcísica – onde Visconti aborda as suas questões mais íntimas, mormente a homossexualidade e a decadência (de pergaminhos e costumes) -, enquanto Ossessione contém a marca da objectalidade, dado focar-se no outro, no objecto, psicanaliticamente falando.
Pouco originais – embora incontornáveis, reconheço – serão os paralelos entre Luchino e Ludwig, a personagem: ambos amantes da arte, gays, aristocratas e megalómanos.
A figura de Ludwig, contudo, contém aspectos peculiares, magistralmente retratados, nomeadamente a evolução psicótica, de tipo eminentemente insidioso.
A insanidade instala-se discretamente, evoluindo para a deterioração, de modo progressivo. A espectacularidade da bizarria é crescente, como crescente é a retirada autista do rei da Baviera.
Provavelmente, Ludwig padecia de uma esquizofrenia paranóide, cuja evolução é crónica.
Pessoalmente, fascinou-me a obsessão da personagem com a edificação quase incessante de castelos.
(O Castelo de Neuschwanstein - Novo Cisne de Pedra)
Habitualmente, o fascínio de Ludwig da Baviera por castelos é enquadrado na sua megalomania, no esplendor e grandiosidade que lhe eram característicos.
Do meu ponto de vista, esta será uma explicação possível, que enferma de superficialidade! De facto, o quadro psicótico tem uma dinâmica própria, ditada pelo corte com o real, pela dissociação e pela ansiedade de fragmentação e / ou de perseguição.
No esquizofrénico – como em Ludwig – há um vivido persecutório crescente, movido pela identificação projectiva: o perseguidor que o sujeito descreve mais não é do que uma parte intolerável de si próprio, que o indivíduo coloca no objecto, criando assim a ilusão de a controlar.
Ora a edificação de castelos, a meu ver, deverá ser explicada pela lógica da ansiedade de perseguição (sendo que o retraimento autista em muito contribui para a elucidação desta obsessão).
(O Palácio de Linderhof)
O castelo-couraça protege o sujeito do perseguidor, ao mesmo tempo que lhe proporciona uma dimensão de clausura-corte com a realidade externa.
Porém, a construção de um castelo poderá, ainda, ser secundária à necessidade de coesão de um self – um aparelho psíquico, uma mente, se quisermos – que ameaça fragmentar-se, a todo o instante. Se assim for, ao invés de uma mera excentricidade, a construção do dito castelo deverá ser interpretada como um movimento no encalço da saúde - uma busca de limites, de fronteiras entre fora e dentro.
(O Palácio de Herrenchiemsee)
Deste modo, posto que o castelo, além de representar o espaço de invulnerabilidade almejada pelo doente, proporciona um corte com o exterior, ao mesmo tempo que oferece uma ilusão de coesão identitária, a tese da megalomania / excentricidade revela a sua manifesta inconsistência.
(Luchino Visconti, Romy Schneider e Helmut Berger)
Salzburgo VI - Cellini so, so & Fantástica Sinfonia
«Salzbourg ne pouvait cette fois rendre plus bel hommage au compositeur français que par ce concert limpide où le Philarmonique de Vienne sous la direction de Riccardo Muti a donné une Symphonie fantastique miraculeuse de transparence. Le chef a fait apparaître, sous les fulgurances et les couleurs novatrices de l'oeuvre, les tourments du créateur. L'élégance de la direction du chef qui est en totale communion avec le Philharmonique de Vienne dont on admire à chaque fois la beauté des cordes mais aussi l'impressionnante clarté des vents. Un magnifique prélude au monodrame lyrique dans lequel Berlioz, qui a écrit le texte, met en scène son amour de l'art. Gérard Depardieu, qui n'a peut-être pas le physique du jeune compositeur, compense en grand acteur ce défaut par la qualité d'émotion qu'il procure. Le baryton Ludovic Tézier et le ténor Michael Schade sont également parfaits, accompagnés une fois de plus par cette merveilleuse phalange viennoise. « Votre exécution est remarquable par la précision, l'ensemble, la chaleur ; vous avez même reproduit plusieurs nuances fort délicates », dit Lélio en s'adressant à l'orchestre. Il n'y a rien à ajouter»
Tudo leva a crer que a estreia de Benvenuto Cellini, em Salzburgo, não permanecerá na história, por muito tempo. Em compensação, Muti dirigiu uma magnífica interpretação da Sinfonia Fantástica, do mesmo Berlioz.
Obviamente, o tom altaneiro do Le Monde não surpreende, quando se trata de cascar, sobretudo na mise-en-scène de Benvenuto Cellini:
«Les décors sont conçus comme ceux des superproductions de Broadway ou d'Hollywood, mais sans leur charme. Les clins d'oeil à Walt Disney (Blanche-Neige sur le toit des Aristochats, en quelque sorte), au Magicien d'Oz, à Batman, à Metropolis amusent le public. Mais les vidéos, les effets spéciaux, les gags et les costumes bigarrés sont une distraction permanente pour l'oreille, qui ne peut raisonnablement goûter les saveurs de la partition de Berlioz, laquelle semble constamment moquée. Moulin Rouge, le film de Baz Luhrmann, passerait presque pour du Bergman comparé à cette écoeurante esthétique.»
Edimburgo II - O Orfeo de Savall
Pessoalmente, o Orfeo, de Monteverdi, pouco mais tem de interessante, para além da importância histórica: explicitamente, corresponde à génese da linguagem operística, que alia dramatização, declamação e canto.
Para mim, não há ópera sem excesso (romântico), disciplina (barroca), lirismo (clássico) e temáticas mais ou menos sórdidas (particularmente as do século XX, incluindo os temas do Verismo).
Em todo o caso, segundo reza esta notícia do El Pais, há muito que o Festival de Edimburgo aguardava pela estreia do Orfeo, de Monteverdi!
«(...) un encuentro celebrado con un viaje a los orígenes de la historia de la ópera con L'Orfeo, de Claudio Monteverdi, de la que este año de celebra el 400º aniversario de su estreno, en una producción escénica del Liceo de Barcelona que fue recibida con una intensa ovación por el público que llenó el teatro del Festival de Edimburgo.»
domingo, 12 de agosto de 2007
Festival Internacional de Edimburgo’07 I – 60 anos de vida
Entre 10 de Agosto e 2 de Setembro, em Edimburgo, decorre um célebre e popular festival de artes – dança, música, teatro, ópera, performances, etc. -, que celebra actualmente os 60 anos de existência.
«El de Edimburgo no es sólo un festival de música clásica y ópera, teatro y danza. Es un festival de festivales -también de libros, cine, televisión y jazz y blues- que convergen en tiempo y lugar para convertir a la capital de Escocia durante tres semanas de agosto en un irresistible hervidero cultural donde lo oficial convive con lo alternativo, lo serio con la sátira y lo exclusivo con lo popular.Imposible dar abasto a tan ingente oferta, que sólo para el popular Fringe -el festival alternativo también nacido en 1947, del que las compañías ofrecen numerosos y vistosos aperitivos de sus espectáculos en plena calle para regocijo de transeúntes locales y foráneos, que estos días son muchos- supera los más de 2.000 espectáculos.»
A estreia da edição de 2007 teve lugar com a peça lírica de Bernstein, Candide.
«El mérito hay que atribuírselo con toda justicia al veterano barítono británico Thomas Allen, quien, en el doble papel de narrador y Pangloss, construyó un jugoso guión, por el mismo interpretado con maestría, con el libreto de Lillian Hellman como base e irónicas referencias a Bush, los Simpson, la política y la intolerancia religiosa que arrancaron las carcajadas del público. Junto a Thomas Allen y dando espontánea y convincente vida escénica a los personajes, pese a la versión concierto, estuvo brillante Matthew Polenzani como Candide; lírica y vivaz Laura Aikin en su personaje de Cunegunde; ácida y enérgica Kathryn Harris con su Vieja Dama, y acertados los personajes secundarios protagonizados por Keith Lewis, Jennifer Johnston, Tim Mirfin y Roland Wood, y el quinteto de aventajados alumnos de la Real Academia Escocesa de Música y Teatro. Spano, al frente de la Orquesta Sinfónica Escocesa de la BBC y el Coro del Festival de Edimburgo demostró no sólo ser un gran concertador sino un espléndido director de orquesta que ama con pasión la música del genial Leonard Bernstein.»
Moral da história: nem só de Salzburgo e / ou Bayreuth vivem as festividades líricas estivais!
sábado, 11 de agosto de 2007
Salzburgo V - Stabat Stars ossis As (Es)Trelas de Salzburgo
Nem mais, nem menos!
Palavras não eram ditas, eis que o repórter do Le Monde põe o dedo na ferida: as estrelas do firmamento salzburguês (particularmente, como destaca a notícia, as da major DG!) pretendem prender a direcção do festival – e o público, sublinhe-se! – pela trela, anulando os respectivos compromissos sob pretextos mais afins com o narcisismo e o capricho do que com a verdadeira incapacidade médica e / ou psicológica!
«Cela ne serait qu'une péripétie si les annulations n'avaient pas fait boule de neige cet été à Salzbourg : la mezzo Vesselina Kasarova s'est blessé le pied ; la soprano française Patricia Petibon vient d'accoucher ; Rolando Villazon (lui aussi chez DG) est malade depuis quelques semaines ; le ténor américain Neil Shicoff a annulé trois jours avant le début des répétitions de Benvenuto Cellini, de Berlioz car il était "déprimé et choqué" qu'on lui ait préféré le Français Dominique Meyer à la direction de l'Opéra de Vienne ; Mikhail Pletnev (lui aussi chez DG) ne jouera pas le 30, car il vient de décider de ne plus jouer de piano en public...
Gérard Depardieu (qui n'est pas chez DG), récitant dans Lélio, de Berlioz, les 12, 14 et 15 août, n'a pas encore annulé, mais il refuse que la télévision autrichienne le filme... Salzbourg est un festival de stars. M. Flimm ne se dit pas impressionné par elles. Devra-t-il désormais se résoudre à faire la guerre aux étoiles, à celles de DG particulièrement, une marque dont on disait naguère qu'elle tenait en laisse le Festival ?»
As ditas estrela haviam de ter um Von Karajan à frente... Ele dava-lhes o arroz - ou a estrelite!
Só entre nós, caro leitor, se não é piroso e desajustado pretender assistir a um Stabat Mater (de Pergolesi, no caso), interpretado por Anna Netrebko, é pelo menos bem merecido levar uma tampa na cara ;-)
Salzburgo IV - Domingo vs Las Estrellas
Ou muito me engano ou Domingo permanecerá na história da lírica da segunda metade do século XX, pelo carisma, sentido artístico, talento e - é bom sublinhar - pela longevidade.
Ora mais megalómano, ora maniforme, ora humilde até ao âmago.
Os grandes homens (também) são assim, como os demais: terrenos.
Quanto aos divos & divas, que anulam compromissos por dá cá aquela palha, não me pronuncio. A história deles não falará, seguramente.
sexta-feira, 10 de agosto de 2007
Salzburgo III - Eugénio Baremboim
Devo confessar - com respeito e... sobranceria - que o elenco deste Eugen Onegin não me fascinou.
Em Fevereiro deste mesmo ano, no Met, assistira a uma récita desta ópera, com um elenco absolutamente extraordinário: Fleming, Hvorostovsky e Vargas. Deslumbrante!
Dir-me-ão - não sem razão - que nada escrevi sobre o assunto... Assim foi. Não me apeteceu partilhar aquele prazer com mais ninguém, além da minha mulher.
Ainda assim, a récita a que assisti pecava pela mise-en-scène, de um minimalismo algo excessivo e despropositado. Nada que tenha que ver com a encenação deste Eugen Onegin, de Salzburgo, como segue:
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Bem vista a coisa, parece que, além da louvável encenação, a estrela da noite foi Danny Baremboim. Seja!
quinta-feira, 9 de agosto de 2007
quarta-feira, 8 de agosto de 2007
(mais) Surtos Maníacos...
... que redundam em compras, cuja lista segue em anexo!
Depois do luto, mania com ele ;-)
É sempre assim!
É sempre assim!