Em Rocco e os seus irmãos, na senda da verosimil e crua realidade, uma vez mais, Visconti retrata a inexorabilidade do destino: "desafortunado nasceste, desafortunado morrerás".
Se é verdade que a escola que Luchino Visconti fundara – o neo-realismo, justamente – eleva os enteados da fortuna à categoria de heróis, não menos verdade é a circunstância de a dita escola apregoar a Castração (no sentido freudiano), que se oculta sob a capa da imutabilidade: "os desfavorecidos jamais vingarão!"
À semelhança do que aqui se explicitou, é interessante verificar que, chez Visconti, os discursos político-sociológicos (e artísticos ou culturais) se opõem radicalmente à verdade da psicanálise, posto que a denúncia da injustiça e desigualdade apenas sublinha a incapacidade da vítima para inverter o infortúnio.
Em todo o caso, ainda que esta seja uma das linhas que mais se evidencia na película, do meu ponto de vista, deve ser dado particular relevo a duas personagens, porventura as mais destacadas da trama: Rocco e Simone, cara ou coroa (como se preferir).
Ambos se unem, na medida em que um é o negativo do outro: Rocco, hiper-adaptado, submisso e conforme, oculta as suas verdadeiras necessidades e aspirações, agrilhoando incondicionalmente a espontaneidade. Masoquista até ao limite do concebível, Rocco encarna o bom filho, amante abnegado e resignado, disposto a converter putas e marginais; Simone, impulsivo, estranho à lei e ordem, desviado, é o paradigma do desadaptado.
Psicopatologicamente, Rocco é o exemplo sumo do falso-self, enquanto Simone representa a patologia border-line, na sua expressão mais esplendorosa – vítima da ansiedade de perda, que nega a todo o custo, adicto, procura subjugar a realidade ao prazer, agindo por impulso, sempre em ruptura com a ordem.
Bem vistas as coisas, em jeito de balanço, diria que, embora os funcionamentos de Rocco e Simone sejam antagónicos, na expressão, do ponto de vista da problemática, estamos num território semelhante!
É sempre com gosto e interesse redobrados que volto aqui :)
ResponderEliminarViva Helena!
ResponderEliminarGostou das tiradas psicanalíticas? Visconti anda a ser visionado por mim, sob um novo prisma: o da psicanálise! E tem tanto qe se lhe diga...
Volte sempre ;-)