Ópera, ópera, ópera, ópera, cinema, música, delírios psicanalíticos, crítica, literatura, revistas de imprensa, Paris, New-York, Florença, sapatos, GIORGIO ARMANI, possidonices...
terça-feira, 29 de novembro de 2005
segunda-feira, 28 de novembro de 2005
Kózena e Daniels, ontem na Gulbenkian - crónica solta...
Ela foi insidiosa... Entrou de mansinho, a voz foi-se abrindo, aos poucos, qual flor graciosa. Por fim, dela, brotava uma luminosidade incandescente, estonteante! De um lirismo inconcebível...
Ele entrou algo parco e contido, prudente até à exaustão. O volte-face veio na segunda parte. Triunfou na bravura; arrebatou pelo folgo desmesurado. Transcendeu-se...
Aos poucos, isolados, materializaram momentos de milagre.
Por fim, nos encores, excederam-se na expressão, na disciplina e na técnica.
Terminaram onde haviam de ter começado!
Longe de um concerto de antologia, ambos foram brilhando...
Ele entrou algo parco e contido, prudente até à exaustão. O volte-face veio na segunda parte. Triunfou na bravura; arrebatou pelo folgo desmesurado. Transcendeu-se...
Aos poucos, isolados, materializaram momentos de milagre.
Por fim, nos encores, excederam-se na expressão, na disciplina e na técnica.
Terminaram onde haviam de ter começado!
Longe de um concerto de antologia, ambos foram brilhando...
domingo, 27 de novembro de 2005
Bilhete Disponível: hoje, às 19h na Gulbenkian
Tenho 1 bilhete a mais (segunda-plateia, fila 2, lugar 23, a preço de bilheteira, como é óbvio...), para o concerto de hoje, às 19,00, na Gulbenkian, com os soberbos David Daniels e Magdalena Kózena, num programa barroco, absolutamente imperdível!!!
Advirto que a lotação está esgotada.
Mais detalhes, aqui.
Se está interessado(a), por favor, contacte-me para il.dissoluto.punito@gmail.com, até às 18,00h de hoje.
Advirto que a lotação está esgotada.
Mais detalhes, aqui.
Se está interessado(a), por favor, contacte-me para il.dissoluto.punito@gmail.com, até às 18,00h de hoje.
sábado, 26 de novembro de 2005
Vinheta clínica: a personalidade obsessiva, na lírica
(Dessay & Vargas: Roméo et Juliette, Met, 21 de Novembro de 2005 - in Le Monde)
O perfeccionismo, rigor e disciplina da Grande Senhora DESSAY - a quem fiz referência aqui, nomeadamente - ilustram facetas das personalidades obsessivas, no sentido mais clínico do termo.
Parabéns Ritinha!
És a mais novinha das minhas sobrinhas e hoje comemoras o primeiro ano de vida!
Que contes muitos, minha querida!!!
Votos de felicidade dos tios babosos,
Margarida e João
Que contes muitos, minha querida!!!
Votos de felicidade dos tios babosos,
Margarida e João
quarta-feira, 23 de novembro de 2005
Morte, sem retorno... James KING (22.05.1925 - 22.11.2005)
Apagou-se o mais baritonal dos tenores: James King.
A lírica perde o último grande Bacchus...
King, que brilhou no repertório alemão romântico, foi um Parsifal lendário, um Lohengrin de referência... Potente, pujante e ousado...
So long...
(ORFEO C 557 051 B)
A lírica perde o último grande Bacchus...
King, que brilhou no repertório alemão romântico, foi um Parsifal lendário, um Lohengrin de referência... Potente, pujante e ousado...
So long...
(ORFEO C 557 051 B)
Dão-se alvíssaras
... a quem encontrar, em português, francês ou castelhano, traduções dos seguintes libretos: Daphne (Richard Strauss) e Vec Makropulos - O Caso Makropulos (Janácek).
Este pobre blogger anseia doidamente por poder acompanhar as citadas óperas, em traduções acessíveis...
Este pobre blogger anseia doidamente por poder acompanhar as citadas óperas, em traduções acessíveis...
Maravilhas Straussianas, para breve!
Disse-me um passarinho que, muito em breve, teremos uma magnífica colheita straussiana!
Num registo puramente lírico, o fundo de catálogo da DG proporciona-nos uma rara Arabella, com a maior intérprete do papel titular de todos os tempos: Lisa Della Casa.
Pelo que consta, este registo deverá complementar a mais homogénea das Arabella´s, em disco, dirigida por Solti (DECCA 460 230-2).
Já a TDK propõe-nos a última produção de Capriccio montada na Opéra National de Paris... com Fleming, no papel de Condessa. Não são necessárias mais considerações!!!
Nos antípodas destes registos, a referida DG reabilita o paradigma do Strauss dramático: a brutal Elektra dirigida por Böhm, em dvd, com a mítica Rysanek, no papel titular.
Recordo que esta interpretação constitui a primeira e única encarnação deste papel pela extraordinária soprano austríaca, que se notabilizou - entre outras razões - por ter interpretado, ao longo da sua imensamente longa carreira, os papeis de Chrysothemis e Klytamnestria !!! Soberba demonstração da toute-puissance...
Num registo puramente lírico, o fundo de catálogo da DG proporciona-nos uma rara Arabella, com a maior intérprete do papel titular de todos os tempos: Lisa Della Casa.
Pelo que consta, este registo deverá complementar a mais homogénea das Arabella´s, em disco, dirigida por Solti (DECCA 460 230-2).
Já a TDK propõe-nos a última produção de Capriccio montada na Opéra National de Paris... com Fleming, no papel de Condessa. Não são necessárias mais considerações!!!
Nos antípodas destes registos, a referida DG reabilita o paradigma do Strauss dramático: a brutal Elektra dirigida por Böhm, em dvd, com a mítica Rysanek, no papel titular.
Recordo que esta interpretação constitui a primeira e única encarnação deste papel pela extraordinária soprano austríaca, que se notabilizou - entre outras razões - por ter interpretado, ao longo da sua imensamente longa carreira, os papeis de Chrysothemis e Klytamnestria !!! Soberba demonstração da toute-puissance...
sábado, 19 de novembro de 2005
sexta-feira, 18 de novembro de 2005
Tão bom quanto mau...
(RCA VICTOR OPERA SERIES 60172-2-RG)
Esta interpretação, que data dos anos 1950 - idade de ouro do canto lírico e... do Met, que então produzia cantores de craveira, a uma velocidade incrível -, conta com um dos mais famosos elencos, à época: Robert Merrill, no papel titular, Roberta Peters, como Gilda (sua filha), e... o tenoríssimo escandinavo Jussi Bjoerling, na pele de Duque de Mântua.
Um Cast à la Met, ainda que a gravação tenha sido realizada em Roma.
Já agora, coincidência espantosa, adquiri esta leitura, justamente, no Lincoln Center, no edifício da Julliard School, a dez metros da Metropolitan Opera House!
Em meu entender, este registo de Rigoletto é um dos mais paradoxais, merecendo ser discutido, exactamente, por essa circunstância: o grande mérito desta leitura provém dos solistas, sendo os mesmos responsáveis, em ampla escala, pelos deméritos da mesma interpretação!
Vamos a detalhes.
Roberta Peters - Olympia de sonho e Rosina destacada - compõe, provavelmente, a melhor Gilda cantada da discografia. De voz pequenina, muito redonda, embora não particularmente extensa, a soprano americana canta uma espantosamente disciplinada Gilda, vocalmente estonteante.
Soprano ligeiro, por excelência, a intérprete falha, por isso mesmo! Hélas, mostra-se absolutamente opaca na caracterização da abnegada e masoquista Gilda.
Bjoerling, sem surpresa, forma uma bela parelha com Peters, para o bem e para o mal: estilista invejável, brilha pelo timbre luminoso e pela disciplina inabalável.
A personagem que compõe, por mero acaso, é o Duque de Mântua, figura vil, egoísta e desprezível! Pena é que ninguém reconhece estas facetas à dita personagem, partindo da interpretação do sueco...
Sem a mínima modulação emocional, teatralmente ausente, Jussi Bjoerling espalha-se ao comprido!
Devo confessar que não me surpreendeu...
Dos três principais solistas, Merrill tem o mérito de mais se destacar, em termos dramáticos, sobretudo. Ainda assim, compõe um bobo assaz hesitante: mais convincente do que os citados colegas, Robert Merrill frustra por, sistematicamente, bordejar as diferentes tonalidades emocionais da figura que constrói, não passando daí... ; compreendendo-as - é certo -, falha na expressão convincente e declarada das mesmas.
Que pena...
A direcção de Perlea mostra-se correcta, mas sem brilho, nem alma, além de apressada e fugidia.
Em síntese, diria tratar-se de um interpretação que prima pela correcção técnica - invejável e plena de estilo -, frustrando, amplamente, na expressão - sem pathos, estranha a qualquer progressão dramática, teatralmente inconsistente... -, estando, a este nível, bem aquém da mediocridade.
Numa obra marcada pela tragédia (tradicionalíssima, tipicamente romântica, na sua abordagem), que se vislumbra desde o soar dos primeiros acordes, a descrita lacuna dramática é indesculpável, comprometendo e corroendo qualquer leitura séria e coerente.
Esta interpretação, que data dos anos 1950 - idade de ouro do canto lírico e... do Met, que então produzia cantores de craveira, a uma velocidade incrível -, conta com um dos mais famosos elencos, à época: Robert Merrill, no papel titular, Roberta Peters, como Gilda (sua filha), e... o tenoríssimo escandinavo Jussi Bjoerling, na pele de Duque de Mântua.
Um Cast à la Met, ainda que a gravação tenha sido realizada em Roma.
Já agora, coincidência espantosa, adquiri esta leitura, justamente, no Lincoln Center, no edifício da Julliard School, a dez metros da Metropolitan Opera House!
Em meu entender, este registo de Rigoletto é um dos mais paradoxais, merecendo ser discutido, exactamente, por essa circunstância: o grande mérito desta leitura provém dos solistas, sendo os mesmos responsáveis, em ampla escala, pelos deméritos da mesma interpretação!
Vamos a detalhes.
Roberta Peters - Olympia de sonho e Rosina destacada - compõe, provavelmente, a melhor Gilda cantada da discografia. De voz pequenina, muito redonda, embora não particularmente extensa, a soprano americana canta uma espantosamente disciplinada Gilda, vocalmente estonteante.
Soprano ligeiro, por excelência, a intérprete falha, por isso mesmo! Hélas, mostra-se absolutamente opaca na caracterização da abnegada e masoquista Gilda.
Bjoerling, sem surpresa, forma uma bela parelha com Peters, para o bem e para o mal: estilista invejável, brilha pelo timbre luminoso e pela disciplina inabalável.
A personagem que compõe, por mero acaso, é o Duque de Mântua, figura vil, egoísta e desprezível! Pena é que ninguém reconhece estas facetas à dita personagem, partindo da interpretação do sueco...
Sem a mínima modulação emocional, teatralmente ausente, Jussi Bjoerling espalha-se ao comprido!
Devo confessar que não me surpreendeu...
Dos três principais solistas, Merrill tem o mérito de mais se destacar, em termos dramáticos, sobretudo. Ainda assim, compõe um bobo assaz hesitante: mais convincente do que os citados colegas, Robert Merrill frustra por, sistematicamente, bordejar as diferentes tonalidades emocionais da figura que constrói, não passando daí... ; compreendendo-as - é certo -, falha na expressão convincente e declarada das mesmas.
Que pena...
A direcção de Perlea mostra-se correcta, mas sem brilho, nem alma, além de apressada e fugidia.
Em síntese, diria tratar-se de um interpretação que prima pela correcção técnica - invejável e plena de estilo -, frustrando, amplamente, na expressão - sem pathos, estranha a qualquer progressão dramática, teatralmente inconsistente... -, estando, a este nível, bem aquém da mediocridade.
Numa obra marcada pela tragédia (tradicionalíssima, tipicamente romântica, na sua abordagem), que se vislumbra desde o soar dos primeiros acordes, a descrita lacuna dramática é indesculpável, comprometendo e corroendo qualquer leitura séria e coerente.
quarta-feira, 16 de novembro de 2005
Le Petit Prince en opéra?!
Le Petit Prince, d´Antoine de Saint-Exupéry, à l´affiche à New York?!
(d´autres renseignements sur le site officiel)
segunda-feira, 14 de novembro de 2005
Don Carlos: prelúdio...
(dvd NVC ARTS 0630-16318-2)
Regresso a Verdi, via Don Carlos (na versão original, em francês)...
Devo começar pelo princípio...
Esta interpretação constitui um marco histórico, absolutamente imperdível, em matéria de interpretação verdiana!
Esplendorosa, expressiva, mas contida; de uma coerência cénica espantosa...
Há muito, mesmo muito a dizer sobre esta (já) lendária interpretação, que tem a marca do inigualável Luc Bondy...
Volverei a esta obra-prima, de bom grado - prometo ! -, em post e post infinitos...
sábado, 12 de novembro de 2005
Brava, brava, brava!!!
Bravissima!
Voz lírica, elegantíssima, dotada de uma souplesse ímpar...
(mais detalhes, aqui)
Voz lírica, elegantíssima, dotada de uma souplesse ímpar...
(mais detalhes, aqui)
quinta-feira, 10 de novembro de 2005
Parabéns, Bryn (n. 09/11/1965)!
A ti, meu muito querido,
lenda viva do canto lírico, da ópera e do musical,
senhor de uma singular versatilidade cénica e vocal,
mestre na comédia e no drama,
pela tua colossal musicalidade,
pelo teu infinito talento,
pelo teu sincero afecto,
PARABÉNS!
Felizes 40!!
Pelas portas da tua soberana voz e do teu magnânime sentido interpretativo, entrei no mundo da lírica!
Espero que nos encontremos muitas mais vezes,
Um abraço afectuoso, tão imenso quanto a tua envergadura,
João
***
Discografia obrigatória e incontornável do baixo-barítono galês:
- recital
- ópera
- dvd
***
Discografia obrigatória e incontornável do baixo-barítono galês:
- recital
- ópera
- dvd
***
quarta-feira, 9 de novembro de 2005
Luxúria, sexo de segunda e marketing...muito marketing!
Eis, numa fórmula condensada - necessariamente redutora - a síntese da minha opinião sobre a audição, à vol d´oiseau, da mais recente La Traviata, proposta pela DG.
O Festival de Salzburgo de 2005 contou com uma nova produção de La Traviata, dirigida por Rizzi, com um elenco super-star - Netrebko, Villazón e Hampson.
Segundo rezam as crónicas, o sucesso foi tal que, num rasgo do mais puro altruísmo, a yellow label empreendeu esforços hercúleos, com vista a proporcionar aos fieis compradores uma amostra da dita produção.
Tretas e mais tretas! A DECCA, em 1995, a propósito de uma nova produção da opera homónima, em Covent Garden (esteticamente deslumbrante, reconheça-se!), com Gheorghiu - então belíssima... -, recorreu ao mesmo argumento, absolutamente falacioso e infundado, a meu ver.
É certo que, na respeitável opinião de Ivan A. Alexandre (cf. crónica in DIAPASON - Nº 529, Outubro de 2005) -, a récita foi arrebatadora, sobretudo pela qualidade da produção e pela prestação da dupla Netrebko / Villazón.
Para o bem e para o mal, o conhecimento que tenho da citada produção deu-se via CD, via obviamente lacónica e implacável (sobretudo quando se trata de uma gravação live, como é o caso desta La Traviata), reconheço...
É esta a vil e prosaica condição de um melómano remediado...
Encurtando as considerações preliminares - que já o verbo vai longo -, dediquei parte da tarde a escutar os high-lights da prometida La Traviata da saison...
O que dizer dos (muitos) fragmentos escutados?
Anna Netrebko, jovem soprano russa, de invulgar beleza (que transpira fogosidade e lascívia...), encarna uma Violetta desabitada, fria, insensível, teatralmente mal assimilada, sem o mais pequeno resquício de coloração emocional, voilà!
Senhora de uma técnica frágil e inconsistente, apesar de ousada no ataque das notas agudas do acto I - que aborda com heroicidade, arrojo e despudor -, Netrebko estampa-se no último acto, multiplicando-se as notas ratées. Além do mais, os graves são frágeis, a dicção é deficiente - consoantes inaudíveis, pronúncia desadequada, bordejando a incompreensão -, a respiração é ofegante, mal apoiada e em notório esforço... enfim, lamentável!
Nos antípodas da construção de Anna Netrebko, Villazón compõe um Alfredo notoriamente mais sólido, ainda que convencional, na abordagem psicológica. O timbre radiosos socorre-se de uma emissão quente e cativante, mas desmesuradamente latina e um pouco exagerada, na minha opinião.
Para infelicidade nossa, o Giorgio Germont que Thomas Hampson nos oferece foi talhado à medida da prestação de Netrebko: fugaz, translúcido, superficial, a custo exibe a sua bela voz de barítono. Todos sabemos que Hampson peca pela fragilidade das prestações cénicas (que contrastam com os magníficos dotes vocais do intérprete), mas há limites inultrapassáveis!!!
Não querendo ser radical na minha apreciação, desaconselho, sem pudor algum, esta interpretação, que me parece pecar pela falta de seriedade e profissionalismo, socorrendo-se vergonhosamente do marketing para ser difundida.
Salzburgo - que aguarda melhores dias, desde há alguns anos, diga-se em abono da verdade - conta com um extenso catálogo de gravações históricas, de inegável qualidade, que jamais viram a luz do dia! Porque razão decidiu a DG comercializar esta materialização do embuste?
segunda-feira, 7 de novembro de 2005
OTELLO, TNSC - impressões
Otello, de G. Verdi. - Teatro Nacional de São Carlos, récita de 6 de Novembro de 2005.
Parti para este Otello com expectativas mil, parcialmente baseadas na opinião de colegas e amigos da blogosfera.
Um dos pontos mais consensuais, relativamente ao Otello actualmente em cena, no TNSC, diz respeito, justamente, à mediocridade da encenação.
Em meu entender, uma encenação é uma tarefa de enorme complexidade artística, que transcende os aspectos puramente musicais e dramáticos de uma peça. Trata-se de revitalizar, interpretando - no mais pleno dos sentidos -, uma obra.
Importa, parece-me, que uma encenação tenha subjacente uma lógico, susceptível de ser apreendida pelo espectador.
Ora, a encenação deste Otello, na minha óptica, assentou numa lógica óbvia de confronto de opostos, de pares antitéticos, identificando, cada um deles, com uma tonalidade.
Em duas palavras, ao longo da progressão dramática, deparamos com uma oposição claro vs escuro - visível nas cores do guarda-roupa, bem como na tonalidade dos cenários -, sendo que, o mor das vezes, o claro reenvia ao puro e virtuoso - azul aberto do traje de Desdémona, azul celeste do cenário do final do acto I (Dueto Già nella notte densa) -, enquanto o escuro remete para a malignidade, urdidura e obscurantismo - Iago, invariavelmente, exibe um traje cinza; nas cenas em que a intriga, a malícia e a urdidura se explanam, o cenário de fundo exibe um cinza dégradé, pontuado por tons de ferrugem, numa explícita alusão à deterioração moral e perversidade.
Conceptualmente, este estilo de encenação parece ter feito escola, estando em desuso, há muito!
Algo caduca, está opção, diria eu... tanto mais que a estética que lhe deu suporte, maioritariamente, era de duvidoso gosto: mobiliário feio, cenários pobres - particularmente na cena final, do acto IV - (à excepção do cinza-ferrugem, que muito apreciei, pelo simbolismo que continha), luzes demasiadamente estáticas...
Ainda assim, esta encenação, de forma consistente e fundamentada, tem o mérito de propor uma leitura que coloca a tónica no confronto entre bem e mal, limpo e peçonhento, virtuoso e pervertido.
Demasiado apoiada em dicotomias e clichés, ainda assim, a coisa funcionou, atrevo-me a considerar.
Centrando-me no plano vocal e dramático, a meu ver, diria que os intérpretes da récita transpiraram labor e empenho!
Vocalmente, o nível dos três principais solistas pareceu-me bastante homogéneo, o mesmo não se verificando no tocante às dimensões interpretativa e dramática.
Guelfi compôs um Iago muito sólido, algo estático e contido na mímica, mas muito convincente, particularmente na faceta corrosiva e intriguista. A malícia expressou-se vocalmente de forma eloquente, sobretudo no Credo, ponto alto do barítono, nesta récita.
Malagnini - que debutou no papel titular, precisamente nesta (re)produção - arriscou, tremeu, mas salvou-se!
Interpretar este papel é tarefa árdua e espinhosa, desde logo pela tessitura exigida: nem muito aguda, nem muito média, à mi-chemin entre o tenor e o barítono, mais para os lados do tenor-spinto, voilà.
Ora, facto interessante, os grandes intérpretes de Otello - particularmente Vinay e Domingo - haviam iniciado as respectivas carreiras como barítonos, optando mais tarde pela tessitura aguda, de tenor (Bergonzi, tenor verdianíssimo, que teve um percurso vocal similar, infelizmente, nunca abordou o papel titular de Otello...)!
Mario Malagnini convenceu-me vocalmente: não falhou a mais ínfima nota, contornando com habilidade e mestria todas as dificuldades que a partitura coloca ( e não são poucas!); pecou pela excessiva clareza e abertura do timbre (desadequados, quando de Otello se trata), apesar da bravura indesmentível!
Quanto a futuras interpretações deste papel, ou cultiva e aprofunda a dimensão dramática - mediocre, de mímica rígida e paupérrima -, ou limita as suas aparições a versões de concerto.
O talento da La Theodossiou é já assunto corrente nas récitas do São Carlos.
Soprano verdiano de primeira linha, Dimitra encarnou a mais lírica das heroínas que Verdi compôs. Pessoalmente, prefiro-a no primo Verdi - Odabella, Lina, Giselda...
A Desdemona da interprete grega revelou-se primorosa em termos interpretativos, muito rica e expressiva, sem nunca ter embarcado em exageros histriónicos; Theodossiou mostrou-se ainda, notável na gestão dos pianissimi - ela que conta com uma técnica falível - e, por vezes, algo excessiva no emprego do vibrato, que conferia demasiado peso e carácter à personagem.
Do naipe dos solistas, destacaria ainda a prestação de Carlos Guilherme, que muito me surpreendeu! Apesar de um pouco arrebatado e exagerado na expressão (particularmente na voz, à la Di Stefano), compôs um Roderigo assaz juvenil e bem timbrado! Com a idade com que conta e os empregos dados à voz, é obra!
Last but not least, uma palavra especialíssima para a magnífica direcção de Pirolli, que dirigiu com perícia, astúcia e muito talento uma OSP, pour une fois, coesa, responsiva, afinada e pujante (coisa rara...).
Dada a elevada qualidade das récitas verdianas no TNSC, nos últimos anos, - Falstaff (2000), Il Trovatore (2001), La Traviata (2002), Stiffelio (2003), Simon Boccanegra (2004) e Otello (2005) - começo a vergar-me diante das sábias opções da direcção de Pinamonte, esteja ele onde estiver...
Para a posteridade, deixo a recomendação de três Otello´s de antologia:
(Toscanini, 1947 - RCA GD 60302)
(Serafin, 1960 ? RCA 09026 63180 2)
(Kleiber, 1976 ? Music & Arts CD-1043)
Parti para este Otello com expectativas mil, parcialmente baseadas na opinião de colegas e amigos da blogosfera.
Um dos pontos mais consensuais, relativamente ao Otello actualmente em cena, no TNSC, diz respeito, justamente, à mediocridade da encenação.
Em meu entender, uma encenação é uma tarefa de enorme complexidade artística, que transcende os aspectos puramente musicais e dramáticos de uma peça. Trata-se de revitalizar, interpretando - no mais pleno dos sentidos -, uma obra.
Importa, parece-me, que uma encenação tenha subjacente uma lógico, susceptível de ser apreendida pelo espectador.
Ora, a encenação deste Otello, na minha óptica, assentou numa lógica óbvia de confronto de opostos, de pares antitéticos, identificando, cada um deles, com uma tonalidade.
Em duas palavras, ao longo da progressão dramática, deparamos com uma oposição claro vs escuro - visível nas cores do guarda-roupa, bem como na tonalidade dos cenários -, sendo que, o mor das vezes, o claro reenvia ao puro e virtuoso - azul aberto do traje de Desdémona, azul celeste do cenário do final do acto I (Dueto Già nella notte densa) -, enquanto o escuro remete para a malignidade, urdidura e obscurantismo - Iago, invariavelmente, exibe um traje cinza; nas cenas em que a intriga, a malícia e a urdidura se explanam, o cenário de fundo exibe um cinza dégradé, pontuado por tons de ferrugem, numa explícita alusão à deterioração moral e perversidade.
Conceptualmente, este estilo de encenação parece ter feito escola, estando em desuso, há muito!
Algo caduca, está opção, diria eu... tanto mais que a estética que lhe deu suporte, maioritariamente, era de duvidoso gosto: mobiliário feio, cenários pobres - particularmente na cena final, do acto IV - (à excepção do cinza-ferrugem, que muito apreciei, pelo simbolismo que continha), luzes demasiadamente estáticas...
Ainda assim, esta encenação, de forma consistente e fundamentada, tem o mérito de propor uma leitura que coloca a tónica no confronto entre bem e mal, limpo e peçonhento, virtuoso e pervertido.
Demasiado apoiada em dicotomias e clichés, ainda assim, a coisa funcionou, atrevo-me a considerar.
Centrando-me no plano vocal e dramático, a meu ver, diria que os intérpretes da récita transpiraram labor e empenho!
Vocalmente, o nível dos três principais solistas pareceu-me bastante homogéneo, o mesmo não se verificando no tocante às dimensões interpretativa e dramática.
Guelfi compôs um Iago muito sólido, algo estático e contido na mímica, mas muito convincente, particularmente na faceta corrosiva e intriguista. A malícia expressou-se vocalmente de forma eloquente, sobretudo no Credo, ponto alto do barítono, nesta récita.
Malagnini - que debutou no papel titular, precisamente nesta (re)produção - arriscou, tremeu, mas salvou-se!
Interpretar este papel é tarefa árdua e espinhosa, desde logo pela tessitura exigida: nem muito aguda, nem muito média, à mi-chemin entre o tenor e o barítono, mais para os lados do tenor-spinto, voilà.
Ora, facto interessante, os grandes intérpretes de Otello - particularmente Vinay e Domingo - haviam iniciado as respectivas carreiras como barítonos, optando mais tarde pela tessitura aguda, de tenor (Bergonzi, tenor verdianíssimo, que teve um percurso vocal similar, infelizmente, nunca abordou o papel titular de Otello...)!
Mario Malagnini convenceu-me vocalmente: não falhou a mais ínfima nota, contornando com habilidade e mestria todas as dificuldades que a partitura coloca ( e não são poucas!); pecou pela excessiva clareza e abertura do timbre (desadequados, quando de Otello se trata), apesar da bravura indesmentível!
Quanto a futuras interpretações deste papel, ou cultiva e aprofunda a dimensão dramática - mediocre, de mímica rígida e paupérrima -, ou limita as suas aparições a versões de concerto.
O talento da La Theodossiou é já assunto corrente nas récitas do São Carlos.
Soprano verdiano de primeira linha, Dimitra encarnou a mais lírica das heroínas que Verdi compôs. Pessoalmente, prefiro-a no primo Verdi - Odabella, Lina, Giselda...
A Desdemona da interprete grega revelou-se primorosa em termos interpretativos, muito rica e expressiva, sem nunca ter embarcado em exageros histriónicos; Theodossiou mostrou-se ainda, notável na gestão dos pianissimi - ela que conta com uma técnica falível - e, por vezes, algo excessiva no emprego do vibrato, que conferia demasiado peso e carácter à personagem.
Do naipe dos solistas, destacaria ainda a prestação de Carlos Guilherme, que muito me surpreendeu! Apesar de um pouco arrebatado e exagerado na expressão (particularmente na voz, à la Di Stefano), compôs um Roderigo assaz juvenil e bem timbrado! Com a idade com que conta e os empregos dados à voz, é obra!
Last but not least, uma palavra especialíssima para a magnífica direcção de Pirolli, que dirigiu com perícia, astúcia e muito talento uma OSP, pour une fois, coesa, responsiva, afinada e pujante (coisa rara...).
Dada a elevada qualidade das récitas verdianas no TNSC, nos últimos anos, - Falstaff (2000), Il Trovatore (2001), La Traviata (2002), Stiffelio (2003), Simon Boccanegra (2004) e Otello (2005) - começo a vergar-me diante das sábias opções da direcção de Pinamonte, esteja ele onde estiver...
Para a posteridade, deixo a recomendação de três Otello´s de antologia:
(Toscanini, 1947 - RCA GD 60302)
(Serafin, 1960 ? RCA 09026 63180 2)
(Kleiber, 1976 ? Music & Arts CD-1043)
sábado, 5 de novembro de 2005
Florença revisitada (3)
(Praça da Santíssima Anunciada)
(Igreja da Santíssima Anunciada)
(Torre do Palácio Velho)
(O complexo do Duomo - catedral de Florença -, com o Campanário, à esquerda, e a cúpula de Brunelleschi, à direita)
(do Oltrarno - para lá do rio Arno, que divide a cidade -, a Ponte Velha, à esquerda, e o Palácio Velho, à direita)
(do Oltrarno, a Ponte Velha, à direita)
(do Oltrarno, o Palácio Velho, à esquerda, e a Catedral, à direita)
(do Oltrarno, a Ponte Velha, ao fundo)
sexta-feira, 4 de novembro de 2005
Da inteligência e da beleza
René Fleming é a mais mediática soprano americana, do momento. Sobre esta iluminada criatura, muito recentemente, escrevi um post, a propósito de Berg.
Independentemente de concordar com algumas das críticas moderadas de que a sua carreira operática é alvo (superficialidade interpretativa e expressiva, nomeadamente), a sua voz é de uma beleza invulgaríssima! A este plus, acresce uma notável gestão da carreira, prova de uma inteligência superlativa.
Por todas estas razões (e mais algumas), recomendo a leitura deste depoimento.
Entretanto, a perspectiva de Fleming interpretar a mais feroz e destrutiva das figuras do belcanto - Norma -, deixa-me atónito...
Quoi en dire?
Do respeito pelo PATERNO ("Karajan m´a tout appris", diz Gergiev)
A carreira de Herbert von Karajan foi singularíssima.
Não sendo eu devoto (muito menos conhecedor, em profundidade) do trabalho do maestro austríaco, inequivocamente, reconheço a notoriedade do seu curriculum.
Se é verdade que a obra desenvolvida por von Karajan, ao longo da década de 1950, conta com marcos incontornáveis, nomeadamente em matéria de ópera (vide Le Nozze di Figaro, Così Fan Tutte, Die Zauberflöte - todos constantes da colectânea Great Recordings of the Century, EMI - e Tristan und Isolde - ORFEO D´ORO -, por exemplo), a partir de inícios dos anos 1980, a sua desmesurada omnipotência lançou-o numa imensa cruzada, avessa a quaisquer limites! Datam deste período interpretações de gosto duvidoso (Don Giovanni - DG -, parte substancial da obra de Bach, entre outras referências).
Numa época marcada pela apologia do materno - ampla difusão do culto mariano, radicalização do discurso feminista emancipatório (visível na aspiração fálica de algumas mulheres a dirigirem o culto católico, apostólico, romano, por exemplo) -, em detrimento do simbólico (leia-se, paterno), acho notável a reverência de Gergiev diante de Von Karajan, seu mestre! A ler.
Não sendo eu devoto (muito menos conhecedor, em profundidade) do trabalho do maestro austríaco, inequivocamente, reconheço a notoriedade do seu curriculum.
Se é verdade que a obra desenvolvida por von Karajan, ao longo da década de 1950, conta com marcos incontornáveis, nomeadamente em matéria de ópera (vide Le Nozze di Figaro, Così Fan Tutte, Die Zauberflöte - todos constantes da colectânea Great Recordings of the Century, EMI - e Tristan und Isolde - ORFEO D´ORO -, por exemplo), a partir de inícios dos anos 1980, a sua desmesurada omnipotência lançou-o numa imensa cruzada, avessa a quaisquer limites! Datam deste período interpretações de gosto duvidoso (Don Giovanni - DG -, parte substancial da obra de Bach, entre outras referências).
Numa época marcada pela apologia do materno - ampla difusão do culto mariano, radicalização do discurso feminista emancipatório (visível na aspiração fálica de algumas mulheres a dirigirem o culto católico, apostólico, romano, por exemplo) -, em detrimento do simbólico (leia-se, paterno), acho notável a reverência de Gergiev diante de Von Karajan, seu mestre! A ler.