domingo, 20 de junho de 2010

Lady Macbeth of Mtsensk (2/2)

Lady Macbeth of Mtsensk é uma notável ópera de Chostakovitch, tendo sido estreada – e rapidamente banida – em 1934, em Moscovo. Em 1962, o autor revê a peça - Katerina Izmailova, doravante -, introduzindo-lhe algumas modificações.


(Westbroek, como Katerina, na cena do casamento)

No essencial, a trama assenta numa fina e meticulosa caracterização da natureza humana, no que de mais sórdido e abjecto a mesma contém. O poder e exaltação do princípio do prazer - que se consubstanciam na luxúria - encontra-se em permanência à tona, ao longo desta peça: em nome do puro prazer e desejo de domínio, engana-se, mata-se e corrompe-se.


(Sergei - Ventris -, subjugando Zinovy - Ludha)

O argumento centra-se num território onde se cruzam perversão e psicopatia: a dissolução moral e corrosão psíquica atingem limites inusitados, como em nenhuma outra peça lírica! Em lugar da evocação simbólica, Chostakovitch investe na crueza, frieza e dilaceração.

A música é sombria, sinistra e desconcertante, criando, em permanência, um clima de extrema tensão, desconstrução e ruptura. O sórdido e abjecto estão omnipresentes.


(Ventris e Westbroek, ossia Sergei e Katerina)

A encenação (Martin Kusej) é um prodígio, fazendo do grotesco e sórdido a sua espinha dorsal. Em lugar de uma estética sexy, pueril e equilibrada, apoiada numa beleza tão característica da contemporaneidade – figuras esbeltas, magras, corpos harmoniosos e trabalhados -, a encenação rodeia-se de homens e mulheres tremendamente feios, obesos, bem redondos, de fácies assustadoramente animalescos. As cores estão dominadas pelo escuro e sombreado – cinzas dégradés, escarlates esbatidos, branco conspurcados.




(Eva Maria Westbroek, como Katerina)

De entre os solistas, Eva Maria Westbroek e Christopher Ventris sobressaem. Ela compõe a Katerina assoluta, destronando a extraordinária Galina Vishnevskaya. Westbroek é ardilosa, decadente, luxuriante e selvática. Ventris compõe um Sergei maligno, calculista e absolutamente abjecto. Perto da sua personagem, o temerário Iago é um aprendiz...

Por fim, Mariss Jansons dirige um Concertgebouw colossal e imenso, surpreendentemente poético...

Em nome da luxúria e do prazer sem regras... PURO DELEITE!

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* * * * *

(5/5)

9 comentários:

  1. Não sabia que sabia tanto russo!

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  2. A Fanciulla del West que Westbroek cantou na Royal Opera House, salvo erro, em 2008 foi, igualmente, de altíssimo nível.

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  3. Mr. LG, el MIster21 junho, 2010 20:09

    É ver o LANCINANTE grito final de Katerina Izmailova/ Eva Maria Westbroek, que não nos sai dos sentidos e da memória.
    É ver, meus senhores… é ver para crer ;-)
    Para colocar bem ao lado, na estante, do espectáculo DA CASA DOS MORTOS de Leos Janacek Boulez/ Chéreau/ Peduzzi – Aix-en- Provence. Definitivamente!
    Na minha modesta opinião, resenha crítica acertadíssima, caro Dissoluto. Está de Parabéns! :-)
    Eu não lhe disse que esta versão em DVD era um portento, um ESPECTUCULÃO e PÊRAS? :-D ;-))
    Long live Opera! :-D
    … e já agora, Long Live Eva Maria Westbroek e a sua sanidade vocal :-)
    Que nos dê ao longo da sua carreira, que esperamos bem longa, muitas e boas alegrias como esta.
    LG

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  4. Tenho o dvd em questão e posso atestar da sua qualidade. A versão filme sovietica dos anos 70 é igualmente notável e de extrema qualidade. São tão diferentes que convivem bem nos nossos afectos.

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  5. LG,

    Interessante, também pensei na interpretação de Boulez / Chéreau :-) E, claro, lembrei-me de si, enquanto visionava esta pérola ;-D

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  6. Mr. LG, el Mister22 junho, 2010 12:57

    Dissoluto,

    ;-))

    Ah! … A propósito. Já temos uma Sieglinde de E. M. Westbroek em Blu-ray: de 2008 em Aix En Provence, dirigida por Sir Simon, Com W. White, M. Petrenko (que acho um Baixo ainda muito verde, se me faço entender), L. Paasikivi (que nunca a ouvi) e as relativas desilusões que são E. Johansson e Robert Gambill ( este tenor, para mim, não vai lá, nem à lei da Bala! :-\ ) e uma sofrível ( acho eu, de me informar na imprensa)encenação de Stephane Braunschweig.
    Confesso que não estava à espera do produto Blu-ray. Vi extractos do AVATAR do James Cameron (Blu-ray legal! Atenção) e só vos posso dizer que me babei em quantidades industriais :-D :-D
    É incrível o que se evoluiu na tecnologia do som e da imagem. Longíssimos estão, numa outra galáxia estão... os pretos e Brancos desde Caruso, passando pelo IIº Acto da TOSCA/CALLAS 64, etc. etc. …
    Infelizmrnte nunca visionei uma Ópera em Blu-ray :-((
    Alguém daqui já o fez?..
    ... e pode-me esclarecer como é que é?
    È só mais uma ópera que se vê, ou tem realmente vantagens no som e na super-hiper clareza da imagem?
    E alguém já viu esta WALKURE que eu estou a citar em Blu-ray?
    Gostaria de saber novidades :-) se alguém me fizer o obséquio... ;-)

    2º A propósito: Já leu no Daily Telegraph...
    http://www.telegraph.co.uk/culture/music/opera/7837582/What-Makes-a-Great-Soprano-Hitting-the-highest-notes.html

    Cheers, Dissoluto.
    LG

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  7. Permita-me caro Dissoluto um reparo. Como é que uma cantora, neste caso Eva Maria Westbroek destrona a grande Galina Vishnevskaya, genuinamente russa e íntima de Shostakovitch, com quem deve ter discutido vezes sem conta o papel?
    Isto é só um pensamento.
    Raul

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  8. Caríssimo Raul,

    Bons olhos o vejam!!!
    Quanto à Eva Maria West... EXPERIMENTE e depois diga-me ;-) Tenho ambas em video, no papel de Lady e... Westbroek leva a melhor!

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  9. Caríssimo João,
    Ao ausência nas estepes, aquelas mesmas de Borodine, e o começo da primeira etape do regresso, levaram-me para longe dos blogues.
    RAUL

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