Cinquenta e dois anos volvidos sobre a mítica leitura de Furtwängler, de Tristan und Isolde - gravação que inaugurou um ciclo -, a EMI re-interpreta a mesma ópera, sob a batuta de Pappano. Consta que o ciclo se completou.
Ansiei longos meses pela publicação desta interpretação. Temo que o primeiro impacto da audição da mesma não seja justo...
A presente leitura, numa palavra, é de uma heterogeneidade sem limites ! Capaz do melhor (Stemme) e do pior (Fujimura), Pappano hesita.
Desde logo, a direcção de Antonio Pappano - que não é um wagneriano ! - impressiona, pelo rigor; contudo, excessivamente escolar - metódica e cuidada -, a mesma peca pela falta de poesia.
Não é possível abordar esta obra sem uma clara convicção melancólica, pois a matriz da mesma nada mais é do que um infinito desdobramento depressivo, pontuado por momentos de volúpia, sensualidade e beleza, incomensuráveis.
Wagner fala-mos de uma melancolia metafísica, que transcende a natureza humana, que nos remete para lá do real ! Pappano, que parece ter seguido a partitura, escrupulosamente, mostra-se incapaz de dela retirar afectos infinitamente depressivos...
Nesta interpretação, a transcendência é uma miragem, longínqua, longínqua...
Em matéria de distribuição, as expectativas eram altas...
Stemme é uma Isolda plena, absoluta.
Oleada por interpretações recentes, ovacionadas, tanto em Bayreuth, como em Glyndebourne, não desilude o mais exigente dos melómanos.
O papel está invejavelmente assimilado.
A composição que Ninna Stemme nos oferece é, contudo, algo convencional.
Considero-a particularmente expressiva, sobretudo na nobreza, no porte altaneiro, no orgulho e na dor da perda - onde é exímia !
O fraseado é de uma extracção inusitada, um regalo ! O timbre é belíssimo, embora não tão encorpado como imaginava... Quanto ao vibrato... não é defeito ! É feitio ! Assenta-lhe que nem uma luva !
Espantosamente - qual Helga Dernesch, qual Waltraud Meier... -, a tessitura apresenta afinidades com o registo mezzo !
Domingo, nesta interpretação, segue a sua cruzada contra a idade.
Um mero detalhe, gravar Tristão aos 65 anos - e não 61, que diz ter ! -, dado que outros realizaram, com sucesso, semelhante façanha - vide Windgassen, na soberba leitura de Böhme, igualmente entradote na idade, por altura da gravação, realizada ao vivo, em Bayreuth.
Além de cantar com a mestria que se lhe conhece - apesar dos excesso, que não são poucos... -, Plácido Domingo tem um invulgar talento dramático, particularmente em terrenos wagnerianos - Parsifal, Lohengrin e Tannhäuser.
O Tristão que Domingo compõe, investe, sobretudo, na exaltação, no vigor e na pujança, subestimando a dimensão imensamente trágica da personagem, hélas ! Espantar-me-ia que assim não fosse, dadas as evidentes características hipomaníacas do interprete !
Vocalmente, é estonteante, por vezes um pouco excessivo e arrebatador.
Da restante distribuição, destacaria Fujimura - que compõe uma Brangäne deplorável, tanto vocal, como dramaticamente - e Bär, quiçá, o mais tocante dos Kurwenal da discografia !
Pape - venerável mozartiano -, como Rei Marke, desilude, pela inexpressividade. O timbre é heróico e viril, em demasia... Falta-lhe a sensibilidade à dor, que lhe escapa, em absoluto. Recorde-se que a personagem que interpreta vive submersa num lúgubre sofrimento !
Enfim, uma interpretação a reter, pela mestria de três protagonistas, rica em virtudes vocais, embora parca na difusão do universo wagneriano mais ortodoxo.
Ansiei longos meses pela publicação desta interpretação. Temo que o primeiro impacto da audição da mesma não seja justo...
A presente leitura, numa palavra, é de uma heterogeneidade sem limites ! Capaz do melhor (Stemme) e do pior (Fujimura), Pappano hesita.
Desde logo, a direcção de Antonio Pappano - que não é um wagneriano ! - impressiona, pelo rigor; contudo, excessivamente escolar - metódica e cuidada -, a mesma peca pela falta de poesia.
Não é possível abordar esta obra sem uma clara convicção melancólica, pois a matriz da mesma nada mais é do que um infinito desdobramento depressivo, pontuado por momentos de volúpia, sensualidade e beleza, incomensuráveis.
Wagner fala-mos de uma melancolia metafísica, que transcende a natureza humana, que nos remete para lá do real ! Pappano, que parece ter seguido a partitura, escrupulosamente, mostra-se incapaz de dela retirar afectos infinitamente depressivos...
Nesta interpretação, a transcendência é uma miragem, longínqua, longínqua...
Em matéria de distribuição, as expectativas eram altas...
Stemme é uma Isolda plena, absoluta.
Oleada por interpretações recentes, ovacionadas, tanto em Bayreuth, como em Glyndebourne, não desilude o mais exigente dos melómanos.
O papel está invejavelmente assimilado.
A composição que Ninna Stemme nos oferece é, contudo, algo convencional.
Considero-a particularmente expressiva, sobretudo na nobreza, no porte altaneiro, no orgulho e na dor da perda - onde é exímia !
O fraseado é de uma extracção inusitada, um regalo ! O timbre é belíssimo, embora não tão encorpado como imaginava... Quanto ao vibrato... não é defeito ! É feitio ! Assenta-lhe que nem uma luva !
Espantosamente - qual Helga Dernesch, qual Waltraud Meier... -, a tessitura apresenta afinidades com o registo mezzo !
Domingo, nesta interpretação, segue a sua cruzada contra a idade.
Um mero detalhe, gravar Tristão aos 65 anos - e não 61, que diz ter ! -, dado que outros realizaram, com sucesso, semelhante façanha - vide Windgassen, na soberba leitura de Böhme, igualmente entradote na idade, por altura da gravação, realizada ao vivo, em Bayreuth.
Além de cantar com a mestria que se lhe conhece - apesar dos excesso, que não são poucos... -, Plácido Domingo tem um invulgar talento dramático, particularmente em terrenos wagnerianos - Parsifal, Lohengrin e Tannhäuser.
O Tristão que Domingo compõe, investe, sobretudo, na exaltação, no vigor e na pujança, subestimando a dimensão imensamente trágica da personagem, hélas ! Espantar-me-ia que assim não fosse, dadas as evidentes características hipomaníacas do interprete !
Vocalmente, é estonteante, por vezes um pouco excessivo e arrebatador.
Da restante distribuição, destacaria Fujimura - que compõe uma Brangäne deplorável, tanto vocal, como dramaticamente - e Bär, quiçá, o mais tocante dos Kurwenal da discografia !
Pape - venerável mozartiano -, como Rei Marke, desilude, pela inexpressividade. O timbre é heróico e viril, em demasia... Falta-lhe a sensibilidade à dor, que lhe escapa, em absoluto. Recorde-se que a personagem que interpreta vive submersa num lúgubre sofrimento !
Enfim, uma interpretação a reter, pela mestria de três protagonistas, rica em virtudes vocais, embora parca na difusão do universo wagneriano mais ortodoxo.
Consta que esta poderá ter sido a última gravação em CD de uma ópera, pelos custos incomportáveis (esta terá custado à EMI qualquer coisa a rondar os 750.000 euros...). Será de comprar e preservar, talvez se venha a tornar num documento histórico...
ResponderEliminarAssim é, caro Hugo. O derradeiro Tristão, via EMI. Quanto à imperiosidade da compra... hesitaria , apesar de, eu próprio ter adquirido esta interpretação !
ResponderEliminarPor mim continuo fiel à minha velhinha gravação de Karl Bohm. Sem dúvida que há coisas interessantes e até toques de sublime nesta gravação, mas, no seu todo, não chega aos calacanhares da outra (bem... nao exageremos... aos joelhos...). Para quem isso é importante, resta dizer que a qualidade de som é excelente, sem qualquer rival em termos de Tristan.
ResponderEliminarConcordo, concordo, Leporello mio ! Mas, há outros Tristan dignos de referência: Furtwängler, Kleiber, Karajan (52) e Reiner (36) são indispensáveis !
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