(DECCA 478 1533)
Renée Fleming retorna ao Verismo italiano, depois de um tour - que dura há cerca de 20 anos - por inúmeros outros territórios da lírica: barroco, classicismo, romantismo, bel canto, etc. Com maior ou menor sucesso, a intérprete americana pode gabar-se de ter visitado e experimentado um repertório amplo, mesmo que apenas discograficamente.
Fleming possui a mais bela voz de soprano lírico desde o ocaso de Te Kanawa e Studer. Que não haja dúvida. O timbre é de ouro, fino, magro e elegante, de uma graciosidade sem paralelo. A coloratura não lhe é totalmente estranha, razão pela qual triunfa nas ricas e ornamentadas passagens do bel canto (italiano, sobretudo). Mas não há bela sem senão: Fleming é uma actriz razoável, sendo uma intérprete banal, no tocante aos registos audio, note-se!
O presente registo obedece à lógica que a DECCA e Fleming traçaram, desde há tempos idos: alargar o repertório lírico, estendendo-o a todos os territórios, nunca repetindo interpretações (da própria).
A produção é cuidadosa, como sempre, exibindo uma cinquentona esbelta e elegante, muito retocada pelo dedo milagroso do PhotoShop.
Dado que Renée foi esgotando o mainstream da ópera, pouco lhe vai restando registar. Seria interessante que nos presenteasse com o Wagner lírico-dramático ou com o Verdi tardio (para além de Otello), mas enfim...
Dos meus desejos falo eu!
A verdade é que, no presente artigo, o soprano americano nos brinda com um Verismo mal amanhado, por vezes de segunda água, apesar de alguns pilares puccinianos - La Bohème, Manon Lescaut e Turandot. Há premières e rarely recorded arias; há sim senhor... E não é por acaso que só agora se perpetuam discograficamente: sem ponta de graça e desinteressantes, o tempo encarregou-se de as apagar - Iris e Landoletta (Mascagni), a par de La Bohème (Leoncavallo), Gloria (Cilea), etc.
Em regra, Fleming pouco vai além da banalidade interpretativa. Refugia-se numa voz belíssima, sobreinvestindo os formalismos, onde permanece espantosamente fresca e segura.
Contudo, destaco três momentos de inegável beleza: Zazá, pela espessura e eloquência dramáticas, Conchita, que transpira segurança pirotécnica, e Fedora, cuja interpretação e arrojo dilaceram os mais incrédulos...
Pelos momentos citados e timbre de ouro, sobretudo.
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(3,5/5)
O presente registo obedece à lógica que a DECCA e Fleming traçaram, desde há tempos idos: alargar o repertório lírico, estendendo-o a todos os territórios, nunca repetindo interpretações (da própria).
A produção é cuidadosa, como sempre, exibindo uma cinquentona esbelta e elegante, muito retocada pelo dedo milagroso do PhotoShop.
Dado que Renée foi esgotando o mainstream da ópera, pouco lhe vai restando registar. Seria interessante que nos presenteasse com o Wagner lírico-dramático ou com o Verdi tardio (para além de Otello), mas enfim...
Dos meus desejos falo eu!
A verdade é que, no presente artigo, o soprano americano nos brinda com um Verismo mal amanhado, por vezes de segunda água, apesar de alguns pilares puccinianos - La Bohème, Manon Lescaut e Turandot. Há premières e rarely recorded arias; há sim senhor... E não é por acaso que só agora se perpetuam discograficamente: sem ponta de graça e desinteressantes, o tempo encarregou-se de as apagar - Iris e Landoletta (Mascagni), a par de La Bohème (Leoncavallo), Gloria (Cilea), etc.
Em regra, Fleming pouco vai além da banalidade interpretativa. Refugia-se numa voz belíssima, sobreinvestindo os formalismos, onde permanece espantosamente fresca e segura.
Contudo, destaco três momentos de inegável beleza: Zazá, pela espessura e eloquência dramáticas, Conchita, que transpira segurança pirotécnica, e Fedora, cuja interpretação e arrojo dilaceram os mais incrédulos...
Pelos momentos citados e timbre de ouro, sobretudo.
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(3,5/5)
Amigo Disoluto,
ResponderEliminarPenso que que está a referir-se à ópera Lodoletta de Mascagni que contem uma ária que alguns sopranos abordam. A mais famosa interpretação é a de Renata Tebaldi. A ária chama-se qualquer coisa como "...Flammen..." (Aqui não tenho meios de verificar) é inspiradíssima e um exemplo perfeito do melhor Verismo. Na interpretação da Tebaldi, parece que até foi escrita para ela, sendo uma das suas mais fabulosas interpretações. Tente ouvir, pois aparece em qualquer antologia da "Voce di angelo". Do resto da ópera nada conheço.
Raul
Caro João
ResponderEliminarEu também não tenho muita paciência para o Verismo. Quanto mais óperas Veristas escuto mais se destaca Puccini e mais inadequada e limitante me parece categoriza-lo como um compositor Verista. No entanto, a Fedora que já vi ao vivo com o Domingo/Freni pode ser uma ópera eficaz e gratificante pelo menos com interpretes carismaticos e a Irís é uma ópera interessante por merito própio e também pelo tema oriental que antecede a Buterfly do Puccini que obviamente está uma categoria à parte.
Eu, pessoalmente, acho a Fedora uma ópera sem interesse, onde uma cantora já a acusar a idade pode ter uma palavra. Foi assim que em Portugal vi a elegantíssima Antonieta Stella cantá-la no Coliseu. Da ópera só destaco uma ária e para o tenor (Amor ti vieta). Há uma falta de inspiração desde o princípio até ao fim. Eu tenho a ópera em cd pela Tebaldi e em dvd pela Freni. Ambas estão óptimas, mas a ópera e só para entreter o ouvido.
ResponderEliminarMascagni é muito superior a Giordano e para além dessa obra-prima, a Cavellaria Rusticana, há muito boa música dispersa noutras óperas, nomeadamente na Iris, que eu tenho pela Magda Olivero, a "rainha" do Verismo.
Não tenho nenhum preconceito contra o Verismo e Puccini é um dos grandes génios da ópera italiana.
Raul
Caro Raul,
ResponderEliminara ária da Londoletta intitula-se "Flamen, perdonami!". Embora não seja a minha "corrente operática" favorita, aprecio bastante o Verismo. Existe ainda muito a descobrir de compositores como Franchetti, Smareglia, Zandonai, Orefice, Montemezzi, Monleone, Alfano, Gnecchi, entre outros. Sobre a Iris de Mascagni (com o seu belíssimo hino ao Sol), mencionada pelo caro João Ildefonso, não posso deixar de invocar uma preciosa gravação ao vivo com Clara Petrella, Giuseppe Di Stefano e Boris Christoff no papel do Cego.
O Hugo refere o Smareglia que tem uma ópera que muito estimo. Nozze Istraenie
ResponderEliminarA sua obra mais conhecida, caro João. Uma outra ópera deste compositor que mereceu alguma atenção foi "La Falena", da qual existe um registo que conta com Leyla Gencer.
ResponderEliminarHugo, desculpe-me, mas é Lodoletta e não Londoletta, como está também no poster.
ResponderEliminarRaul
Tem razão, Raul. Obrigado pela correcção.
ResponderEliminarCaro Hugo
ResponderEliminarè mesmo assim. A "La Falena" não conheço mas pelo argumento parece ser de inspiração verista enquanto a obra que referi é dum lirismo mais Pucciniano, uma especie de Romeu e Julieta de aldeia com traços da Bhoéme antes de esta ter existido. É muita bela a ópera. Parece que estreou em Turim na mesma temporada da Santa Irene do nosso Keil.
Caro João,
ResponderEliminareu tenho uma gravação das Nozze Istriane com a Maria Chiara e o Ruggero Bondino, captada em Trieste em 1973. Gostaria de partilhar impressões sobre a ópera em questão mas não me recordo do que ouvi.
A estreia teve lugar exactamente em Trieste no ano de 1895. Talvez por esse facto, alguns dos registos existentes da ópera sejam de Trieste.
Como disse não tenho nenhum preconceito contra o Verismo, embora tenha sempre encontardo um "problema". Em grande parte das óperas, se exceptuarmos o melhor Puccini, Mascagni e LeonCavallo, é o viver-se à custa de poucos temas. Por exemplo, na Fedora eu encontro o tema do Amor ti vieta e ele é exageradamente aproveitado como leitmotiv. Parece ser uma utilização oportunística do wagnerianismo para cobrir a falta de inspiração. Se pegarmos num só acto de uma ópera de Verdi encontramos muitos mais temas do que numa ópera inteira do período verista. Isto é o que a minha sensebilidade me diz.
ResponderEliminarRaul
Não vá mais longe, Raul. Por vezes, a Adriana Lecouvreur parece ter sido composta a partir do modelo "tema e variações".
ResponderEliminarSem dúvida, Hugo. A Adriana Lecouvreur é um bom exemplo, mas a Fedora é mais "escandaloso". Se a ópera italiana seguisse a lição do Falstaff, que só o Gianni Schichi aproveitou, talvez a ópera italiana posterior seguisse outro caminho. A mim parece-me que um compositor como Malipiero, de que só conheço obra orquestral, seguiu outra tradição. Ainda não tive oportunidade de ouvir qualquer ópera dele nem de fazer uma busca sobre o assunto. O mesmo se passa com Dellapicola.
ResponderEliminarRaul
O Raul parece que lê os meus pensamentos. :)
ResponderEliminarEu pergunto-me mesmo onde estarão os herdeiros do Verdi tardio. Será que existem?
Hugo, parece-me que há um revisitar às raízes, nomeadamente à Commedia dell'Arte. Malipiero e Busoni, este em alemão, pois era a sua formação, abordaram-na.Eu tenho o Arlecchino de Busoni, obra superior, e existe também uma ópera de Malipiero cuja personagem central é esta figura da Commedia. Alfano de que tenho o Cyrano, esta ópera é pelo menos uma obra magnifica e sai das linhas veristas. É, por isso, que embora LeonCavallo seja um expoente do Verismo, a música contida na representação no segundo acto d'Os Palhaços merece a nossa admiração pelos temas tradicionais. Aliás, e contra a opinião do nosso Dissoluto, Os Palhaços são uma ópera muito boa, rica de temas e bem engendrada.
ResponderEliminarRaul
Hugo
ResponderEliminarEu tenho uma versão mais recente também ao vivo de Trieste com a Vassileva e o Storey. Volte a ouvir o seu cd e não dará o tempo por mal empregue.
Pois ainda relativamente à Fedora e à Adriana Lecrouver fizeram todos comentarios muito acertados com os quais me identifico. Podem ser obras interessantes e gratificantes ao vivo mas dependem quase totalmente do carisma dos interpretes o que aponta para alguma fraquesa dos compositores.
ResponderEliminarsei que chego tarde a estes comentários mas há uma ópera verista que gosto muito do Leoncavallo. trata-se da "Gli Zingari" que possui muito bons momentos dramáticos. De resto é geral, puccini à parte, e salvo raras excepções,concordo com o que aqui foi dito. ah! mas da ópera Fedora a ária que mais destaco é a La donna Russa. Acho muito mais gira do que o amor ti vieta.
ResponderEliminarEsquecimento"grave" da minha parte de uma obra que tem um estilo muito pessoal, cheia de inspiração e que bebeu algo do Falstaff. Estou a falar do Mefistófles de Boito que acho uma obra-prima. Obra muito inteligente, sabendo nós a dificuldade que Boito tinha para compor. Dele também tenho Nerone que não se podendo comparar com o Mefistofele, é, no entanto, muito interessante.
ResponderEliminarRaul
Uma outra ópera do Alfano que merece referência é Rissurezione. Magda Olivero foi uma proeminente advogada desta obra.
ResponderEliminarO facto da ária "La donna Russa" não ser mais conhecida prende-se, na minha óptica, com o facto de a personagem De Siriex acabar sempre por ser demasiado secundarizada. Tito Gobbi é um dos poucos que consegue conferir peso a esta figura tal como sucede com o seu Sharpless.
Em relação ao Mefistofele de Arrigo Boito, embora tratando-se de uma ópera algo desigual, sou igualmente um confesso admirador. Um dos momentos que mais me toca ocorre no final quando surgem as vozes celestiais em pianíssimo. Quando bem executado é belíssimo.
Raul, Hugo Santos,
ResponderEliminaré verdade, o Mefistofeles é uma obra da qual gosto muito e que nem me lembrei! a cena do coro no final de um acto, é lindissimo de se ouvir. e a cena das vozes celestiais tambem. e tem algumas árias que tambem gosto. foi uma boa lembrança!
Blogger, tem a versão dvd de São Francisco com o Ramey? Se não tem, vá a correr comprá-la e diga depois aqui a sua impressão. O final do Prólogo é de arrasar.
ResponderEliminarRaul
Mas não podemos considerar o Mefistofeles, tal como a Gioconda, uma ópera Verista pois não? Estamos a falar de óperas Veristas ou duma forma mais abrangente da produção italiana do final do século extra Verdi?
ResponderEliminarJ. Ildefonso, realmente é uma pergunta pertinente. tambem nao considero o Mefistofeles muito ao estilo verista.
ResponderEliminarRaul, já vi essa gravação :) os anjos mascarados é fenomenal. o Ramey está óptimo como mefistofeles. Mas tenho pena de nao conhecer mais gravações, gostava de ver uma assim mesmo muito gótica no estilo e não com balões a fazer de mundo, se é que me faço entender!
há arias muito bonitas nessa ópera,temos o "Son lo Spirito" e também gosto de um momento que é o "triunfo ad elena" creio que é assim. há uma outra ária que gosto para a soprano que é " spunta l'aurora palida"
Caro Blogger, em dvd não conhço nenhuma outra que se equivala. Em CD há várias. Eu tenho a do Ghiaurov, já acusar um pequeno desgaste, mas mesmo assim "imposant". O resto do elenco é esmagador: Pavarotti, Freni, Caballé. Existem outras versões mais antigas, mas não sei se terão cortes. No passado dois baixos dominaram o papel: Giulio Neri e Cesare Siepi, com a voz bem mais tenebrosa que o Ramey.
ResponderEliminarQuanto à Gioconda ser Verista avant la lettre é algo que vi muitas vezes escrito, mas eu tenho dificuldade de compreender por causa da música, mais próxima de um Simão Boccanegra,por exemplo.
Ainda voltando ao Mefistofles você deve ouvir as árias do baixo por Nazareno di Angelis. Tente procurar e ouvir.
Raul
Querido Raul
ResponderEliminarNunca tinha pensado nisso mas é muito sedutora essa ideia de a Gioconda se aproximar do Simão. Vou analisar. Obrigado.
È giro ler os diálogos que se conseguem criar entre os comentaadores deste blog.
ResponderEliminarParabéns Raul e Hugo por me pren derem até ao fim e ao blogger que mesmo com uma entrada tardia tão bem sabe nos oferecer uma ária suave.