N´Os Mestres Cantores de Nuremberga, pela primeira e única vez, Wagner apela à necessidade de um compromisso, no sentido psicanalítico do termo: o debate entre forma e conteúdo, novo e velho - pares antitéticos - culmina numa combinação equilibrada, que inclui cedências e acordos, sendo que nenhuma das polaridades triunfa sobra a outra.
Longe vão os tempos em que o Super-Eu (moral) levava a melhor sobre o Id (impulsividade) - vide Tannhäuser, por exemplo, onde escravo da um moralismo caduco, o protagonista abdica do amor carnal de / por Vénus, depois de se corroer entre a satisfação do desejo e a submissão diante da defesa.
Por esta razão, Os Mestres Cantores de Nuremberga constituem, a meu ver, a mais neurótica e salutar composição wagneriana, no sentido freudiano do termo: a ópera reenvia à saúde, ao crescimento e à ambivalência, renegando as velhas e primitivas clivagens, que povoavam o conturbado e fértil universo psíquico de Wagner.
Creio que, paralelamente, esta maravilhosa criação lírica faz apelo aos processos de identificação, não fora uma criação neurótica!
Walther aspira a ser mestre como Hans Sachs, sabendo que a mão de Eva só será sua se tiver a aprovação e reconhecimento das suas próprias qualidades por parte dos demais mestres cantores.
Como em qualquer processo de identificação, há conflitualidade, luta e ambivalência.
Os rituais iniciáticos - seja eles quais forem - contêm sempre este debate: ser como, fazer como e agir como implicam um desejo de identificação, que não é pacífico, nem tranquilo, muito antes pelo contrário!
Veja-se o caso dos adolescentes, cujo percurso no sentido da adultice é marcado por desejos (antagónicos) de oposição - confronto / identificação.
Walther só se torna mestre / homem, quando compreende a necessidade imperiosa de enformar o seu canto: o impulso criativo passa, então, a ter uma estrutura de suporte, capaz de o enquadrar!
Doravante, Eva será sua.
Que bela metáfora sobre o crescimento!!!
Longe vão os tempos em que o Super-Eu (moral) levava a melhor sobre o Id (impulsividade) - vide Tannhäuser, por exemplo, onde escravo da um moralismo caduco, o protagonista abdica do amor carnal de / por Vénus, depois de se corroer entre a satisfação do desejo e a submissão diante da defesa.
Por esta razão, Os Mestres Cantores de Nuremberga constituem, a meu ver, a mais neurótica e salutar composição wagneriana, no sentido freudiano do termo: a ópera reenvia à saúde, ao crescimento e à ambivalência, renegando as velhas e primitivas clivagens, que povoavam o conturbado e fértil universo psíquico de Wagner.
Creio que, paralelamente, esta maravilhosa criação lírica faz apelo aos processos de identificação, não fora uma criação neurótica!
Walther aspira a ser mestre como Hans Sachs, sabendo que a mão de Eva só será sua se tiver a aprovação e reconhecimento das suas próprias qualidades por parte dos demais mestres cantores.
Como em qualquer processo de identificação, há conflitualidade, luta e ambivalência.
Os rituais iniciáticos - seja eles quais forem - contêm sempre este debate: ser como, fazer como e agir como implicam um desejo de identificação, que não é pacífico, nem tranquilo, muito antes pelo contrário!
Veja-se o caso dos adolescentes, cujo percurso no sentido da adultice é marcado por desejos (antagónicos) de oposição - confronto / identificação.
Walther só se torna mestre / homem, quando compreende a necessidade imperiosa de enformar o seu canto: o impulso criativo passa, então, a ter uma estrutura de suporte, capaz de o enquadrar!
Doravante, Eva será sua.
Que bela metáfora sobre o crescimento!!!
(EMI 5 55142 2)
Vem esta longa prosa a propósito da interpretação de Sawallisch de Die Meistersinger von Nürnberg.
Em minha opinião, a mais rica e equilibrada leitura da citada ópera é a de Solti, realizada em Chicago, no ano de 1995.
Encabeçada pelo magistral Van Dam, esta interpretação é absolutamente soberana!
A proposta de Sawallisch, ainda assim, contém alguns pontos interessantes, dignos de menção.
Globalmente bem conduzida, esta leitura não contem momentos de grande brilho orquestral.
A proposta de Sawallisch, ainda assim, contém alguns pontos interessantes, dignos de menção.
Globalmente bem conduzida, esta leitura não contem momentos de grande brilho orquestral.
Sawallisch cumpre, com correcção e empenho, faltando-lhe inspiração, algum arrebatamento, paixão e poesia.
No tocante à distribuição, heterogeneidade é a palavra de ordem!
Começaria pelo soberbo Walther de Heppner, porventura o mais talentoso e convincente de toda a discografia que conheço!
No tocante à distribuição, heterogeneidade é a palavra de ordem!
Começaria pelo soberbo Walther de Heppner, porventura o mais talentoso e convincente de toda a discografia que conheço!
Ainda mais fresco do que por ocasião da gravação dirigida por Solti - onde interpretou a personagem homónima -, Ben Heppner compõe um Walther de sonho: poético, lírico, incandescente, arrebatado, jovial, fresco.
O timbre é generoso, de uma pujança e ousadia quase insolentes!
Cenicamente perfeito, dado que é multifacetado, Heppner exibe uma técnica correctíssima e despudorada, tocando as raias da perfeição, rien que ça!
A seu lado, Cheryl Studer interpreta uma Eva estupenda (talhada para o Walther do tenor canadiano).
Lírica e pueril, a Eva de Studer irradia luminosidade. Com uma discreta pitada de sensualidade e ousadia, ascenderia à categoria de deusa.
Apreciei, de igual modo, a notável prestação de Deon Van Der Walt, malogrado tenor Sul-Africano, recentemente assassinado.
De timbre fresco e juvenil, Van der Walt é um tenor lírico, brilhando pela nobreza do agudo, fácil, puro e cristalino. Tal como Wagner pretendia, as suas qualidades vocais e estilísticas encontram-se nos antípodas das de Walther, que é um heldentenor.
Ainda no rol das estrelas, destacaria os contributos de Kurt Moll - na pele de Veit Pogner - e de Siegfried Lorenz - como Beckmesser.
Cenicamente perfeito, dado que é multifacetado, Heppner exibe uma técnica correctíssima e despudorada, tocando as raias da perfeição, rien que ça!
A seu lado, Cheryl Studer interpreta uma Eva estupenda (talhada para o Walther do tenor canadiano).
Lírica e pueril, a Eva de Studer irradia luminosidade. Com uma discreta pitada de sensualidade e ousadia, ascenderia à categoria de deusa.
Apreciei, de igual modo, a notável prestação de Deon Van Der Walt, malogrado tenor Sul-Africano, recentemente assassinado.
De timbre fresco e juvenil, Van der Walt é um tenor lírico, brilhando pela nobreza do agudo, fácil, puro e cristalino. Tal como Wagner pretendia, as suas qualidades vocais e estilísticas encontram-se nos antípodas das de Walther, que é um heldentenor.
Ainda no rol das estrelas, destacaria os contributos de Kurt Moll - na pele de Veit Pogner - e de Siegfried Lorenz - como Beckmesser.
Ambos conferem uma espessura dramática e estilística invulgares às personagens interpretadas: o primeiro pela solenidade e o segundo pela canalhice.
Se é verdade que nenhuma destas figuras apresenta grandes dificuldades vocais, no que concerne à dramatização, a conversa é outra!
Reservo o pior para o fim.
Custe o que custar, não há Os Mestres Cantores de Nuremberga sem um Hans Sachs de peso!
Personagem central da ópera, Hans Sachs é muito mais do que um barítono lírico, constituindo o paradigma da conciliação velho vs novo, forma vs conteúdo: encarna o compromisso, como nenhuma outro personagem, constituindo um modelo de identificação.
Sawallisch escolheu para Hans Sachs, nesta interpretação, o barítono Bernd Weikl.
Pois bem, Weikl é um Sachs medíocre: de voz rígida e monocórdica, fatigada e inflexível, o cantor compõe um Hans Sachs sem brilho vocal, nem dramático! Falta-lhe generosidade, carisma, sapiência e humanidade.
Incapaz de se impor no plano vocal, este intérprete falha estrondosamente no perfil artístico da personagem que compõe, sem brilho, sem talento e sem mestria!
Se é verdade que nenhuma destas figuras apresenta grandes dificuldades vocais, no que concerne à dramatização, a conversa é outra!
Reservo o pior para o fim.
Custe o que custar, não há Os Mestres Cantores de Nuremberga sem um Hans Sachs de peso!
Personagem central da ópera, Hans Sachs é muito mais do que um barítono lírico, constituindo o paradigma da conciliação velho vs novo, forma vs conteúdo: encarna o compromisso, como nenhuma outro personagem, constituindo um modelo de identificação.
Sawallisch escolheu para Hans Sachs, nesta interpretação, o barítono Bernd Weikl.
Pois bem, Weikl é um Sachs medíocre: de voz rígida e monocórdica, fatigada e inflexível, o cantor compõe um Hans Sachs sem brilho vocal, nem dramático! Falta-lhe generosidade, carisma, sapiência e humanidade.
Incapaz de se impor no plano vocal, este intérprete falha estrondosamente no perfil artístico da personagem que compõe, sem brilho, sem talento e sem mestria!
Que saudades de Van Dam, Adam e outros verdadeiros Hans Sachs!
Dito isto, fiel e paciente leitor, recomendo esta interpretação, acima de tudo, pelo insuperável Walther de Ben Heppner, verdadeiro diamante da discografia wagneriana!
Uma vez mais advirto-o: se pretende uma leitura inultrapassável desta ópera, opte pela segunda de Solti!
Dito isto, fiel e paciente leitor, recomendo esta interpretação, acima de tudo, pelo insuperável Walther de Ben Heppner, verdadeiro diamante da discografia wagneriana!
Uma vez mais advirto-o: se pretende uma leitura inultrapassável desta ópera, opte pela segunda de Solti!
João,
ResponderEliminarAtenção a esta maravilha da EMI:
Maestro: Rudolf Kempe
Sachs: Ferdinand Franz
Pogner: Gottlob Frick
Beckmesser: Gustav Neidlinger
Walther: Rudolf Schock
David: Gerhard Unger
Eva: Elisabeth Grummer
Magdelene: Marga Hoffgen
Este Walther certamente não disputa o lugar ao Heppner, mas temos aqui um Hans Sachs de referência, uma cantora divina ( a perfeita Eva, Elsa e Agatha e uma das melhores cantoras de lied do século XX) e o melhor baixo wagneriano do século XX.
Raul
Raul,
ResponderEliminarVou estar alerta para esta gravação! Obrigado!!!